por Matias Spektor Folha de São Paulo
Em 30 anos de democracia, o Brasil enfrentou duas crises pontuais de
imagem externa: a chacina da Candelária de 1993 e as revelações do
petrolão.
O fato de estarmos no epicentro da epidemia global do vírus zika
representa a terceira crise dessa natureza. O tema contagia o comentário
internacional sobre o Brasil no momento em que os Jogos Olímpicos
garantem a mais intensa cobertura de imprensa estrangeira na história do
país.
A epidemia da zika afeta a posição do Brasil no mundo porque revela as
dimensões de nosso horror cotidiano. Mostra que a sétima economia do
planeta ainda é incapaz de prover saneamento básico a quase metade de
sua população e, assim, continua à mercê de um mosquito que há décadas
faz milhares de vítimas por doenças as mais variadas.
Essa crise de imagem, porém, é mais grave do que as outras, e não apenas
pelo drama que representa a microcefalia. Um problema é que há governos
estrangeiros em alerta, cujas decisões dependem da credibilidade dos
compromissos brasileiros na matéria.
Outro problema é o risco de sensacionalismo. Já se ouve político
estrangeiro denunciar turistas brasileiros como potenciais ameaças. Já
se sabe que comitês olímpicos mundo afora avaliam os riscos enfrentados
por atletas durante as jornadas do Rio. A cobertura das principais redes
globais de televisão é a que mais preocupa.
Se o sensacionalismo tomar conta lá fora, será difícil encontrar soluções inteligentes ao problema aqui dentro.
Quais soluções? Aquelas capazes de pôr o saneamento no centro da agenda
de obras de infraestrutura do governo. Ou aquelas capazes de oferecer a
mulheres grávidas sem plano privado de saúde a garantia de diagnósticos
rápidos.
Se ganhar terreno, o sensacionalismo também poderá atrapalhar o
necessário debate nacional sobre a prática do aborto num país onde
mulher rica tem autonomia sobre o próprio corpo, mas a pobre, não.
O sensacionalismo ainda dificultará o debate sobre o futuro de
institutos de ponta tais como Butantã, Chagas, Pasteur e Fiocruz, neste
momento de vacas magras para a ciência brasileira.
Combater a crise de imagem externa com uma estratégia de comunicação concebida como tal é parte da própria luta contra o vírus.
O Planalto, porém, ainda não esboçou uma campanha global nem incluiu o Itamaraty em seu comitê de crise.
Quem deu o exemplo semana passada foi o embaixador do Brasil em Washington.
Em artigo para a imprensa americana despido do burocratês que tanto
atrapalha a diplomacia pública brasileira, ele indicou o caminho das
pedras. É só seguir a pista.
EXTRAÍDADEROTA2014BLOGSPOT
0 comments:
Postar um comentário