Ferreira Gullar: Folha de São Paulo
A posse de José Serra como ministro das Relações Exteriores, semana
passada, assinalou uma mudança significativa entre os governos petistas e
o governo interino de Michel Temer.
Em seu discurso de posse, Serra anunciou que uma nova política exterior
começava a ser implantada no Brasil, afirmando que essa diplomacia
"voltará a refletir de modo transparente e intransigente os legítimos
valores da sociedade brasileira e os interesses de sua economia, a
serviço do Brasil como um todo, e não mais das conveniências e
preferências ideológicas de um partido político e de seus aliados no
exterior".
Com essas palavras, o novo chanceler brasileiro pôs à mostra um dos mais
graves erros cometidos por Lula, que, levado por uma visão ideológica
equivocada, reduziu as possibilidades comerciais do país, o que, somado a
outros equívocos cometidos por Dilma, conduziu-nos à grave crise
econômica que vivemos hoje.
A origem desses equívocos está no populismo que certa esquerda
latino-americana adotou como alternativa à revolução armada, inspirada
em Cuba, que foi dizimada pela repressão. O socialismo bolivariano de
Hugo Chávez serviu de modelo a outras aventuras semelhantes, surgidas na
Argentina, na Bolívia, no Equador e no Brasil.
O Mercosul é a expressão desse populismo no plano do comércio internacional.
Tratou-se de criar um organismo de comércio, limitado a países
latino-americanos, com o objetivo de libertá-los da dominação
norte-americana.
Resultado: os países, como o Chile e a Colômbia, por exemplo, que
mantiveram o livre intercâmbio comercial com os norte-americanos e os
europeus, ampliaram suas exportações, enquanto o Brasil e os demais,
presos ao Mercosul, tiveram suas exportações reduzidas.
Se levado em conta que o comércio exterior é um dos fatores
determinantes do equilíbrio econômico de países como o Brasil,
explica-se a situação crítica a que chegaram nossa economia e a dos
demais integrantes do Mercosul.
Por essa razão, José Serra disse que um dos objetivos de sua gestão é
reatar as relações bilaterais com nossos antigos e tradicionais
parceiros comerciais. Isso, porém, envolve alguns problemas, porque as
normas que regem o Mercosul dificultam semelhante opção.
Mas ela terá que ser feita, pois se impõe como condição imprescindível
para que o Brasil supere a situação a que o governo Dilma conduziu a
economia brasileira.
Por outro lado, como os demais integrantes desse acordo encontram-se em
situação semelhante, deverão eles também, cedo ou tarde, seguir esse
mesmo caminho.
Quando Serra afirmou, em seu discurso, que iniciava uma nova política
externa, estava de fato declarando o fim de um projeto ideológico,
implantado por Lula, cuja pretensão —se não me equivoco— era impor, no
plano internacional, uma divisão entre ricos e pobres, semelhante a que
estabeleceu o populismo em parte da América Latina, nesta última década.
Se meu diagnóstico estiver correto, Lula, como presidente do maior país
latino-americano, considerava-se líder dessa aliança populista, como
demonstram algumas de suas decisões na relação com esses países.
Um exemplo disso é a sua reação em face da expropriação de refinarias
brasileiras por Evo Morales. Melhor dizendo, não houve reação, porque
tudo havia sido combinado antes: como a Bolívia era pobre, podia
apropriar-se de nossas refinarias. Outros exemplos foram o financiamento
do metrô de Caracas e de uma central elétrica em Angola. Lula agia como
se o Brasil fosse propriedade sua.
Mas, se a nomeação de José Serra para o ministério das Relações
Exteriores foi um acerto, a de Romero Jucá como ministro do Planejamento
foi um grave erro, como ficou demonstrado pela publicação, neste
jornal, de sua conversa com Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro.
Nela, fica evidente o seu propósito de impedir o prosseguimento da
Operação Lava Jato. Jucá tentou inutilmente mudar o sentido do que
dissera na gravação. Temer teve que tirá-lo do ministério.
extraídaderota2014blogspot
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