Ives Gandra da Silva Martins: O Globo
Li, com muita preocupação, a “Resolução sobre a conjuntura” do PT,
análise ideológica, com nítido viés bolivariano, sobre os erros
cometidos pelo partido por não ter implantado no Brasil uma “democracia
cubana”.
Em determinado trecho, lê-se:
“Fomos igualmente descuidados com a necessidade de reformar o Estado, o
que implicaria impedir a sabotagem conservadora nas estruturas de mando
da Polícia Federal e do Ministério Público Federal; modificar os
currículos das academias militares; promover oficiais com compromisso
democrático e nacionalista; fortalecer a ala mais avançada do Itamaraty e
redimensionar sensivelmente a distribuição de verbas publicitárias para
os monopólios da informação”.
De rigor, a ideia do partido era transformar o Estado brasileiro num feudo petista, com reforma do Estado pro domo sua e subordinação a seus interesses e correligionários, as Forças Armadas, o Ministério Público, a Polícia Federal e a imprensa.
O que mais impressiona é que o desventrar da podridão dos porões do
governo petista deveu-se, fundamentalmente, às três instituições, ou
seja, imprensa, Ministério Público e Polícia Federal, que, por sua
autonomia, independência e seriedade, não estão sujeitos ao controle dos
detentores do poder. Ao Ministério Público é outorgada total autonomia,
pelos artigos 127 a 132 da Lei Suprema, e as polícias funcionam como
órgãos de segurança do Estado e não são instrumentos ideológicos,
conforme determina o artigo 144, da Carta da República. A Constituição
Federal, por outro lado, no artigo 220, garante a absoluta liberdade aos
meios de comunicação.
Por fim, as Forças Armadas, como instituição do Estado, e não do
governo, só devem intervir, com base do artigo 142 da Constituição, em
caso de conflito entre os poderes para restabelecimento da lei e da
ordem. É de se lembrar que, tiveram, durante a crise política deflagrada
pelo mar de lama que invadiu as estruturas do governo, comportamento
exemplar, mantendo-se à distância como observadoras, permitindo o fluir
dos instrumentos democráticos para estancarem a desfiguração crescente
da República brasileira.
Controlar a Polícia Federal, que descobriu o assalto aos cofres
públicos? Manietar o Ministério Público, que tem denunciado os
saqueadores do dinheiro dos contribuintes? Calar a imprensa, que
permitiu à sociedade conhecer os profundos desmandos do governo por 13
anos? É isto o compromisso “democrático e nacionalista” do PT?
Modificar os currículos das academias militares para formar oficiais com
ideologia bolivariana, a fim de servir ao governo, e não ao Estado,
seria transformar as Forças Armadas em órgão de repressão, como ocorre
com os exércitos de Maduro ou dos Castros.
Embora tenha muitos amigos no PT, sempre divergi das convicções
políticas dos governantes ora alijados da Presidência, mas sempre
entendi que sua intenção era a de respeitar as regras democráticas.
Desiludi-me, profundamente, ao constatar que os maiores defensores da
ética, como se apresentavam quando na oposição, protagonizaram o governo
mais corrupto da história do mundo.
Pretenderem agora, em mea-culpa, arrependerem-se por não terem
transfigurado o Brasil numa Cuba ou numa Venezuela é ter a certeza de
que nunca desejaram viver, no país, uma autêntica democracia. Penso
mesmo que a presidente Dilma, que foi guerrilheira, como José Dirceu,
intentando aqui implantar um regime marxista, durante o regime de
exceção dos militares, jamais abandonou o objetivo daquela luta.
Após a leitura da “Resolução da Conjuntura”, minhas dúvidas foram
dissipadas. A democracia verdadeira nunca foi um ideal petista.
extraídaderota2014blogspot
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