Com Blog do Geraldo Samor - Veja
Em meio a um impasse político e econômico sem precedentes na história do
País, a classe empresarial brasileira parece estar tateando no escuro,
tentando achar seu papel na desmontagem da crise com um olho na
governabilidade imediata e outro no Brasil pós-Dilma.
A busca por este equilíbrio delicado — que tem sido expresso em
entrevistas polêmicas, jantares protocolares e conversas privadas —
mostra os empresários tentando consertar um problema bem diferente dos
seus desafios diários (preços, balanço, fluxo de caixa) e mais afeto a
temas intangíveis e frequentemente subjetivos, como representatividade,
legitimidade e a aplicação da lei.
A grande pergunta é se a crise ora instalada tem, efetivamente, conserto
— e se os empresários estão aptos a contribuir para ele — ou se os
acontecimentos tomaram uma dinâmica própria e serão resolvidos apenas
pelos frangalhos do que sobrou da Política digna daquela letra maiúscula
e pelo funcionamento das instituições.
Homens como Ulysses Guimarães e Mario Covas estão mortos, homens como
Pedro Simon e Cristóvam Buarque ou estão aposentados ou estão na
minoria, e um Fernando Henrique Cardoso parece inclinado a dar
diretrizes da beira do campo, não de dentro dele. Tudo isto enquanto o
que seria o maior partido de oposição — e o intérprete natural da
vontade expressa nas ruas — encontra-se momentaneamente fraturado entre
três agendas pessoais concorrentes.
O consenso entre os empresários é que o problema político se tornou
ainda mais grave que o econômico: o primeiro, na verdade, retroalimenta o
segundo, criando um cenário cujo resultado final é simplesmente
impossível de prever.
Não se pode esperar dos empresários uma voz monolítica: os condutores do
PIB são um grupo tão heterogêneo quanto a própria sociedade, e suas
agendas misturam preferências pessoais, interesses empresariais e uma
vontade de tirar o País da paralisia.
A etiqueta republicana é clara: não se recusa um convite para jantar com o(a) Presidente.
Ainda assim, é quase impossível imaginar algum dos convidados ao jantar
da semana passada no Alvorada — ainda mais a esta altura do campeonato —
com ânimo para falar verdades a Dilma Rousseff.
Todos os comensais sabem exatamente o que tem que ser feito na economia:
além de uma boa intuição própria, eles pagam (e ouvem) os melhores
consultores, mas não dizem as verdades porque sabem que a Presidente —
rodando a 9% de sua popularidade mais ainda a 90% de sua soberba — não
quer ouvir.
Incapaz da mais elementar autocrítica, Dilma continua achando que tudo o
que fez é certo, e se algo deu errado é porque ela “subestimou” um
fator ou outro.
Ainda assim, alguns grandes nomes têm claramente agido como bombeiros.
No dia 8, o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, deu entrevista à
Folha. Disse que o País terá que “consertar o avião em pleno vôo, não
dá pra esperar pela aterrissagem” e, numa aparente referência à oposição
feita por Eduardo Cunha, disse que “as pessoas precisam ter a grandeza
de separar o ego pessoal do que é melhor para o país.”
João Roberto Marinho, acionista das Organizações Globo, tem dito a
interlocutores que “ainda” não vê razões materiais para um processo de
impeachment.
Finalmente, semana passada, Roberto Setúbal, CEO do Itaú Unibanco, disse
que tirar Dilma agora “criaria uma instabilidade ruim para nossa
democracia.” Para quem estava acostumado a associar o Itaú ao PSDB, foi
um momento “Nixon na China”, ou, para os católicos tradicionais, aquele
momento em que o Papa Francisco perguntou, a respeito dos gays: “Quem
sou eu pra julgar?”
Enquanto
os bombeiros se expunham publicamente para drenar o combustível da
crise, na Avenida Paulista alguém teve a bela ideia de acender um
fósforo.
O prêmio hipocrisia da semana ficou com a FIESP, que desancou — talvez o
verbo certo seja “caluniou” — Joaquim Levy, dizendo que o ministro “não
demonstra preocupação com o desemprego no país, com os setores
produtivos.” (Levy é aquele cara convocado a botar a pasta de dente de
volta no tubo, e a FIESP ainda exige que a solução encontrada seja
elegante.)
Paulo Skaf ainda arrematou: “Se o ministro da Fazenda não tiver a
competência de encontrar outros caminhos para resolver a questão
econômica brasileira, a não ser o aumento de impostos, é melhor ele
arrumar as malas e voltar pra casa.”
A posição de Skaf lembra a infeliz cena doméstica em que, puto com a
sogra, o marido bate na mulher. O presidente da FIESP está careca de
saber que os ‘outros caminhos’ para resolver a questão econômica estão
longe de depender da ‘criatividade’ do ministro, e sim de um capital
político que inexiste no atual Governo, que, como no slogan clássico da
monarquia parlamentarista, ainda “reina mas não governa.”
A despeito do fetichismo com “corte de gastos” que existe hoje —
justificadamente — na sociedade, 80% dos gastos públicos são
o-bri-ga-tó-rios, ou por força de vinculações constitucionais, ou por
força de regras que atrelam o gasto ao crescimento da economia. (Outros
10% são a folha de pagamentos de funcionários ativos e os 10% finais são
o investimento público e uma parte pequena do custeio.)
Finalmente, seria cômico, se não obscenamente trágico, ver a reação de
Skaf no dia em que Levy resolver mesmo ir embora e o dólar bater em 4
reais, quebrando a parte dos associados da FIESP que ainda permanecem
solventes.
Os esforços de alguns empresários para agir como bombeiros da crise e o
trabalho diligente da FIESP de aprofundá-la revelam que o Brasil é
acometido de duas condições psíquicas: a Presidente é
maníaco-depressiva, e o PIB, esquizofrênico.
Para quem olha a coisa de fora, fica parecendo o seguinte: os
empresários não querem que Dilma saia, mas também não querem o ajuste
necessário.
Alguém vai ter que ceder.
extraídaderota2014blogspot
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