editorial de O Globo
Em torno da Operação Lava-Jato transcorrem situações inéditas no Brasil.
Uma delas, de grande repercussão, a forma incisiva e embasada com que
Ministério Público, Polícia Federal e Justiça atuam num meio povoado de
gente poderosa: grandes empreiteiros e políticos em altos cargos, ou
fora deles, mas influentes. Por exemplo, o ex-presidente Lula,
investigado como qualquer cidadão, dentro do que deve ser.
O encarceramento de empresários e políticos é outro fato nunca visto. E
sem que a esmagadora maioria dos pedidos de habeas corpus seja acolhida
nas devidas instâncias, inclusive no STJ e mesmo no STF. Prova da
solidez da argumentação da força-tarefa da Lava-Jato, em que se destaca o
juiz Sérgio Moro, da Justiça Federal de Curitiba.
Outro ineditismo ocorre na aplicação da nova Lei Anticorrupção, no uso
intensivo do recurso da delação premiada — este um instrumento já antigo
— e na aplicação do mesmo instrumento, mas junto às pessoas jurídicas,
mediante “acordos de leniência”, um dispositivo instituído em 2000, mas
pouco conhecido.
Os acordos de leniência permitem que as empresas culpadas de crimes
tenham penas atenuadas, assim como as pessoas físicas no caso dos
acordos de colaboração premiada. Contribuem nas investigações e têm as
punições reduzidas.
O fato de o governo ter editado a medida provisória 703, alterando
dispositivos da Lei Anticorrupção, no lusco-fusco das festas de fim de
ano, levantou justificadas suspeitas. A medida provisória aborda os
acordos com empresas e foi logo vista como uma ação do Planalto para
ajudar empreiteiros apanhados pela Lava-Jato, todos eles importantes
financiadores de campanhas políticas.
Promotores da própria Lava-Jato logo passaram a criticar a medida 703,
acusando-a de prejudicar as investigações, ao acenar com algum tipo de
perdão às pessoas jurídicas. O que retiraria muito do poder de pressão
do Ministério Público.
À primeira vista, tratava-se de uma operação urdida no Planalto, com
apoio da Advocacia Geral da União (AGU), para proteger as empresas,
mesmo que reduzisse o poder de fogo do MP no desbaratamento do
bilionário esquema do petrolão. Estabeleceu-se uma discussão entre
juristas, alguns afastando os temores do Ministério Público.
Seja como for, a preocupação da presidente Dilma de que a punição de
CPFs não leve à falência CNPJs é justificada, mas não pode servir de
biombo para a impunidade de pessoas físicas, acionistas e executivos. E
nem dinheiro público tem de ser mobilizado para salvar CNPJs.
O melhor princípio é o do Proer (programa de saneamento de bancos,
criado depois do Plano Real): a instituição financeira é preservada,
saneada e troca de mãos, sem prejuízo, é claro, de sanções contra os
sócios controladores e executivos com responsabilidade na gestão
temerária.
extraídaderota2014blogspot
0 comments:
Postar um comentário