Folha de São Paulo
A decisão monocrática do Tribunal Superior Eleitoral da lavra do
ministro Admar Gonzaga, de vetar a publicidade da última edição da
revista "Veja", parece-me violentar o artigo 220 da Constituição
Federal, que determina ser a manifestação do pensamento, a criação, a
expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo imune a
qualquer tipo de restrição nos termos da lei maior.
Não é o único dispositivo em que a livre manifestação é assegurada. O
artigo 5º, no inciso 4, cláusula imodificável da Constituição, tem a
seguinte dicção: "É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato".
O fundamento da decisão reside no fato de que a publicidade do conteúdo
poderia prejudicar o processo eleitoral, às vésperas da eleição
presidencial. Nada mais incorreto, com todo o respeito que o eminente
ministro merece, do que a afirmação, visto que todos os fatos que dizem
respeito aos candidatos que disputam o comando da nação,
necessariamente, devem ser de conhecimento público.
Se a reportagem da revista "Veja" estivesse apresentando fatos não
ocorridos ou imaginados, deveria ser punida. Não pode, todavia, receber
censura –a proibição da publicidade representou evidente censura–
simplesmente por tornar públicas as declarações do homem que, até o
presente, ninguém contestou ter sido aquele que transferiu recursos
obtidos ilegalmente da Petrobras para fora do país.
Se mentira fosse –e muitas mentiras foram apresentadas durante a
campanha eleitoral–, a revista poderia ser impedida de apresentar, não a
reportagem, mas as inverdades pretendidas.
No caso concreto, entretanto, a revista apenas veiculou investigação
semelhante àquela que nos Estados Unidos tornou-se o grande mérito de
dois jornalistas durante a Presidência de Richard Nixon (1969-1974).
A função da imprensa é investigar e fornecer ao povo as informações
necessárias desde que elas tenham origem e tenham razoável
credibilidade, como no caso da Petrobras sugere o pedido de delação
premiada do referido doleiro.
Em outras palavras, nenhuma censura pode ser feita à revista que
veiculou um depoimento que obteve, e que efetivamente ocorreu, sobre
desvios ilegais de recursos da Petrobras.
Numa eleição dessa magnitude, é importante que o eleitor avalie o peso
ou não das informações dadas, desde que não sejam forjadas, e essas
informações não foram forjadas porque representam rigorosamente o
depoimento do doleiro.
Pessoalmente, não estou me posicionando sobre a veracidade dessas
informações, que serão aprofundadas durante a investigação. Posiciono-me
apenas como professor de direito constitucional que fui a vida inteira,
defendendo a irrestrita liberdade de imprensa e tendo informações de
relevância com foros e credibilidade de dar a público, para que o povo
possa avaliar a sua razoabilidade ou não.
Um fato é certo, reconhecido pela própria presidente da República: houve
desvios. Outro fato relevante é que as duas pessoas envolvidas no
desvio na Petrobras pediram delação premiada.
Nada mais razoável que as informações daqueles que foram instrumentos do
desvio sejam levadas a público na liberdade irrestrita que tem a
imprensa de informar, numa democracia, o povo brasileiro.
Dessa forma, espero que o colegiado do egrégio Tribunal Superior
Eleitoral, constituído de eminentes ministros, volte a permitir a
plenitude de vigência e eficácia do artigo 220 da Constituição Federal e
que, com o devido respeito ao preclaro ministro que censurou a revista
"Veja", modifique a sua decisão monocrática.
FONTE ROTA2014
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