Percival Puggina
ZERO HORA,
Há poucos dias fiz aniversário. Embora costume brincar sobre o tema da
minha idade dizendo que tenho 68 anos mas "bem lavado fico como novo", o
fato é que algumas coisas mudaram na percepção que tenho da minha
realidade existencial. Assim: quando eu era jovem, contemplava o futuro
como um horizonte móvel. Ele se ampliava e se distanciava a cada passo
dado. Agora, eu o percebo fixo. A distância entre mim e ele encurta a
cada velinha soprada.
Um dos fascínios da vida,
aqui de onde eu a vejo, é a possibilidade de ouvir o que os jovens falam
e o que alguns dizem aos jovens. Nessa tarefa instigante de ouvir,
comparar e meditar, volta e meia me deparo com a afirmação de que os
anos 60 e 70 produziram uma geração de jovens alienados.
Milhões de brasileiros teriam sido
ideologicamente castrados em virtude das restrições impostas pelos
governos militares que regeram o Brasil naquele período. Opa, senhores!
Estão falando da minha geração. Esse período eu vivi e as coisas não se
passaram deste modo.
Bem ao
contrário. Nós, os jovens daquelas duas décadas, éramos politizados dos
sapatos às abundantes melenas. Ou se era comunista ou se lutava contra o
comunismo. Os muitos centros de representação de alunos eram disputados
palmo a palmo. Alienados, nós? A alienação sequer era tolerada na minha
geração! Todo santo ano, o DCE da UFRGS comemorava como data nacional o
aniversário da Revolução de Outubro (revolução bolchevique de 1917).
Havia passeata por qualquer coisa, em protesto por tudo e por nada.
Surgiu, inclusive, uma figura estapafúrdia - a greve de apoio, a greve a
favor. É sim senhor. Os estudantes brasileiros dos anos 70 entravam em
greve por motivos que iam da Guerra do Vietnã à solidariedade às
reivindicações de trabalhadores. Havia movimentos políticos organizados e
eles polarizavam as disputas pelo comando da representação estudantil. O
Colégio Júlio de Castilhos foi uma usina onde se forjaram importantes
lideranças do Estado. As assembléias estudantis e os concursos de
declamação e de retórica preparavam a rapaziada para as artes e manhas
do debate político. Na universidade, posteriormente, ampliava-se o vigor
das atuações. O que hoje seria impensável - uma corrida de jovens às
bancas para comprar jornal -, era o que acontecia a cada edição semanal
de O Pasquim, jornal de oposição ao regime, que passava de mão em mão
até ficar imprestável.
Agora,
leitor, compare o que descrevi acima com o que observa na atenção dos
jovens de hoje às muitas pautas da política. Hum? E olhe que não estou
falando de participação. Estou falando apenas de atenção, tentativa de
compreensão. Nada! As disputas pelo comando dos diretórios e centros
acadêmicos, numa demonstração de absoluto desinteresse, mobilizam
parcela ínfima dos alunos. Claro que há exceções nesse cenário de
robotização. Mas o contraste que proporcionam permite ver o quanto é
extensa a alienação política da nossa juventude num período em que as
franquias democráticas estão disponíveis à vitalidade da dimensão cívica
dos indivíduos.
Em meio às
intoleráveis dificuldades impostas à liberdade de expressão nos anos 60 e
70, a juventude daquela época viveu um engajamento que hoje não se
observa em quaisquer faixas etárias. Nada representa melhor a apatia
política da juventude brasileira na Era Lula do que os fones de ouvido.
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