MÍRIAM LEITÃO O Globo
O delegado Filipe Hille Pace e a procuradora Laura Tessler mostraram que a fase saiu desse quebra-cabeças, juntando um fio solto capturado numa fase com um e-mail encontrado em outra fase, e assim por diante. A Odebrecht está preparando a delação premiada da empresa e dos executivos, mas o que ficou claro na entrevista dos investigadores é que, ainda que eles não falassem, as provas já elucidam muitos fatos.
— Achamos uma planilha na 23ª onde havia um nome que não sabíamos quem era (italiano), e outras investigações nos levaram ao que deflagramos hoje. Nós não escolhemos uma pessoa e vamos procurar os dados. As informações que investigamos é que levam aos personagens — disse Filipe Pace.
Na 23ª fase, a Acarajé, foram presos, entre outros, os dois marqueteiros do PT e uma funcionária de confiança da Odebrecht, a secretária há mais de três década na empresa Maria Lúcia Guimarães Tavares. Ela entregou informações valiosas, e com ela foram apanhadas também planilhas de pagamentos de propinas, que, apesar dos codinomes, ajudaram a esclarecer vários pontos investigados. Por esse caminho se chegou ao setor de operações estruturadas da Odebrecht, a ala clandestina da empreiteira dedicada à corrupção. Para se saber quem era o “italiano” foi importante cruzar com informações que estavam no celular de Marcelo Odebrecht, apreendido quando ele foi preso na 14ª fase, a Erga Omnes.
O que impressiona é a quantidade de interesses que a Odebrecht tinha no governo, e os muitos fios que ligavam a construtura ao ex-ministro da Fazenda. Um deles era a Medida Provisória que recriava o crédito-prêmio de exportação. O absurdo desse benefício era evidente e o assunto foi ao Supremo, que felizmente derrubou a medida. Com essa vantagem frustrada, a Odebrecht começou a conversar com Palocci sobre como a empreiteira poderia ser “compensada”. Tudo impressiona pela desfaçatez. Uma delas está explícita no e-mail de Marcelo Odebrecht a seus assessores, quando ele diz que vai se encontrar com um político e que deve proteger o bolso. Ele responde: “a pergunta é se tem algo que eu posso buscar com ele.”
Os dados revelam que a ligação com Palocci acontece inicialmente com ele na Fazenda. Nesse caso, os investigadores tiveram que descobrir que JD não era José Dirceu, mas sim Juscelino Dourado, o chefe de gabinete de Palocci na Fazenda. Os contatos com a empreiteira continuaram no período em que ele não exercia cargo público, foram mantidos quando foi para a Casa Civil e permaneceu depois que saiu. Essa linha constante é que o levou à prisão, ontem, porque Palocci, dentro ou fora do governo, estava citado nos negócios da Odebrecht.
Palocci foi uma escolha inesperada para o Ministério da Fazenda em 2003. Havia dúvida se Lula escolheria para ministro Aloizio Mercadante ou Guido Mantega, que vinham assessorando a economia do PT desde o começo das disputas presidenciais. Os dois economistas defendiam ideias que se chocavam diretamente com as bases da estabilização e por isso a chegada do partido ao governo elevou o dólar e a inflação.
O médico Antonio Palocci foi um bom ministro da Fazenda, mas acabou derrotado pelo seu lado obscuro. Com grande capacidade de comunicação, uma equipe competente de economistas sem ligação partidária, Palocci venceu a crise de confiança, fez um ajuste fiscal em 2003 que permitiu o crescimento a partir de 2004.
Palocci tem muito a explicar, além das suas relações com a Odebrecht. Ele foi citado por recolher propina em Belo Monte na delação de Otávio Azevedo, da Andrade. E está na extensa lista de Delcídio Amaral. Não há relação entre a acusação que levou Palocci a ser preso ontem e a que levou Guido Mantega para a prisão, baseado no depoimento do empresário Eike Batista. Mas as duas fases, 34ª e 35ª, mostram que o PT usou o Ministério da Fazenda para arrecadar bem mais do que impostos.
EXTRAÍDADEAVARANDABLOGSPOT
0 comments:
Postar um comentário