por Ruy Castro Folha de São Paulo
Outro dia, um cartola do PT declarou que Lula "mora no coração do povo
brasileiro". Na condição de brasileiro em dia com as obrigações e
portador de um coração de dimensões regulares, vi-me tecnicamente apto a
hospedar o ex-presidente. Gelei. A ideia de ter meganhas entrando e
saindo do meu coração, vasculhando cômodos, armários e debaixo das camas
para proteger o chefe, me apavorou.
Além disso, Lula é um hóspede folgado. Apossa-se dos apartamentos e
sítios a que o convidam como se fossem dele. Promove reformas como
derrubar paredes, mudar escadas de lugar e instalar elevadores internos,
vide o famoso tríplex que não lhe pertence no Guarujá -imagine se
pertencesse. Com seu à vontade em relação à propriedade alheia, temo
que, uma vez hospedado no meu coração, logo iria querer alterar o curso
de minhas veias e artérias, como tentou fazer com o rio São Francisco.
E acho que meu coração não comportaria a turma que anda com ele. Lula
começaria a receber seus amigos empreiteiros, pecuaristas e doleiros, os
quais iriam se meter por meus átrios e ventrículos, e sabe-se lá para
onde meu sangue passaria a ser bombeado. Sem falar em sua mulher, dona
Marisa -com suas prerrogativas de ex-primeira-dama, mandaria trocar meus
velhos fogões por luxuosos micro-ondas e atracaria uma canoa em meu
sistema vascular.
Mas isso não acontecerá. Consultei o cardiologista e ele foi taxativo ao
se opor a que eu receba Lula em meu coração, mesmo que por poucos dias.
Como médico, teve péssima impressão do desempenho de Lula no setor da
saúde enquanto presidente. E citou o meu próprio caso.
Nos últimos anos, por certas atribulações cardíacas, quase fui duas
vezes para o beleléu. Do qual só me salvei tomando dinheiro emprestado
aqui e ali, por ter um plano de quinta e não poder contar com um sistema
decente de saúde pública.
extraídaderota2014blogspot
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