por Mary Zaidan Com Blog do Noblat - O Globo
A combinação carnaval e política tem o dom de disfarçar a gravidade das
crises. Diverte milhões com fantasias e máscaras, letras originais ou
paródias bem-humoradas - algumas engraçadíssimas. Que valem tanto ou
mais do que enquetes ou pesquisas de opinião. Um termômetro adicional e
preciso para medir quem goza ou não de prestígio popular. E que deve
deixar a presidente Dilma Rousseff, o ex Lula, Cunhas, Renans,
governadores e prefeitos às dúzias ansiando pela Quarta-feira de Cinzas.
Para muitos, o carnaval é uma pausa no desassossego do cotidiano. Mas os
dias de brincadeira que já foram para desafogar mágoas - quase sempre
de um amor perdido - servem hoje muito mais para não pensar no aluguel
que vence amanhã, nos preços da feira, no emprego que deixou de
existir.
Está difícil até para os que querem esquecer tudo, ainda que
temporariamente. Os preços da cerveja e da cachaça, itens inflacionados e
que ganharam novas alíquotas de impostos, não deixam. Até a água está
cara, o confete e a serpentina viraram artigos de luxo.
Criativo, o folião remodela a fantasia, pica papel, substitui a
arquibancada da avenida – neste ano está sobrando ingresso no Sambódromo
do Rio – pelos blocos de rua. Tira o pixuleco do armário, grita “Lula
na cadeia” e “fora Dilma”.
Lula, que já perdera a santidade quando virou pixuleco nas manifestações
pró-impeachment, volta à cena em diversas cidades, encarnado na
fantasia de presidiário, como no desfile da Mocidade Unida da Glória,
candidata ao bicampeonato do carnaval capixaba. A escola levantou a
galera com críticas a políticos - "Será que a malandragem sumiu? Será
que ela comanda o Brasil?" - e passistas mascarados de lulas e dilmas
atrás das grades.
Herói do ano, o juiz Sérgio Moro, que comanda a Lava-Jato, não bateu o
capa-preta dos mensaleiros, Joaquim Barbosa, cuja máscara fez sucesso em
2013. A figura mais popular é mesmo o agente Newton Ishii, chefe do
Núcleo de Operações da Polícia Federal em Curitiba, “o japonês da
Federal”, figura obrigatória na prisão de gente que já foi intocável.
O “Japonês da Federal” também virou marchinha - “Sou Trabalhador...Não sou lobista, senador ou deputado!”, ao lado do “Bar do Cunha”, “Marcha do tríplex”, “Guarde bem sua cartinha”, “Ela petralha e eu coxinha”
e outras tantas. Odes à ironia e ao bom-humor do brasileiro, que,
vítima da agudez da crise, apela ao riso e à galhofa. Como sempre.
Por trás da gargalhada está o repúdio à roubalheira. E sem perdão:
deputado, senador, lobista, Lula e o tríplex, que já foi e não era dele,
que era de sua mulher Marisa Letícia e não é mais.
Nem precisa ir muito além para apontar o estrago para Lula e o PT de o
imbróglio do tríplex cair no popular, amplificado por uma marcha
redondinha, que não para de tocar, animando a folia de Olinda.
É assim, e todo político sabe disso. O carnaval é a maior festa popular,
para o bem e para o mal. Getúlio Vargas odiava ser chamado de velho,
mas surfou no sucesso da marchinha “Retrato do velho” (Haroldo Lobo-Marino Pinto), que acabou virando jingle de sua campanha.
Com a sucessão de escândalos patrocinados pelo lulopetismo nos últimos
14 carnavais, a marcha do tríplex talvez caia no esquecimento. Mas
sabe-se lá para dar lugar a que tipo de alegoria.
Foi-se o tempo em que “bloco de sujo” era comandado por inocentes batidas de lata no lugar do tamborim.
EXTRAIDADEROTA2014
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