editorial de O Globo
Com ações desvalorizadas, sem balanço auditado, portanto com acesso ao crédito barrado, situação da empresa é crítica, mas Planalto se mantém numa posição dúbia
Acompanhada de diretores, a presidente da Petrobras, Graça Foster,
concedeu entrevista à imprensa, quarta-feira, num café da manhã,
iniciativa que nada ajudou a esclarecer o futuro da empresa, para
acalmar nervosos credores e acionistas, dentro e fora do país,
fornecedores e milhares de funcionários.
Pode-se argumentar que não cabe à diretoria executiva de qualquer
companhia responder sobre questões estratégicas, mas ao sócio
controlador. Ou seja, o Estado brasileiro, representado, no caso, pela
presidente Dilma Rousseff, ela mesma responsável pela Petrobras entre
2003 e 2010, período em que foi ministra de Minas e Energia e presidente
do Conselho de Administração da estatal.
Às vésperas da entrevista, em operação claramente articulada com o
Planalto, Michel Temer, vice-presidente da República, e o ministro da
Justiça, José Eduardo Cardozo — este pela segunda vez —, deram
declarações favoráveis a Graça. A Petrobras, por sua vez, com grande
atraso divulgou nota para garantir que a presidente da empresa só soube
das irregularidades denunciadas pela geóloga Venina Velosa por e-mail
recebido da funcionária em 20 de novembro. (Na quarta, porém, o jornal
“Valor”, o primeiro a publicar e-mails da geóloga, trouxe provas de que
Graça foi informada dos desmandos por Venina desde, no mínimo, 2009.)
Nesse contexto, a reaparição da presidente da Petrobras envergando uma
camisa azul com o logotipo da empresa, tentativa cenográfica primária de
sinalizar simbiose com a estatal, pode ser decifrada como sinal de que é
desejo da presidente Dilma que Graça permaneça, depois de ter pedido
demissão “duas ou três vezes”.
Dilma pode estar agindo por amizade, ou até por entender que Graça
Foster serve como anteparo no turbilhão de acusações e suspeições que
envolvem a estatal. Mas a posição do Planalto é dúbia, indefinida.
Enquanto isso, a Petrobras naufraga. As ações estão sendo negociadas a
cerca de menos da metade do seu valor patrimonial em 2013, e a paralisia
administrativa da empresa ameaça o cronograma de projetos estratégicos.
Qualquer atraso na entrada de produção de poços prejudica um programa
gigantesco de US$ 220 bilhões de investimentos até 2017, talvez já
impossível de ser cumprido.
Sem balanço auditado, a Petrobras não tem acesso a crédito, porque
ninguém sabe o risco efetivo de se emprestar à empresa, por sinal já
bastante endividada (US$ 170 bilhões, no final de junho). Em outubro, a
agência Moody’s rebaixou a nota de risco da estatal.
A situação é crítica, tende a se deteriorar, e por isso a presidente
Dilma deveria sinalizar fortemente para uma espécie de refundação da
estatal. Missão que Graça Foster, desgastada, não tem condições de
cumprir.
FONTE ROTA2014
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