Augusto Nunes
A nota oficial
encomendada por Lula, redigida por Rui Falcão e subscrita por seis presidentes
de partidos governistas comunica à nação, entre uma falsidade e uma safadeza,
que está em curso uma trama política semelhante à que resultou no suicídio de
Getúlio Vargas . Só um ajuntamento de palermas, oportunistas e casos de polícia
conseguiria vislumbrar conspiradores em ação nos três partidos oposicionistas
mais dóceis da história.
Só um bando de
cretinos fundamentais ousaria confundir Aécio Neves com Carlos Lacerda, Geraldo
Alckmin com Afonso Arinos, ou tucanos em sossego no poleiro com militares
sublevados nos quartéis.
E até sócios
remidos do clube dos cafajestes se recusariam a comparar Luiz Inácio Lula da
Silva a Getúlio Dornelles Vargas . Coerentes com a folha corrida de
cada um, os signatários do besteirol espancaram sem clemência, e sem vestígios
de rubor na face, a memória do mítico gaúcho.
“Querem fazer
comigo o que fizeram com Getúlio Vargas ”, recitou o palanque ambulante, de
novo, em agosto de 2011. “Assim foi em 1954, quando inventaram um ‘mar de lama’
para derrubar o presidente Vargas ”, reincidiram nesta quinta-feira seis
carrascos da verdade. Alguém precisa contar-lhes aos gritos que foi o próprio
Getúlio quem usou pela primeira vez a expressão “mar de lama”. Alguém precisa ordenar-lhes aos berros que parem de estuprar os
fatos para fabricar mentiras eleitoreiras.
Na versão
malandra do PT e seus parceiros alugados, a procissão de escândalos que afronta
os brasileiros honestos desde a descoberta do mensalão não passa de
invencionice dos netos da UDN golpista, que se valem de estandartes moralistas
para impedir que outro pai dos pobres se mantenha no poder. Se a
oposição não sofresse de afasia medrosa, a confraria dos 171 já teria aprendido
que não há qualquer parentesco entre os dois Brasis. E não se atreveria a inventar
semelhanças entre figuras antagônicas.
Em agosto de
1954, Getúlio Vargas era sistematicamente hostilizado por adversários que
negavam até cumprimentos protocolares ao ex-ditador que voltara ao poder pela
rota das urnas. Não há uma única foto do presidente ao lado de Carlos Lacerda. Passados quase
60 anos, Lula e Dilma lidam com adversários que fizeram a opção preferencial
pela covardia e inventaram a oposição a favor. Muitos merecem
cadeiras cativas na Irmandade dos Amigos do Cara, dirigida por velhas abjeções
que Lula combateu até descobrir que todos nasceram uns para os outros.
Há 58 anos,
surpreendido por delinquências praticadas às suas costas, acuado pela feroz
oposição parlamentar, sitiado por ódios decorrentes dos horrores do Estado
Novo, desafiado por oficiais rebeldes, traído por comandantes militares,
abalado pela deserção dos aliados, Getúlio preferiu a morte à capitulação
humilhante. No Ano 10 da Era da Mediocridade, o Grande Pastor do rebanho
lulopetista só é ameaçado pelo Código Penal, por um STF disposto a cumprir a
lei e pela incapacidade de aceitar imposições do destino.
Neste começo de
primavera, o que se vê é um populista incapaz de perceber a aproximação do
inverno. Os truques do animador de comício não surpreendem mais ninguém.
Tornaram-se enfadonhos. Lula é uma caricatura de si próprio. É uma lenda
precocemente no ocaso. Daqui a muitos anos, será um asterisco nos livros de
história que nunca leu.
Getúlio perdeu
a disposição de resistir ao constatar que, sem saber, convivera com criminosos.
Na última reunião do ministério, foi defendido por figuras como Oswaldo Aranha
e Tancredo Neves. Lula defendeu a permanência de Antonio Palocci e José Dirceu no
primeiro escalão infestado de corruptos. E tenta o tempo todo livrar da cadeia
bandidos de estimação para mantê-los a seu lado. Depois de
tentar inutilmente adiar o julgamento do mensalão, faz o que pode para
pressionar ministros que nomeou, desqualificar a Justiça e impedir a consumação
do castigo.
Há uma semana, o
protetor de pecadores foi empurrado para o meio do pântano pelas revelações de
Marcos Valério divulgadas por VEJA. Em vez de replicar às acusações e
interpelar judicialmente o acusador, o mais loquaz dos palanqueiros emudeceu.
Entre amigos,
gasta a voz debilitada em insultos a ministros do Supremo, mensaleiros
trapalhões ou advogados ineptos ─ e promete, de
meia em meia hora, vinganças tremendas. Em público, pede votos para candidatos
amigos e calunia concorrentes.
O suicídio
de Vargas , reiterei há um ano, foi um ato de coragem protagonizado pelo
político que errou muito e cometeu pecados graves, mas nunca transigiu com
roubalheiras, nunca barganhou com assaltantes de cofres públicos nem foi
coiteiro de ladrões. Lula fez da corrupção endêmica um estilo de governo e um
instrumento de poder.
O tiro
disparado na manhã de 24 de agosto de 1954 atingiu o coração de um homem
honrado.
Um saiu da vida para entrar na história. Outro ficará na
história como quem caiu na vida.
Getúlio matou-se por ter vergonha na cara.
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