Minha dentista, também uma querida amiga, perguntou-me: “Paulo, como é viver na orfandade?” Respondi que é difícil: dói. Penso em meus pais todos os dias, para não dizer todas as horas. Mas, no momento em que a dra. Suely fez essa pergunta, pensei em José Monir Nasser. O professor Monir, como todos o chamavam, morreu no dia 16 de março, aos 56 anos, em Curitiba.
Monir foi o pai intelectual de um sem-número de pessoas. Empresários, estudantes, professores, economistas, profissionais liberais, presidentes de entidades, jornalistas – todos se tornavam alunos diante dele. Era um educador no sentido verdadeiro da palavra, se pensarmos que a palavra educar vem do latim ex ducare, conduzir para fora. Suas aulas sobre literatura, filosofia e desenvolvimento econômico literalmente conduziam os ouvintes para fora da caverna da ignorância, mostrando-lhes a luz pura e espiritual do conhecimento. Luz que emanava dos grandes clássicos: Aristóteles, Platão, Santo Agostinho, Boécio, Dante, Shakespeare, Dostoievski, Kafka, Chesterton.
Virgílio de tantos pequenos Dantes, que antes de conhecê-lo não conheciam a comédia das próprias vidas, ele comprovou que o mundo da criação literária e o mundo da criação de riquezas não estão separados, mas fazem parte de um mesmo princípio, essencialmente espiritual. Uma de suas frases – e ele era um frasista genial – ilustra esse pensamento: “Uma sociedade não pode ser rica antes de ser inteligente. Não pode existir uma economia realmente sólida e desenvolvida sem que haja uma elite cultural voltada para os bens espirituais, capaz de guiar, julgar e interpretar os esforços da comunidade”.
Era um crítico impiedoso do sistema educacional brasileiro – esse mesmo sistema que dá nota máxima a redações com erros primários de ortografia e concordância. Em uma de suas palestras, sentenciou: “O que chamamos de educação é, na verdade, ensino. E esse ensino não passa de uma distribuição de promoções sociais em forma de diplomas, na qual ninguém acha que vai aprender coisa alguma”.
Um padre amigo costuma dizer que a vida humana é sustentada por dois pulmões: a fé e a cultura. Monir sabia muito bem disso. No sábado passado, uma empresária aluna (ele não tinha “ex-alunos”) lembrou-se de um episódio em que se queixava ao professor das dores e dramas da vida cotidiana. Monir respondera à empresária, com um sorriso: “Neste mundo não vamos encontrar a tranquilidade. A paz definitiva só existe no Céu”.
Minutos depois de a aluna ter recordado esse episódio, José Monir Nasser fez a sua passagem definitiva. Deixou muitos órfãos – inclusive o autor destas linhas, que nunca o encontrou pessoalmente, mas leu e ouviu suas palavras de mestre.
Obrigado, professor Monir. O nome do meu pai é Paulo Lourenço e ele gosta de falar sobre literatura russa.
Crônica publicada no jornal Gazeta do Povo.
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