editorial de O Globo
Coerente com a origem nada abonadora — foi impulsionada pelo presidente
da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) —, a emenda constitucional
da chamada minirreforma política deve ser promulgada na quinta-feira,
quando começará a contar o prazo de 30 dias durante os quais será
mantida aberta a “janela da infidelidade”.
Neste período, vereadores poderão trocar de partido sem qualquer sanção.
O mesmo valerá para deputados em 2018: também por essa época, no ano
das eleições gerais, eles poderão ser “infiéis”, livres de penalidades.
Comete-se mais um atentado ao já pouco representativo quadro partidário
brasileiro. Afinal, ser eleito sob uma legenda e, depois, trocá-la por
outra é caso claro de estelionato eleitoral. Mesmo que seja para o mesmo
chamado “campo político”. Fica mais grave quando situacionistas viram
oposicionistas e vice-versa, o que não é incomum.
Se a imagem de políticos, partidos e Congresso já não é das melhores,
este tipo de esperteza piora as coisas. Ruim para a democracia
representativa, cuja base são os partidos.
Estabelecer o verdadeiro princípio de fidelidade partidária — se quiser
trocar de legenda, o parlamentar deve entregar o mandato, para disputar
uma próxima eleição por outra agremiação — é importante, mas não o
suficiente para que haja uma estrutura partidária com um mínimo de
representatividade.
O deplorável troca-troca de outros tempos foi em certa medida contido
pelo estabelecimento de pré-condições para a mudança de partido:
alteração do programa partidário que contrarie o parlamentar,
discriminação pessoal e migração para nova legenda.
Esta alternativa foi prejudicada quando o PMDB percebeu que o Planalto
aproveitaria a tecnologia do ministro das Cidades, Gilberto Kassab
(PSD), de fundar ou ressuscitar legendas, com a finalidade de
esvaziá-lo.
Um reforço à defesa de partidos com um mínimo de sustentação na
sociedade foi dado pelo Supremo ao apoiar o conceito de que o cargo no
Legislativo — com exceção do Senado — é do partido, não do parlamentar.
Mas esta “janela da infidelidade” é uma espécie de volta à estaca zero. E
a barganha, quase sempre espúria para troca de legenda, é facilitada
pelo fato de haver um excessivo número de partidos representados no
Congresso: mais de duas dezenas.
O problema remete a uma questão, o da necessidade de uma cláusula de
desempenho para que acabe esta pulverização, um fator essencial a fim de
moralizar os entendimento entre partidos em torno de alianças que deem
capacidade de governar ao Executivo.
A pulverização de legendas e uma frouxidão na fidelidade somaram-se ao
fisiologismo do PT e produziram alguns dos piores momentos da República.
A “janela” é um retrocesso.
EXTRAIDADEROTA2014BLOGSPOT
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