Com Blog do Josias - UOL
Convertido em réu sob a acusação de cometer os crimes de corrupção
passive e lavagem de dinheiro, Lula se deu conta de que precisa cuidar
dos minutos, porque as horas passam. Seus advogados dispunham de dez
dias para apresentar suas considerações iniciais. Em petição endereçada
ao juiz Sérgio Moro, pediram 55 dias para demonstrar que o tríplex do
Guarujá não lhe pertence.
Lula foi enviado pelo juiz da Lava Jato para o banco em 20 de setembro.
Moro escorou sua decisão na denúncia do Ministério Público. Somando-se
as 149 folhas da peça aos seus anexos, chega-se a um total de algo como
16 mil páginas. A defesa alega que os procuradores da força-tarefa de
Curitiba levaram 55 dias para concluir o trabalho. Em nome da “paridade
de armas”, pedem o mesmo prazo.
Lula é acusado de amealhar R$ 3,7 milhões em vantagens indevidas
bancadas pela OAS. Afora o custo do armazenamento das “tralhas” que Lula
acumulou nos dois mandatos de president, há os confortos introduzidos
no tríplex do Guarujá. Moro deveria conceder o tempo requerido pelos
advogados. Depois que ficou entendido que a conversa mole da
“perseguição política” já não resolve, há muito por explicar.
Os defensores de Lula podem começar, por exemplo, explicando por que a
assessorial do morubixaba do PT admitiu que ele era dono do famigerado
apartamento em dezembro de 2014. Em notícia veiculada no dia 7 daquele
mês, o repórter Germano Oliveira informou: a Bancoop, Cooperativa
Habitacional dos Bancários de São Paulo, que deixara cerca de 3 mil
pessoas na mão por causa de fraudes atribuídas ao seu ex-presidente,
João Vaccari Neto, entregara a Lula o tríplex do Guarujá. Com a falência
da cooperativa, a OAS assumira as obras.
O edifício ficara pronto em dezembro de 2013. Mas o apartamento de Lula
recebera um trato especial. Coisa fina. Antes unidos apenas por uma
escada interna, os três andares foram atravessados por um elevador
privativo. O piso ganhou revestimento de porcelanato. E a cobertura foi
equipada com um ‘espaço gourmet’, ao lado da piscina.
Ouvida nessa época, a assessoria de Lula declarou: “O ex-presidente
informou que o imóvel, adquirido ainda na planta, e pago em prestações
ao longo de anos, consta na sua declaração pública de bens como
candidato em 2006.” Candidato à reeleição naquele ano, o então
presidente Lula de fato havia informado à Justiça Eleitoral que
repassara à Bancoop R$ 47.695,38, uma cifra que não ornava com o valor
de um triplex.
Na sequência, os doutores podem esclarecer por que a assessoria de Lula
mudou a versao sobre a posse do triplex cinco dias depois de reconhecer
que o imóvel era dele. Sob os efeitos da má repercussão da notícia
segundo a qual Lula tornara-se o feliz proprietário de um tríplex à
beira mar, na praia de Astúrias, uma das mais elitizadas do litoral
paulista, o Instituto Lula divulgou, em 12 de dezembro de 2014, uma
“nota sobre o suposto apartamento de Lula no Guarujá.”
Primeiro, o texto retirou a encrenca dos ombros de Lula. Anotou que foi a
mulher dele, Marisa Letícia, quem “adquiriu, em 2005, uma cota de
participação da Bancoop, quitada em 2010, referente a um apartamento.” A
previsão de entrega era 2007. Em 2009, com as obras ainda inacabadas,
os cooperados “decidiram transferir a conclusão do empreedimento à OAS.”
O prédio ficou pronto em 2013. Os cooperados puderam optar entre pedir o
dinheiro de volta ou escolher um apartamento. “À época, dona Marisa não
optou por nenhuma destas alternativas”, escreveu o Instituto Lula.
“Como este processo está sendo finalizado, ela agora avalia se optará
pelo ressarcimento do montante pago ou pela aquisição de algum
apartamento, caso ainda haja unidades disponíveis.” Nessa versão, a
família Lula da Silva estava em cima do muro.
A defesa terá também a oportunidade de sanar outra dúvida: Por que a
mulher de Lula pegou as chaves de um apartamento que dizia não lhe
pertencer? Em 17 de dezembro de 2014, cinco dias depois da nota em que o
Instituto Lula alegara que Marisa Letícia ainda hesitava entre requerer
o dinheiro investido na Bancoop ou escolher um apartamento no edifício
Solaris, moradores do prédio informaram ao repórter Germano Oliveira que
a mulher de Lula apanhara as chaves do triplex número 164 A havia mais
de seis meses, em 5 de junho.
''Todos pegamos as chaves no dia 5 de junho, inclusive dona Marisa”,
disse, por exemplo, Lenir de Almeida Marques, mulher de Heitor Gushiken,
primo do amigo de Lula e ex-ministro Luiz Gushiken, morto em 2013.
Outra interrogação inquietante que flutua na atmosfera à espera de uma
resposta é a seguinte: por que Marisa Letícia demorou seis anos para
decidir se queria ou não o apartamento do Guarujá? Só em 8 de novembro
de 2015 veio à luz a notícia sobre a decisão da mulher de Lula acerca do
apartamento do edifício Solaris. Nessa data, o repórter Flávio Ferreira
informou que Marisa desistira do triplex.
Os assessores de Lula esclareceram que Marisa acionaria seus advogados
para reinvindicar a devolução do dinheiro que aplicara no
empreendimento. Considerando-se que a OAS assumira as obras do edifício
Solaris em 2009, a ex-primeira dama levou arrastados seis anos para
decidir. Cooperados menos ilustres tiveram de decidir na lata, sob pena
de perder o direito de exercer a opção de compra.
Há mais mistério: por que diaboz Lula, Marisa e Lulinha, o primogênito
do casal, inspecionaram as obras da reforma do tríplex? Inquérito
conduzido pelo Ministério Público de São Paulo, enviado posteriormente à
força-tarefa da Lava Jato, inclui carradas de depoimentos curiosos,
muito curiosos, curiosíssimos. Chama-se Armando Dagre Magri uma das
testemunhas. É dono da Talento Construtora.
Armando contou à Promotoria paulista que a OAS contratou sua empresa
para reformar o tríplex número 164 A. Orçou a obra em R$ 777 mil.
Realizou o serviço entre abril e setembro de 2014. Avistou-se com
Marisa. Estava reunido no apartamento com um representante da OAS
quando, subitamente, a mulher de Lula deu as caras. Acompanhavam-na três
pessoas. Descobriria depois que eram o filho Fábio Luís, o Lulinha, um
engenheiro da OAS e ninguém menos que o dono da empreiteira, Léo
Pinheiro, hoje condenado a 16 anos de cadeia na Lava Jato. Inspecionaram
a reforma, atestaram sua conclusão e deram a obra por encerrada.
Zelador do prédio desde 2013, José Afonso Pinheiro relatou ao Ministério
Público que Lula também vistoriou as obras do triplex. Esteve no
apartamento, por exemplo, no dia da instalação do elevador privativo.
Contou que a OAS limpava o prédio, ornamentando-o com flores, nos dias
de visita de Marisa. Uma porteira do edifício disse à Promotoria ter
visto Lula e Marisa juntos no local em fins de 2013. Em suas notas
oficiais, o Instituto Lula não explica o inusitado interesse pela
reforma de um imóvel cuja propriedade o casal nega.
Sempre que tem oportunidade, Cristiano Zanin Martins, um dos advogados
de Lula, reitera: Esse imóvel não é do ex-presidente nem de nenhum
parente. A família Silva comprou uma cota de um projeto da Bancoop. E
quanto às reformas bancadas pela OAS? O doutor costuma dizer que não tem
a menor ideia do porquê da reforma. Nem quer saber, já que este imóvel
não é do ex-presidente Lula ou de qualquer parente do ex-presidente
Lula.
Ou a OAS converteu-se de empreiteira em instituição de caridade ou
alguém ficará no prejuízo. Ou a sentença de Curitiba levará às manchetes
uma terceira versão: a verdadeira.
: os advogados de Lula pediram 55 dias para entregar a defesa. Sérgio Moro concedeu apenas 5 dias.
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