editorial do Estadão
O mundo gira, o tempo passa e nenhum investidor vai ficar sentado,
pacientemente, à espera de uma solução sem prazo para os enormes
desarranjos da economia brasileira. Se a presidente Dilma Rousseff, seus
companheiros e aliados e as figuras mais influentes do Congresso
tiverem captado esse fato, a ameaça de rebaixamento do Brasil pela
Standard & Poor’s (S&P) terá sido muito útil. Se o País perder o
grau de investimento, seus títulos serão classificados como “junk
bonds”, isto é, como lixo, e o Tesouro Nacional, já sobrecarregado, terá
de pagar juros maiores para se financiar.
A dívida consumirá mais dinheiro e sobrarão menos recursos para os
programas econômicos e sociais e até – os malandros deveriam pensar
nisso – para as jogadinhas com o orçamento. Por enquanto, o rebaixamento
é só um risco, mas muito próximo. A S&P manteve a nota do Brasil no
nível mais baixo do grau de investimento, mas a perspectiva caiu de
estável para negativa.
O alerta é claro para qualquer pessoa razoavelmente informada, mas ainda
foi traduzido com todas as letras, em Nova York, pela analista
responsável pela avaliação do Brasil, a economista Lisa Schineller. Sem
sinal de melhora, o próximo lance vai ser o rebaixamento para o grau
especulativo. Técnicos do mercado logo acrescentaram um detalhe
assustador: outras agências poderão em pouco tempo seguir a iniciativa
da S&P.
O anúncio da agência foi inesperado. O noticiário recente esteve
concentrado nos contatos do pessoal da Moody’s com funcionários
brasileiros. Não haveria surpresa se essa missão resultasse, em pouco
tempo, em uma reavaliação do País. Mas o lance da S&P surpreendeu
somente pelo momento. A mudança da perspectiva da nota para negativa
estava dentro das expectativas.
A perspectiva mudou para pior, segundo a Moody’s, porque os riscos para a
execução da política de ajuste aumentaram. Os técnicos da agência
aplaudem a correção de rumo no segundo mandato da presidente Dilma
Rousseff, mas chamam a atenção para o agravamento dos problemas
econômicos e políticos. Não se trata do rebaixamento da meta fiscal
anunciado na semana passada, mas do aumento dos obstáculos. As
investigações de corrupção, com envolvimento de políticos e grandes
empresas, deve tornar mais difícil a aprovação das medidas de ajuste no
Congresso, de acordo com a agência.
A probabilidade de novos escorregões da política de ajuste é agora
superior a um terço, por causa dos obstáculos políticos e do retorno
mais demorado a uma trajetória de crescimento firme, de acordo com a
análise divulgada. Mas a nota chama a atenção para um dado positivo: as
investigações são um testemunho a favor das bases institucionais do
Brasil, “em contraste” com o observado em outros emergentes.
Esse aspecto pode ser positivo, mas a consequência imediata das
investigações é uma incerteza maior sobre as condições políticas e
econômicas. Também esta mensagem é explícita no documento divulgado pela
S&P, e as autoridades brasileiras deveriam considerá-la. Para
começar, a presidente e sua equipe deveriam explicar esses fatos à
opinião pública e aos parlamentares aliados.
A tarefa pode ser complicada, como se pode ver pela reação do líder do
governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE). Segundo ele, as
agências de classificação de risco deveriam cuidar de sua vida e deixar
de se meter nos assuntos brasileiros. “Não têm de ficar dando pitaco na
vida interna do Brasil”, disse o coordenador da bancada governista.
Em outra circunstância, essa opinião seria apenas patética e
irrelevante, mas o caso é diferente. Se esse é o líder governista, quem
defenderá a política econômica? Outros parlamentares reagiram como se o
governo estivesse empenhado em usar a decisão da S&P para
pressioná-los. Alguém terá entendido o problema? A S&P talvez tenha
sido otimista ao classificar apenas como “desafiadoras” as
circunstâncias políticas. “Assustadoras” talvez fosse uma palavra
melhor.
extraídaderota2014blogspot
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