Feira Livre
‘Os sinos de Santa Maria’, por Carlos Brickmann
Um grande poeta britânico, John Donne, escreveu no século 16 que nenhum homem é uma ilha. “A morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano”. As mortes de Santa Maria nos diminuem; e nos obrigam a agir para evitar novas tragédias, que nos diminuiriam ainda mais.Punir os responsáveis, claro. Mas sem esquecer que tirar um alvará é um procedimento que pode levar anos, e que empresário nenhum tem condições econômicas de aguardar. E por que leva anos? Porque há maneiras de contornar as dificuldades e comprar facilidades. Alvará de botequim, por exemplo, sai mais rápido que o de restaurantes; por isso muitos restaurantes funcionam com alvarás de botequim. Há materiais acústicos que retardam as chamas; mas são mais caros. Bote-se um material parecidíssimo, porém muito mais inflamável, e parte da diferença de preço ajudará alguém a ajudá-lo. Superlotação? Nada que um agrado às pessoas certas não consiga transformar em coisa das mais normais.
Há um esquema (que não depende de partidos) para redistribuir a renda obtida com o desprezo à segurança. Pode ser desmontado? Pode: imagine equipes (cujos integrantes se alternem, para evitar cumplicidades) que visitem um estabelecimento a inaugurar e decidam de uma vez se está tudo em ordem. Por que não?
Porque, se houver problema, quem morre não é o dono, nem o fiscal, nem as autoridades. Somos nós, nossos irmãos, nossos filhos. Citando John Donne mais uma vez, não pergunte por quem os sinos dobram.
Eles dobram por nós.
Mata, esfola
A opinião pública quer cabeças ─ seria difícil esperar algo diferente. O delegado de Santa Maria prendeu alguns dos possíveis responsáveis pelo incêndio. Mas por que algemar o sócio da boate? Qual a necessidade das algemas? O risco foi alto: se houvesse tentativa de linchamento, as algemas impediriam o preso de se proteger. Aliás, diz um advogado, a prisão para interrogatório foi inadequada. Veja em www.conjur.com.br/2013-jan-28/justica-gaucha-bloqueia-bens-socios-boate-santa-maria.
Não briguem com este colunista: a opinião é do advogado.
Palavras, palavras…
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, anunciou a operação Prevenção Máxima, com 300 equipes fiscalizando boates. Ótimo: poderia começar com uma das mais requintadas casas paulistanas, a Número, que tem uma porta só, com acesso por uma passarela estreita, e já teve um bar no subsolo. Em frente, um estacionamento tem uma só porta, para entrada e saída, contra a lei. Ambos foram denunciados “n” vezes, sem resultado. Ambos ficam em área elegante.
E o Rio? Também inseguro. O ex-deputado federal Milton Steinbruch lembra que as casas da Lapa são antigas, com janelas pequenas e só uma porta ─ lá estão as boates. Numa delas, aliás, é hábito soltar buscapés nos shows. Casas velhas, com madeira seca, espuma isolante, buscapés.
Depois, a culpa é do destino.
…e mais palavras
Frase do deputado federal (e ex-governador do Rio) Anthony Garotinho, sobre a posição de seu partido, o PR: “Não vamos fazer oposição, nem ser situação”.
Aliás, o PR não será oposição, nem situação, nem muito pelo contrário.
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