EDITORIAL ESTADÃO
Confirmado no posto, o
presidente Michel Temer tem mostrado muito mais disposição para mexer em
assuntos delicados e até para comprar briga do que na fase de
interinidade. Essa é uma das notícias mais animadoras dos últimos dias. A
faxina e o conserto efetivo das contas públicas, hoje em ruínas,
dependem essencialmente dessa disposição. Impor maior controle à folha
de remuneração do funcionalismo tem sido um dos maiores desafios para os
governantes. Na quinta-feira passada, o Palácio do Planalto anunciou o
veto integral ao projeto de lei de reajuste dos defensores públicos da
União. Foi um lance importante para a implantação de um novo estilo
administrativo. Se avançar nessa direção, o governo terá melhores
condições para cuidar ao mesmo tempo das verdadeiras prioridades e da
saúde financeira do setor público. Mantidos os padrões ainda em vigor,
continuarão comprometidos tanto a qualidade das políticas oficiais
quanto o equilíbrio orçamentário.
Alguns dias antes de assinar
aquele veto, o presidente Michel Temer declarou-se contrário à
pretendida elevação de vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal
Federal (STF) – de R$ 33,7 mil para R$ 39,2 mil no próximo ano, segundo
projeto em tramitação no Congresso. Se aprovada e sancionada a proposta,
seu efeito se estenderá muito além da folha salarial daquele grupo de
juízes. Produzirá, como lembrou o presidente, uma enorme cascata de
aumentos em todos os Poderes e em todos os setores da administração,
transbordando até para os níveis estadual e municipal.
Embora a
Constituição defina a remuneração dos ministros do STF como limite de
vencimentos do setor público, na prática a elevação desse teto funciona
como autorização de reajuste para os servidores da administração direta,
das autarquias e das fundações.
Se der resultado, a oposição do
presidente à nova proposta de aumento para os ministros do STF poderá
afastar um perigo imediato, evitando uma enorme cascata de reajustes.
Será um alívio para todos os níveis de governo. Mas uma solução de longo
prazo só será possível com medidas muito mais ambiciosas. Será preciso
eliminar os mecanismos de vinculação de remunerações ou, no mínimo,
encontrar meios de restringir seu funcionamento. Também será importante
liquidar os esquemas de indexação ainda usados para promover a elevação
dos gastos.
O respeito a critérios de indexação produz
consequências tanto na folha de salários e benefícios do funcionalismo
quanto nas despesas da Previdência. Discute-se há anos a desvinculação
entre os custos previdenciários e o salário mínimo, mas o problema
continua sem solução clara e definitiva. Esses e outros vínculos são
componentes de um dos mais conhecidos problemas das finanças públicas
brasileiras, o engessamento. Esse problema é conhecido de economistas de
todas as instituições multilaterais e de profissionais do mercado. O
debate dura mais de 20 anos e nenhum resultado se alcançou até hoje.
Uma
iniciativa promissora foi a elaboração, ainda em 2015, de uma proposta
de limitação do efeito cascata nas folhas de salários. O texto,
produzido originalmente pela senadora Gleisi Hoffmann, poderá ser votado
em breve na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Mas várias
emendas foram adicionadas ao projeto e algumas favorecem a preservação
de vínculos entre vencimentos de diferentes grupos de servidores. Com
tantos apêndices destinados a proteger interesses de categorias do
funcionalismo, a emenda, se aprovada, provavelmente produzirá mudanças
muito menores que as necessárias.
A proposta de teto para o
aumento do gasto público, enviada pelo presidente Michel Temer ainda
durante a interinidade, pode atenuar o efeito das vinculações. Mas o
projeto ainda tramita e permanece, portanto, sujeito a mudanças
importantes e até a deformações. Sem a ajuda de uma base parlamentar
também comprometida com a recuperação fiscal e com a melhora da
administração, os esforços do Executivo serão muito menos eficazes.
Muito mais que o governo, o grande perdedor será o Brasil.
extraídadeavarandablogspot
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