por Rogério Gentile FOLHA DE SÃO PAULO
Fernando Haddad resolveu mudar o nome de todas as vias de São Paulo que,
direta ou indiretamente, prestam homenagem à ditadura militar –o
Minhocão, por exemplo, deixará de prestar continência para Costa e
Silva, o marechal que assinou o AI-5 e tinha como grande passatempo na
Presidência fazer palavras cruzadas.
Segundo o prefeito, a iniciativa "é um resgate importante, uma
reafirmação do compromisso de São Paulo com os valores democráticos". De
fato, deve ser desagradável morar num lugar que faz deferência a alguém
como o delegado Sérgio Fleury (Vila Leopoldina), símbolo da tortura e
do Esquadrão da Morte.
Mas, a despeito do mérito da proposta, Haddad meteu-se numa contradição
sobre a qual não poderá alegar desconhecimento histórico. Por que o
prefeito, que diz preferir "celebrar a vida daqueles que se dedicaram à
democracia, daqueles que lutaram pelas liberdades individuais", rejeita
uma ditadura, mas aceita que a cidade lisonjeie outras?
São Paulo não reverencia apenas o regime militar. Na cidade há homenagens para ditaduras das mais variadas práticas arbitrárias.
O Estado Novo, chamado por Graciliano Ramos de "o nosso pequenino
fascismo tupinambá", está presente com distinções a Francisco Campos (no
Pari), ministro da Justiça a quem é atribuída a reveladora frase
"governar é prender", a Lourival Fontes (em Sapopemba), chefe do
departamento de censura, e ao próprio Getúlio Vargas (em três bairros,
São Miguel, Jabaquara e Bela Vista), em cujo governo a tortura correu
mais do que solta.
Também há na cidade honrarias aos ditadores Marechal Tito (São Miguel) e
Abdel Nasser (Vila Mariana) e até a Lenin, na, por sinal,
agradabilíssima rua Leningrado (Interlagos).
Ao contrário do que faz parecer o prefeito Haddad com seu revisionismo
seletivo, não existem ditadura boa e ditadura má. Ditadura é sempre
ditadura.
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