por Marcelo Vitorino Folha de São Paulo
Na última eleição para prefeito, João tinha objetivos claros: derrotaria
o candidato da situação e seria o prefeito de uma importante capital.
Sua primeira tarefa foi providenciar recursos para pagar a empreitada.
Fez as contas e viu que o dinheiro do fundo partidário não faria frente
ao adversário, que contava com o apoio de fornecedores da prefeitura e
funcionários em cargos comissionados. Decidiu procurar alguns
empresários e amigos que pudessem ajudá-lo. Prometeu-lhes que suas
provas de amizade seriam bem apreciadas em caso de vitória. Conseguiu
financiamento e foi montar sua equipe.
O marqueteiro, com uma série de vitórias famosas em seu currículo, foi o
primeiro a ser escolhido. Em seguida, procurou uma pessoa de
mobilização, capaz de contratar, orientar, mobilizar e pagar cerca de
dois mil cabos eleitorais. Contratou também um grupo de intelectuais
capazes de montar o plano de governo crível e factível.
Pesquisas foram encomendadas. Descobriu-se os bairros em que o candidato
era reconhecido e os que ninguém tinha ouvido falar dele; a roupa que
passaria a imagem de político comprometido e até as palavras ideais para
cada situação. A mídia tradicional local recebeu um conjunto de
anunciantes ligados ao candidato, com a condição de serem, no mínimo,
complacentes. O circo estava montado.
O marqueteiro tratou de fazer o seu trabalho, e o fez muito bem. Nas
primeiras semanas, a propaganda da televisão mostrava apenas vídeos do
candidato, com seu nome, histórico familiar e seus amigos. Nas semanas
seguintes, propostas para melhorar a cidade, jingles envolventes,
depoimentos de jovens com esperança nos olhos e gráficos com o
crescimento de seus eleitores.
O site e as redes sociais foram reflexo do que a televisão exibia. As
propagandas não mencionaram sequer o endereço do site. Para todos,
inclusive o marqueteiro, a web era apenas um canal sem muita relevância.
Nas últimas duas semanas, o candidato a prefeito passou a marcar seu
número e pedir o voto. Invadiu o tempo de televisão dos vereadores para
massificar seu pedido. Usou todo espaço que poderia ter.
O resultado não poderia ser outro: vitória! Apertada, por menos de 5%, mas vitória!
Em resumo, as condições que possibilitaram que João fosse eleito foram:
muito dinheiro, tempo de televisão aproveitado por meio de programas com
produção profissional, equipe de rua numerosa, comunicação tradicional,
adversários com mentalidade tradicional e mídia favorável.
Com as novas regras eleitorais, definidas pela reforma política, João
certamente perderia a eleição. Sem recursos devido a proibição do
financiamento privado, como contrataria tantas pessoas? Como pagaria o
marqueteiro? De onde viriam recursos para bancar vídeos com produção
cinematográfica? Além disso, a campanha foi reduzida. A televisão não
terá mais do que 30 dias para convencer eleitores.
Mas há alternativas. A presença digital de um candidato pode ser
trabalhada a qualquer tempo. Ficou proibido apenas o pedido de voto
antes do prazo, mas qualquer candidato pode construir sua base usando
seus sites e perfis em redes sociais.
Hoje, o candidato que apostar na televisão como prioridade corre o risco
de ser massacrado por quem estrategicamente se preocupa em formar base
de simpatizantes, captar endereços de e-mails e números de celular,
apresentando um discurso transparente e coerente.
O que fará a diferença na próxima eleição é o entendimento que cada
candidato tem do novo jogo. Como em tudo, o que se adaptar sobreviverá.
Quem acreditar que tudo será como antes terá uma surpresa amarga na
urna.
MARCELO VITORINO,
36, estrategista de comunicação digital, é professor de marketing
digital na ESPM - Escola Superior de Propaganda e Marketing e IESB -
Instituto de Educação Superior de Brasília
extraídaderota2014blogspot
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