General da Reserva Luiz Eduardo Rocha Paiva
Professor Emérito e ex-comandante da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército
No
ano de 2009, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos, então um órgão
do Ministério da Justiça, elaborou o 3º Programa Nacional dos Direitos
Humanos (PNDH3), que estabeleceu a constituição da Comissão da Verdade
(CV) para investigar as violações aos DH cometidas por agentes do
Estado, durante o regime militar, e propôs a revisão da Lei de Anistia
para punir esses agentes..
O PNDH3 foi lançado em dezembro daquele ano,
coroando a primeira fase da campanha revanchista, intensificada com a
ascensão do PT ao poder e patrocinada pela esquerda radical hoje
fortemente enraizada no Executivo. Houve reação do ministro da Defesa e
dos comandantes das três Forças, resultando em mudanças no PNDH3 com
relação aos propósitos da CV e à Lei de Anistia. Mas hoje a reação já
está neutralizada
O modelo de Comissão da Verdade merece questionamentos.
O modelo de Comissão da Verdade merece questionamentos.
A composição do grupo de trabalho (GT) que elaborou o Projeto de Lei (PL) da CV obedeceu ao princípio da imparcialidade? Não.
O
PNDH3 estabeleceu que o GT fosse composto por um representante da Casa
Civil, um do Ministério da Justiça, um da Secretaria Especial dos DH, um
da Comissão dos Mortos e Desaparecidos Políticos, um da sociedade civil
(indicado pela Comissão) e um do Ministério da Defesa. À exceção desse
último, os demais órgãos ou eram dirigidos por antigos militantes da
luta armada ou por simpatizantes da esquerda radical. Um GT 5x1
elaboraria um PL imparcial?
Na Lei em pauta,
a investigação de violações aos DH é restrita às cometidas apenas no
regime militar e, também, somente às cometidas pelos agentes do Estado?
Não.
Conforme a Lei, a CV tem “a finalidade
de examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos
praticadas no período fixado no art. 8º do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias”. O art. 8º diz: “período de 18 de setembro
de 1946 até a data da promulgação da Constituição [1988]”.
A
Lei estabelece que a CV tem o propósito de “efetivar o direito à
memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional”.
Assim, a CV jamais poderia ter decidido investigar apenas as violações
cometidas pelos agentes do Estado, pois a verdade histórica de um
conflito não emergirá de uma investigação voltada apenas para um dos
lados envolvidos. Um absurdo que agride a inteligência ou o senso de
justiça do cidadão de caráter. Além disso, após mais de 30 anos do
término da luta armada e 25 anos da nova Constituição, é surrealismo
falar em reconciliação nacional.
O argumento
de que os guerrilheiros e terroristas ficaram conhecidos e pagaram por
seus crimes e que agora seria a vez dos torturadores serem apresentados
para a condenação moral não se sustenta. Nem todos os primeiros são
conhecidos, nem todos pagaram por seus crimes e muitos foram libertados
em troca da vida de pessoas sequestradas. A Nação não conhece os
componentes dos tribunais de justiçamento de guerrilheiros que
abandonavam a luta armada. Não viu a face de todos que planejaram e
executaram sequestros, atentados e execuções ou atuaram na logística e
na preparação política dos quadros da guerrilha. Atentaram contra a
vida, portanto, violaram DH da Declaração Universal.
Os componentes designados para a CV têm condições de atuar com imparcialidade, como determinado na Lei? Não.
O
art. 2º da Lei reza: “A [CV], composta de forma pluralista será
integrada por 7 (sete) membros, designados pelo Presidente da República
(---)” e, no § 1º, que “Não poderão participar [da CV] aqueles que (---)
não tenham condições de atuar com imparcialidade no exercício das
competências da Comissão”. Pluralismo e imparcialidade? Como? Todos os
componentes são de esquerda, um deles é ex-militante da Ação Popular,
organização terrorista responsável pelo atentado no Aeroporto de
Guararapes em Pernambuco (1966), e uma foi advogada de ex-guerrilheiros.
Se não poderiam compor a CV pessoas que não pudessem ser imparciais,
por que a designação dos seus membros pôde ficar a cargo da Presidente
da República, uma ex-guerrilheira? Por que o Congresso não alterou o PL,
a fim de impor a submissão dos indicados a uma comissão suprapartidária
do Congresso Nacional? Mudança necessária para a credibilidade da CV,
pois é impossível ser imparcial num tema com tamanha carga ideológica,
por mais que se queira. Por que a relatoria do PL ficou com um senador
que foi componente da ALN, organização terrorista de Marighela?
A
Lei da CV determina ainda o seu funcionamento “no âmbito da Casa
Civil”, quando deveria ser no Legislativo, Poder representativo da Nação
e não de uma linha partidária dominada pela esquerda. A CV teria que
ser autônoma em relação ao Executivo.
Pela Lei, impõe-se a investigação dos crimes da luta armada? Sim
O
art. 3º preconiza: “São objetivos da Comissão Nacional da Verdade:
(---) VII – promover (---) a reconstrução da história dos casos de
graves violações de direitos humanos, bem como colaborar para que seja
prestada assistência às vítimas de tais violações”.
Portanto,
tinham que ser investigados os crimes da luta armada. Suas vítimas
precisariam conhecer os responsáveis por suas sequelas, para mover-lhes
ações indenizatórias à revelia da anistia, conforme o parecer de
Ministro do STF com relação a crimes de agentes do Estado e, ainda, para
serem indenizadas pelo Estado. A justiça não pode ser parcial!
Finalizando.
O art. 4º, inciso III, permite à CV “convocar, para entrevistas ou
testemunho, pessoas que possam guardar qualquer relação com os fatos e
circunstâncias examinados”. Eis aí um dilema! A CV veio 30 anos após os
fatos, quando ex-militantes da luta armada ocupam posições na liderança
nacional. E se uma autoridade atual tiver participado direta ou
indiretamente de um crime com vítimas?
Diante
de uma Nação calada em face dessa injustiça, cito Martin Luther King:
“o que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons”.
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