Insensato mundo, por Dora Kramer
A frase, no original de Millôr Fernandes, é a seguinte: "Vossa
Excelência chegou ao limite da ignorância e, no entanto, prosseguiu". O
Congresso certamente não ignora o cenário em que ocorre a eleição das
presidências de suas duas Casas. Até porque não há um dia em que não
exista uma nova notícia desabonadora sobre aqueles que já são tidos como
escolhidos para comandar a Câmara e o Senado. ...
Além das suspeitas de todo tipo (processos, inquéritos, fisiologismo,
nepotismo, uso indevido de verba parlamentar, manipulação de emendas
etc.) há os fatos.
O deputado Henrique Eduardo Alves - concluíram os aliados de então,
PSDB e PMDB - não servia para ocupar a vaga de vice-presidente na chapa
de José Serra, em 2002, porque em processo de divórcio litigioso sua
ex-mulher revelou a existência de depósitos de R$ 15 milhões em contas
no exterior sem a devida declaração.
O senador Renan Calheiros foi levado a concluir, em 2007, que não
servia para presidir o Senado por causa da história das despesas
pessoais pagas por lobista de empreiteira, apresentação de documentação
falsa como prova de defesa, uso de laranjas em emissoras de rádio e por
aí vai.
Portanto, deputados e senadores não ignoram que, ao menos em tese e por
critérios razoáveis de avaliação, nenhum dos dois serviria para ocupar
postos de tanto destaque que, entre outras atribuições, os colocam na
linha de sucessão da Presidência da República.
Tomando por base a frase de Millôr, dela fiquemos com o conceito da
insistência, mas afastemos a hipótese de a motivação se sustentar na
ignorância. Imprudência, talvez?
Uma boa dose, sem dúvida. Mas a receita leva outros ingredientes:
covardia, descaso, desrespeito, petulância, malícia, zombaria, cinismo,
desprovimento completo de espírito público e tudo o mais que compõe o
quadro de tranquilidade com que suas excelências chegam ao limite da
desmoralização e, no entanto, prosseguem.
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