Helena Chagas: Com Blog do Noblat - O Globo
Todo mundo sabe que o chanceler José Serra é, de longe, o nome mais
preparado para substituir Romero Jucá no Planejamento. Além das
credenciais técnicas – ocupou a função no primeiro mandato de Fernando
Henrique -, tem poder de fogo político como senador do PSDB de São
Paulo. Mas Serra não foi convidado e dificilmente será. Afinal, não
cabem dois primeiros-ministros no mesmo semi-parlamentarismo.
Fica claro a cada dia que, na montagem feita por Michel Temer para seu
governo interino – por ele mesmo definido como uma espécie de
semi-parlamentarismo -, o posto de primeiro-ministro é hoje do ministro
da Fazenda, Henrique Meirelles. Com a saída de Romero Jucá no rastro das
gravações do novo homem-bomba da República, Sérgio Machado, Meirelles
ficou ainda mais forte. É agora o único fiador do governo Temer junto ao
PIB.
Tem lógica, portanto, que tenha autonomia para implementar suas
propostas e poder para influir nas nomeações para a equipe. As emas do
Alvorada, as carpas do espelho d’água do Itamaraty e todos os que
participaram da primeira reunião ministerial de Temer sabem que a dupla
Meirelles-Serra funciona como mistura de água com azeite: nada a ver.
Contam colegas de ministério que, na ocasião, Serra tentou dar alguns
palpites na economia, recebidos com muxoxos por Meirelles.
O presidente interino sabe que o ministro da Fazenda não quer Serra no
Planejamento e não vai forçar a barra. Quebrou a cabeça para encontrar
um lugar à altura de Serra na equipe, um Ministério de Relações
Exteriores turbinado com o comércio exterior, e para convencê-lo a
aceitar. É um cargo importante, que não tira completamente o senador do
núcleo decisório do governo, mas que o mantém a uma distância
regulamentar de Meirelles, que tem as rédeas da economia e o posto de
primeiro-ministro informal.
A migração do senador tucano para o Planejamento iria, certamente,
desfazer esse precário equilíbrio e tornar a disputa aberta e
prejudicial ao governo. O que não quer dizer que tudo permanecerá como
está.
Se Temer for confirmado como presidente em definitivo, e Meirelles
entregar o que promete, aprovando reformas estruturais no Congresso,
mudando a trajetória da dívida pública e resgatando a confiança de
investidores e agentes econômicos, consolida-se não apenas como
primeiro-ministro informal desse arremedo de parlamentarismo. Se a
economia começar a dar sinais de recuperação, pode ganhar cacife para se
tornar candidato à Presidência em 2018, num movimento parecido ao do
Fernando Henrique do Real no governo Itamar Franco.
E Serra? Poderá até ser um grande chanceler. Se Meirelles der um jeito
na economia, porém, o tucano perde o primeiro lugar na fila como
candidato preferido do governo em 2018 e vai procurar outra turma.
Esse cenário sofreria modificações significativas se as coisas não
andarem tão bem assim na economia, o que não é também improvável. No
caso de um desempenho mais ou menos, em que a política de Meirelles
segure as contas públicas e evite o pior, mas não consiga injetar ânimo
nos investimentos e nem fazer a economia dar sinais de crescimento, a
candidatura do ministro da Fazenda perde força. Do outro lado da
gangorra, sobe Serra como opção governista em 2018.
A escolha do candidato do campo governista, se houver governo
minimamente sustentado até lá, depende do presidente mas está sujeita ao
imponderável e aos humores de momento. Quem não se lembra que Itamar,
nos idos de 1994, pensou primeiro no então ministro da Previdência,
Antônio Britto, para sua sucessão? Depois de uma recusa é que fixou-se
no nome de Fernando Henrique.
Não se descarta também que, fracassando o primeiro tiro de Henrique
Meirelles para salvar a economia - ainda que por falta de colaboração do
Congresso ou razões alheias a seu desempenho - Temer tente recomeçar
com novo ministro da Fazenda. Quem? José Serra. E aí o céu passa a ser o
limite para o tucano.
E se der tudo errado? Se der tudo errado para o governo Temer (por
exemplo, Dilma Rousseff reassumir), obviamente não haverá 2018 nem para
Serra, nem para Meirelles e nem para mais ninguém a ele ligado.
São muitos os cenários em aberto, sobretudo para os integrantes de um
governo ainda provisório. Até mesmo o sedutor discurso de
semi-parlamentarismo de Temer pode sair de cena, bem como seus eventuais
primeiros-ministros, se ele se consolidar e fortalecer como presidente
da República – quem sabe animando-se a entrar na disputa de 2018 para
continuar usufruindo das delícias do presidencialismo...
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