Sandra Starling O Tempo
Começo a crer que o pior legado de Dilma Rousseff será nos devolver o “complexo de vira-latas”. Com o qualificativo de “jornal sério”, recebo e-mail com editorial do “The New York Times”, o qual elenca uma série de razões para sustentar a tese de que “forçar Rousseff a deixar o cargo causaria grave dano à democracia”.
Não fosse meu correspondente pessoa séria e mestre em ciência política, eu diria que, com certeza, o texto deve ter se tornado uma dessas bíblias com que jovens sem ter o que fazer atulham redes sociais contra os “coxinhas”, porque estes querem o fim da intocabilidade do mandato da presidente. Uma coisa é uma coisa; outra coisa é outra coisa.
Um país que já processou por meio de impeachment um presidente que praticava felatio com uma estagiária em plena Casa Branca durante o expediente não tem moral para julgar se um processo deve ser ou não agora deflagrado contra Rousseff. Até porque, por ora, a honrada senhora se encontra protegida pelo manto sagrado do parágrafo 4º do art. 86, que reza: “O presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”.
Lembro, por necessário, que o rigor com que se aplica esse artigo, que a protege dos atos ao tempo em que era presidente do Conselho de Administração da Petrobras, não tem sido o mesmo rigor (ou falta de rigor) com que há três anos os congressistas fogem de seus deveres constitucionais do parágrafo 2º do art. 57, segundo o qual: “A sessão legislativa não será interrompida sem a aprovação do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias”, vulgarmente conhecida como LDO.
GRANDE BESTEIRA
Elogiar a presidente porque ela não interfere na ação de órgãos que não lhe são subordinados, como faz o editorial, é simplesmente uma grande besteira. Dever respeito às instituições não é escolha nem qualidade de qualquer mandatário: é sua obrigação, mormente tratando-se de quem exerce a Presidência da República de um país.
Ademais, quem julga excepcional tal editorial não tem acompanhado, por certo, as alterações do cenário geopolítico internacional, no qual agora Obama protege Dilma, que, por sua vez, é bajulada por Angela Merkel, porque todos precisam, ora de pôr um freio nos avanços estratégicos da Rússia, ora de se proteger dos movimentos ousados e meio incompreensíveis da política econômica da China.
Não pude deixar de me lembrar do meu saudoso amigo Henfil. Sim, o cartunista famoso, que, na luta contra a ditadura militar, diuturnamente, usava sua verve inquestionável, seu traço inesquecível, e que brindou a nós, militantes antigos de um valoroso partido, que defendia “mesmo se a vaca tossisse” os trabalhadores, os humildes e ofendidos, os excluídos de sempre dos banquetes de quantos bobos hoje se abrigam em metrópoles que “erguem e destroem coisas belas”.
Um dia desses, se Deus quiser, deixarão todos de babar diante do que “deu no ‘The New York Times’”.
EXTRAÍDADETRIBUNADAINTERNET
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