Jornalista Andrade Junior

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

"Porque você vai perder a próxima eleição",

por Marcelo Vitorino Folha de São Paulo

Na última eleição para prefeito, João tinha objetivos claros: derrotaria o candidato da situação e seria o prefeito de uma importante capital. Sua primeira tarefa foi providenciar recursos para pagar a empreitada.
Fez as contas e viu que o dinheiro do fundo partidário não faria frente ao adversário, que contava com o apoio de fornecedores da prefeitura e funcionários em cargos comissionados. Decidiu procurar alguns empresários e amigos que pudessem ajudá-lo. Prometeu-lhes que suas provas de amizade seriam bem apreciadas em caso de vitória. Conseguiu financiamento e foi montar sua equipe.
O marqueteiro, com uma série de vitórias famosas em seu currículo, foi o primeiro a ser escolhido. Em seguida, procurou uma pessoa de mobilização, capaz de contratar, orientar, mobilizar e pagar cerca de dois mil cabos eleitorais. Contratou também um grupo de intelectuais capazes de montar o plano de governo crível e factível.
Pesquisas foram encomendadas. Descobriu-se os bairros em que o candidato era reconhecido e os que ninguém tinha ouvido falar dele; a roupa que passaria a imagem de político comprometido e até as palavras ideais para cada situação. A mídia tradicional local recebeu um conjunto de anunciantes ligados ao candidato, com a condição de serem, no mínimo, complacentes. O circo estava montado.
O marqueteiro tratou de fazer o seu trabalho, e o fez muito bem. Nas primeiras semanas, a propaganda da televisão mostrava apenas vídeos do candidato, com seu nome, histórico familiar e seus amigos. Nas semanas seguintes, propostas para melhorar a cidade, jingles envolventes, depoimentos de jovens com esperança nos olhos e gráficos com o crescimento de seus eleitores.
O site e as redes sociais foram reflexo do que a televisão exibia. As propagandas não mencionaram sequer o endereço do site. Para todos, inclusive o marqueteiro, a web era apenas um canal sem muita relevância.
Nas últimas duas semanas, o candidato a prefeito passou a marcar seu número e pedir o voto. Invadiu o tempo de televisão dos vereadores para massificar seu pedido. Usou todo espaço que poderia ter.
O resultado não poderia ser outro: vitória! Apertada, por menos de 5%, mas vitória!
Em resumo, as condições que possibilitaram que João fosse eleito foram: muito dinheiro, tempo de televisão aproveitado por meio de programas com produção profissional, equipe de rua numerosa, comunicação tradicional, adversários com mentalidade tradicional e mídia favorável.
Com as novas regras eleitorais, definidas pela reforma política, João certamente perderia a eleição. Sem recursos devido a proibição do financiamento privado, como contrataria tantas pessoas? Como pagaria o marqueteiro? De onde viriam recursos para bancar vídeos com produção cinematográfica? Além disso, a campanha foi reduzida. A televisão não terá mais do que 30 dias para convencer eleitores.
Mas há alternativas. A presença digital de um candidato pode ser trabalhada a qualquer tempo. Ficou proibido apenas o pedido de voto antes do prazo, mas qualquer candidato pode construir sua base usando seus sites e perfis em redes sociais.
Hoje, o candidato que apostar na televisão como prioridade corre o risco de ser massacrado por quem estrategicamente se preocupa em formar base de simpatizantes, captar endereços de e-mails e números de celular, apresentando um discurso transparente e coerente.
O que fará a diferença na próxima eleição é o entendimento que cada candidato tem do novo jogo. Como em tudo, o que se adaptar sobreviverá. Quem acreditar que tudo será como antes terá uma surpresa amarga na urna.
MARCELO VITORINO, 36, estrategista de comunicação digital, é professor de marketing digital na ESPM - Escola Superior de Propaganda e Marketing e IESB - Instituto de Educação Superior de Brasília
extraídaderota2014blogspot

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