MÍRIAM LEITÃO O Globo
Lula continua um grande estrategista. Diz que ninguém o bate no Brasil, exceto Jesus Cristo, e assim seus interlocutores se esquecem que ele perdeu três eleições presidenciais. Ele se coloca como candidato em 2018 com dois propósitos. O primeiro é de se fazer vítima de perseguição política. O segundo é que ele sabe que o poder se alimenta do futuro do poder. Portanto, se houver uma chance de ele voltar a ser presidente, será olhado com mais reverência pelos que circulam em torno dos governos no Brasil.
Os fatos conspiram contra ele, e não o Ministério Público. Outras partes do mesmo processo trarão novas dores de cabeça para o ex-presidente, como o sítio em Atibaia. E pode ser usada a prova indireta, a mesma que condenou José Dirceu no mensalão, ou seja, de que é impossível que ele não soubesse e não autorizasse aquelas práticas. Não apenas pelo cargo que exercia, mas por todos os outros indícios, citações, o “conjunto probatório”.
Mas nem só de Lula vive a Lava-Jato. Os procuradores aguardam o atendimento do pedido de que o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha desça para a primeira instância. Após a publicação do acórdão da 2ª turma, em Brasília, o que leva em média 30 dias, Eduardo Cunha será investigado por Curitiba. E há muitas frentes de trabalho quando o assunto é Cunha.
O ex-ministro da Fazenda Guido Mantega terá de enfrentar os desdobramentos da ação da última quinta-feira, 22. O que foi revogado foi apenas a prisão e não a investigação em si. Até agora, todas as vezes em que houve busca e apreensão, o Ministério Público acabou apresentando a denúncia contra as pessoas envolvidas. Isso só não aconteceu em investigação na qual se espera a chegada de documentos vindos do exterior. É o que acontece no caso Pasadena.
Mantega continua sendo investigado a partir do testemunho dado ao Ministério Público Federal no Paraná pelo empresário Eike Batista, de que ele pediu dinheiro para pagar contas do partido. Eike fez um movimento estratégico, indo a Curitiba em vez de esperar que Curitiba batesse à sua porta, mas isso não o blinda contra o avanço de investigações. No caso de Mantega, há um debate sobre se o que ele fez é crime ou não. Pedir dinheiro para um partido é crime? Não. Mas se, em razão do cargo público, ou de contratos, a pessoa que pede tem o poder de decidir assuntos do interesse da pessoa que recebe o pedido, isso se configura crime, sim. O ex-ministro era presidente do Conselho de Administração da Petrobras, com a qual Eike tinha contratos. E ele decidia inúmeros assuntos que poderiam favorecer ou prejudicar Eike Batista. Todo o poder que ele tinha na época proibia que ele fizesse parte da atividade arrecadadora do Partido dos Trabalhadores.
O PT usou a máquina do partido para arrecadar como nenhum outro. De forma sistemática. É isso que levou à prisão os seus tesoureiros desde o mensalão. Só sendo mesmo uma política de partido, e com o apoio de quem estava no governo, para explicar o fato de que grandes empreiteiros aceitavam exigências feitas por João Vaccari. Um Paulo Roberto Costa, um Renato Duque tinham poder de fechar ou revogar contratos e por isso as empresas pagavam propina a eles. Mas de onde vinha o poder de João Vaccari? O que pode o tesoureiro de um partido contra uma grande empreiteira? Nada, exceto se o tesoureiro tiver poder para além do que seu cargo indica, ou seja, se ele estiver vinculado a autoridades do próprio governo, se a sua ação for respaldada por quem está dentro da máquina pública.
Sobre esses enigmas, dados e novos nomes é que se debruça a Lava-Jato neste segundo semestre de 2016. Quem pensava que a operação estava esgotada, ou poderia ser abafada, errou. Ela continua em plena atividade e já organizando os próximos passos.
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