editorial do Estadão
Se o governo for competente, os parlamentares cuidarem do interesse
público e os deuses forem complacentes, lá por 2020 ou 2021 a dívida
pública estará controlada e talvez declinando como porcentagem do
Produto Interno Bruto (PIB). Essa meta continua distante, como indicam
as últimas contas de todos os níveis de governo – federal, estadual,
municipal e de parte das estatais – publicadas na sexta-feira passada
pelo Banco Central (BC). A paradeira econômica e o desemprego explicam
parte do estrago nas finanças oficiais. A receita de impostos e
contribuições continua caindo bem mais que a despesa, porque o gasto
governamental é muito rígido. Mas a causa maior do desarranjo financeiro
é mesmo a coleção de erros e desmandos políticos. As piores decisões
foram tomadas ou sacramentadas no Palácio do Planalto, pelo menos desde o
segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O governo promete fechar o ano com um déficit primário – sem a conta de
juros, portanto – igual ou inferior a R$ 170,5 bilhões. Para definir
essa meta foi preciso reconhecer e explicitar graves problemas deixados
pela administração petista. De janeiro a agosto, o resultado primário de
todo o setor público foi um buraco de R$ 58,86 bilhões. Isso foi
possível porque os governos estaduais e municipais conseguiram juntos um
superávit de R$ 10,31 bilhões, enquanto o governo central acumulou um
rombo de R$ 67,98 bilhões. Esta é a soma dos saldos do Tesouro, da
Previdência e do BC.
O maior desafio continua nas contas da Previdência, com déficit de R$
87,56 bilhões de janeiro a agosto. O buraco foi parcialmente compensado
pelo superávit de R$ 20,06 bilhões alcançado pelo Tesouro em oito meses.
Mas essa compensação tem ficado cada vez mais difícil. Em agosto, o
Tesouro também foi deficitário, com um saldo em vermelho de R$ 6,78
bilhões. Nada sobrou, portanto, para tornar menos feio o conjunto das
contas federais, fechadas com um resultado negativo de R$ 21,14 bilhões
em agosto.
Para o balanço fiscal publicado pelo BC leva-se em conta a necessidade
de financiamento do setor público. Assim se calculam os números
positivos ou negativos dos níveis de governo. Um dia antes desse balanço
consolidado sai, normalmente, o relatório mensal do Tesouro com o
desempenho do governo central. Esse relatório cuida só das contas
primárias e mostra a diferença entre a arrecadação e as despesas de
custeio, de investimento e de cobertura de benefícios previdenciários,
sem os componentes financeiros. Os efeitos da atividade econômica e da
rigidez da despesa são mais visíveis nesse relatório.
Pelos cálculos do Tesouro, o governo central teve um déficit de R$ 20,34
bilhões em agosto. A soma dos saldos do Tesouro e do BC foi um
resultado negativo de R$ 5,03 bilhões. O balanço mensal da Previdência
foi deficitário em R$ 15,31 bilhões. De janeiro a agosto, a receita
líquida total, R$ 706,83 bilhões, foi 6,3% menor que a de um ano antes,
já descontada a inflação. Na mesma comparação, a despesa total ainda foi
1,1% maior.
Um conserto efetivo das contas públicas será possível somente com
mudanças estruturais. Sem a reforma da Previdência as finanças do
governo se tornarão inadministráveis dentro de alguns anos. Também será
preciso tornar mais flexíveis outras despesas, com a eliminação, por
exemplo, de vinculações de verbas e de todas as formas de indexação. A
proposta de um teto para o aumento do gasto é apenas um modesto começo,
mas indispensável.
Para uma visão mais ampla e realista dos problemas atuais é preciso
levar em conta o custo dos juros. Por esse critério, o déficit global do
setor público, também chamado de nominal, atingiu R$ 587,04 bilhões em
12 meses, 9,64% do PIB. A média europeia está abaixo de 3%. Aperto de
cinto e juros menores ajudarão a reduzir o buraco e a conter o
endividamento. Isso dependerá também do combate à inflação. O desastre
aumentará se o problema for ignorado ou se o governo apostar em soluções
voluntaristas.
extraídaderota2014bglogspot
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