Gaudêncio Torquato: Com Blog do Noblat - O Globo
Ondas e marolas correm pelas águas da política, formando tempestades e
furacões. A onda de maior altura, no momento, origina-se na forte
ventania provocada pelas gravações de conversas feitas pelo ex-senador e
ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, com interlocutores como o
presidente do Senado, Renan Calheiros, o ex-presidente da República e
ex-presidente do Senado, José Sarney, e o senador Romero Jucá. O receio é
que o impacto dessa onda, atingindo os costados de protagonistas da
cúpula do PMDB, possa criar embaraços ao novo governo sob o comando do
presidente em exercício Michel Temer. Mergulhemos na onda.
A leitura dos diálogos, até o momento, não tem o efeito de provocar
estragos de monta nos interlocutores. São evidentes as manifestações
contrárias à Operação Lava Jato, porém estão restritas ao campo da
opinião, com indicações de eventuais contatos a serem feitos com um
magistrado (César Asfor) e um advogado (Ferrão), para efeito de
aproximação com o fechado ministro do STF, Teori Zavascki. Sobra dessa
bagagem expressiva grande contrariedade contra a Operação que investiga
atores envolvidos nos escândalos que abalam o país, a par do desejo,
por eles compartilhado, de zerar as ações com a formação de um pacto
político-partidário. Pode ser que as próximas gravações tragam situações
mais impactantes.
O fato é que as gravações caem em um instante muito tenso, eis que a
luta política tende a ficar mais acirrada ante a possibilidade do
afastamento definitivo da presidente Dilma. A propósito, seu advogado, o
ex-advogado geral da União, José Eduardo Cardozo, promete anexar ao
recurso de defesa da presidente a gravação da conversa mantida entre
Machado e o senador Jucá para comprovar a tese de golpe. Uma faca de
dois gumes. Pois em uma gravação com Sarney, este afirma,
peremptoriamente, que a própria Dilma teria negociado com a Odebrecht o
pagamento do trabalho do marqueteiro João Santana. Quer dizer, a
presidente afastada também está no meio da querela.
A onda das gravações de Machado forma-se no meio de outras ondas que
batem nos costados sociais. A militância do PT e movimentos controlados
pelo partido e pela CUT fazem barulho nas ruas, gritando palavras de
ordem, fechando avenidas, procurando semear por onde passam a semente de
“golpismo”, coisa que tende a não prosperar ante a fulminante hipótese
de que o processo de impeachment se ancora no rito definido pela Corte
Suprema e por elevado quórum do Congresso Nacional. Na verdade, o PT
está convencido de que a presidente afastada não deteria mais condições
de governar caso voltasse ao posto. Se isso ocorresse, teria de promover
novas eleições, mesmo sem saber como tal hipótese seria viabilizada,
eis que não tem endosso constitucional. Se renunciasse, o vice
assumiria.
A par da onda de contrariedade contra o novo governo, formada nos
enclaves da militância petista, espraia-se pela sociedade a onda de
indignação contra feitos e escândalos perpetrados na era lulodilmista,
dentre os quais o mensalão e o petrolão. O balão da opinião pública
recebe, a cada dia, lufadas de vento causadas pelo descalabro econômico
deixado pelo PT. O país está quebrado: mais de 11 milhões de
desempregados, um déficit nas contas públicas de R$ 170 bilhões, uma
máquina partidarizada, grupos infiltrados em todos os setores públicos
com o intuito de abrir espaços para perpetuar um projeto de poder.
Impressiona a avidez com que o PT montou seu castelo de areia, sob o
lema “Nós e Eles”, bons e maus, mocinhos e bandidos. Flagrados no meio
da bandidagem, tenta, agora, resistir até, como eles dizem, a última
gota de sangue.
Há, ainda, a onda fosforescente formada por grupos que habitam os
palácios das artes e os museus da Cultura. Esse grupo aprecia a técnica
da mistificação. Esmurraram a cara do novo governo quando viram que o
Ministério da Cultura se transformara em Secretaria. O novo
presidente, perfil de diálogo, remontou o Ministério. E o que
essa turma fez? Continuou a bater. Na verdade, quer um motivo para
perpetuar bolorentas palavras de ordem. Grandes nomes das artes – quase
todos – financiaram seus projetos com recursos da Lei Rouanet. Mesmo
assim, cobram ingressos a preços altíssimos. As contas estão
escancaradas: o Sudeste levou, em 2015, 79,29% de recursos da Lei
Rouanet; o Nordeste ficou apenas com 4,58%; o Norte, com 0,66%; o
Centro-Oeste ganhou 2,33% e o Sul, 13,15%. Eis o retrato de apoio à
Cultura. Os grandes abocanham fatias que deveriam ser destinadas aos
pequenos.
Daí a inferência: os artistas boquirrotos, que muito gritam, apenas
receiam não ter mais as tetas do Estado. Por último, há uma onda que se
forma no meio da sociedade, juntando correntes das classes médias, o
médio empresariado, os setores devastados da produção e do comércio,
profissionais liberais, etc. Esses grupos se unem no repúdio à
roubalheira e à corrupção desenfreada que se instalou no país. Todos
aplaudem a República de Curitiba, onde o destemido juiz Sérgio Moro age
com desenvoltura na condução da Operação que tenta extirpar os tumores
do Estado. Essa onda não faz o barulho da militância petista, mas cria
marolas que chegam até às margens da sociedade. Sua expressão indignada
corre do centro da pirâmide para as lonjuras mais distantes do
território. As classes médias exercem o poder de irradiar influência.
Constituem a pedra atirada na lagoa, levantando marolas que correm em
direção às margens.
As ondas diversas que circulam nas esferas política e social animam a
locução democrática. Nunca se viu o país tão impregnado do discurso
político. Os espaços da vida produtiva estão tomados por debates,
discussões, ideias, a denotar que o país começa a divisar novos
horizontes. Pode ser que a inovação política não seja avassaladora nas
eleições de outubro, mas é razoável apostar que veremos um pleito mais
asséptico e menos contaminado pelo vírus da velha política.
Que assim seja!
extraídaderota2014blogspot
0 comments:
Postar um comentário