EDITORIAL ESTADÃO
Em outubro,
após as eleições municipais, o Senado Federal deverá votar as reformas
políticas previstas em Proposta de Emenda Constitucional (PEC) já
aprovada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), que
prevê a adoção de quatro medidas, entre as quais se destaca uma que é
essencial para acabar com a disfuncional fragmentação partidária que tem
sido um entrave à governabilidade, especialmente num momento de crise
econômica aguda que exige a adoção de medidas duras nem sempre
populares. Trata-se da cláusula de desempenho, que estabelece metas
eleitorais a serem atingidas pelas legendas partidárias para que tenham
acesso aos recursos do Fundo Partidário, ao chamado horário gratuito
para propaganda partidária e eleitoral na mídia eletrônica e à estrutura
oferecida aos partidos no Congresso Nacional.
De autoria dos
senadores tucanos Aécio Neves (MG) e Ricardo Ferraço (ES), a cláusula de
desempenho de que trata a PEC não impõe restrições à existência ou à
criação de legendas partidárias, mas estabelece que terão acesso aos
recursos públicos disponíveis apenas aquelas que conquistarem pelo menos
2% dos votos em 14 unidades da Federação a partir de 2018 e 3% a partir
de 2022. Hoje, há nada menos do que 35 partidos políticos registrados
no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 28 dos quais representados no
Congresso Nacional. Todos eles, inclusive os que não têm nenhum senador
ou deputado federal, têm acesso aos recursos públicos.
Essa
fragmentação partidária compromete a eficiência do sistema de
representação democrática e cria entraves à governabilidade. É uma das
questões tratadas em matéria especial sobre a reforma política publicada
pelo Estado no domingo passado. Entre os vários depoimentos ali
colhidos, afirma o senador Ferraço: “O nosso sistema partidário está na
UTI e padece de condições mínimas para produzir resultados para a
sociedade. Hoje, ele só produz resultados para algumas pessoas e um
grupo de políticos”.
De fato, além de se apresentarem, em alguns
poucos casos, como porta-vozes de interesses corporativos muito
específicos, a maioria das legendas nanicas criadas nos últimos anos tem
servido para abrir a seus dirigentes o acesso aos generosos recursos do
Fundo Partidário e a possibilidade de oferecer a bom preço o tempo de
que dispõem na propaganda eleitoral paga pelo governo nas emissoras de
rádio e televisão. E podem também solicitar e aceitar doações de pessoas
físicas, devidamente registradas na Justiça Eleitoral.
Quando se
cogita a imposição de cláusulas de desempenho destinadas a evitar a
disfuncionalidade do atual sistema partidário, não se trata de impedir o
direito de associação partidária das minorias. Em 2006, 11 anos depois
da aprovação pelo Congresso de dispositivo legal que estabelecia a
cláusula de barreira, o STF decidiu por sua inconstitucionalidade,
acolhendo exatamente o polêmico argumento dos pequenos partidos de que a
medida feria o direito das minorias. Desde então, o número de partidos
aumentou de 26 para 35. E tramitam no TSE os pedidos de registro de mais
meia centena de legendas.
Pela PEC ora submetida ao Senado fica
mantido o direito ao reconhecimento oficial de tantos partidos quantos
obedecerem, a critério do TSE, as condições para sua permanência ou
criação. Qualquer partido poderá sempre aceitar e registrar doações de
pessoas físicas. Mas só terão acesso a recursos públicos aqueles que
comprovarem sua representatividade nos termos das metas de desempenho
eleitoral definidas pela lei.
É claro que, se for aprovada, a PEC
da cláusula de desempenho deverá sofrer novas contestações por parte
dos interessados na manutenção dos benefícios de que desfrutam no
comando de legendas politicamente inexpressivas. E é impossível
antecipar futura decisão do STF. Mas o jurista Nelson Jobim,
ex-presidente da Suprema Corte e ex-ministro da Justiça, não acredita
que os ministros togados voltem a cometer o mesmo “erro absurdo”: “Tenho
a impressão de que, agora, o Supremo já percebeu a bobagem que fez. O
argumento dos pequenos partidos de que ela (a cláusula de barreira)
feria o direito das minorias era uma visão romântica da realidade, que
não dizia respeito à questão”.
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