por Ruy Fabiano Com Blog do Noblat - O Globo
A construção de uma unidade geopolítica latino-americana – ou ao menos
sul-americana – não surge com o PT. É ideia antiga, que, há três
décadas, inspirou o Mercosul e alterou, para o mal e para o bem, a
diplomacia e o comércio continentais.
O fato de ser desejável e necessária, numa época em que as nações se
organizam em blocos, para melhor figurar no cenário geopolítico mundial,
não a torna menos complexa. A unidade europeia, ideal antigo de
séculos, começou a ser implementada após a Segunda Guerra. Passou por
diversos estágios e ainda está em curso, cada etapa sendo publicamente
discutida.
Não é fácil unir coisas distintas e assimétricas, respeitando-se os espaços de soberania.
O problema da união latino-americana cogitada pelo PT, e pelas
organizações da esquerda continental, reunidas no Foro de São Paulo, é
tentar impô-la sem debates e sob o tacão ideológico.
A Pátria Grande terá que ser socialista – ou bolivariana - e seu projeto objetiva, com a urgência possível, unificar forças armadas, moeda e territórios. Nada menos.
A Pátria Grande terá que ser socialista – ou bolivariana - e seu projeto objetiva, com a urgência possível, unificar forças armadas, moeda e territórios. Nada menos.
Para definir sua institucionalização, criou-se a Unasul, cuja última
reunião de cúpula, no Equador, em dezembro, aprovou três propostas
complicadíssimas: uma Escola Sul-Americana de Defesa – “um centro
articulado de altos estudos para formação de civis e militares” -,
abertura do espaço aéreo dentro da Unasul, além de passaporte comum, sem
distinguir nacionalidades.
São questões que tangenciam a soberania e pressupõem longas e complexas
tratativas, acompanhadas de perto pelas sociedades dos países
abrangidos. Nada disso, porém, ocorreu: nem na sociedade, nem no
Congresso, nem em parte alguma.
Quem assiste os vídeos do PT tratando do assunto – e há vários na
internet (deve ser isso que o partido entende como “debate”), constata
que se parte de um pressuposto falso: de que a sociedade brasileira está
não só ciente desse projeto, mas de pleno acordo – sobretudo quanto a
seu teor ideológico.
Num deles, fala-se de “uma América do Sul vermelha”. Em outro, Lula fala
da importância de o Brasil investir na infraestrutura de Cuba, sem
explicar o porquê. O debate deu-se sempre intramuros, com a militância
do partido e do Foro.
Os reflexos dessa manobra são evidentes. Mudou a diplomacia brasileira,
trocando parceiros e prioridades. O Brasil é o único país a dispor de
duas chancelarias: a oficial, o Itamaraty; e a real, a cargo do
chanceler Marco Aurélio Garcia.
As antigas alianças ocidentais foram trocadas por outras, de teor
oposto, que em vez de lucro dão prejuízo. Serve-se ao país a política do
fato consumado, na base da terapia do susto.
A figura de Simon Bolívar tem peso simbólico nos países
hispano-americanos, como libertador do colonizador europeu, mas nenhum
no Brasil, que viveu processo de independência diverso.
Impingi-la como elo comum é uma arbitrariedade. Os nossos “pais
fundadores” – e os há – são civis. Os mentores de nossa independência
não eram militares, que só passaram a ter presença exponencial na
política brasileira a partir da República, por eles proclamada. Nosso
Bolívar é José Bonifácio.
O problema, portanto, começa na falsificação dos símbolos. A grande
figura militar brasileira, o Duque de Caxias, firmou-se menos como
guerreiro e mais como pacificador, arquiteto da unidade nacional, ao
longo do Segundo Reinado.
Nem ele, no entanto, desfruta mais desse prestígio, tal a eficácia do
processo iconoclasta a que foram submetidas as figuras históricas do
país de algumas décadas para cá. Sem heróis, não há nação – e por isso
as grandes nações sempre cultivaram os seus.
A Pátria Grande não inova nesse ponto: vê em Bolívar um herói comum,
ainda que o perfil histórico que esculpiu esteja bem longe da figura
real que ele encarnou. O Brasil, e esse é o absurdo maior, mesmo sem ter
nada a ver com Bolívar, cumpre o papel de promover e patrocinar esse
projeto, sem que sua população saiba de seus objetivos e, sobretudo, do
seu custo.
Não é por outro motivo que o governo reage ferozmente à ideia de abrir a
caixa preta do BNDES, que revelará parte dos custos da construção da
Pátria Grande. Ela também é destinatária de parte do saque à Petrobrás e
aos fundos de pensão.
O Foro de São Paulo promove a eleição dos bolivarianos e sustenta a
construção (que não é barata) dos alicerces dessa “nação comum”. O
dinheiro vem daqui. E Joaquim Levy, antípoda ideológico do pessoal do
Foro, foi chamado a administrar o troco que restou ao Tesouro Nacional
nessa aventura em pleno curso.
extraídaderota2014blogspot
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