EDITORIAL O GLOBO
Da denúncia, de 1997, de que compadre de Lula assediava
prefeituras petistas, até o petrolão, há uma linha coerente de um grupo
em busca do dinheiro público
A prisão temporária do ex-ministro Antonio Palocci, o segundo ministro
da Fazenda da era lulopetista a ser detido pela Lava-Jato — Mantega, o
primeiro —, ajuda a compor um quadro amplo dos maus costumes que o PT
desenvolveu no trato com o dinheiro público. Não começaram em Brasília.
Vêm de muito longe os desvios neste campo; desde quando o partido
começou a vencer eleições municipais e a conquistar as primeiras
prefeituras no entorno da São Paulo e interior do estado.
É de 1997 a denúncia do militante e dirigente petista Paulo de Tarso
Venceslau contra o amigo do peito de Lula, Roberto Teixeira, advogado e
próximo do ex-presidente até hoje. Mantêm relação de compadres.
Incomodado com consultorias que Teixeira oferecia a prefeituras
petistas, Tarso, ainda crédulo com o PT, relatou à cúpula da legenda a
preocupação com aqueles negócios.
Criou-se — por certo, a contragosto de Lula — uma comissão para examinar
o assunto. Ela propôs a abertura de processo ético-disciplinar sobre o
companheiro Teixeira. A Executiva Nacional acolheu a proposta, nas nada
mais aconteceu. A não ser a expulsão de Paulo de Tarso, a decisão de um
dos membros da comissão, Hélio Bicudo, fundador do partido, de se
desligar — viria a ser um dos signatários do pedido de impeachment de
Dilma — e o desgaste junto ao lulopetismo do jovem José Eduardo Cardozo,
reabilitado no partido só agora, na defesa que fez de Dilma.
Essa passagem pode ser considerada a pedra fundamental de um contumaz
comportamento delinquente de desviar dinheiro público para o projeto de
poder hegemônico da legenda, e o enriquecimento de alguns, o que só
ficaria à vista da sociedade a partir do mensalão, em 2005.
A atuação de Palocci nessa engrenagem, em investigação pela Lava-Jato, é
coerente com este lado sem ética do lulopetismo, ativo há muito tempo.
Médico sanitarista, prefeito competente de Ribeiro Preto (SP) —
responsável pela privatização parcial da telefônica da prefeitura, algo
inédito naquele tempo —, e hábil ministro da Fazenda num momento grave,
no início do primeiro governo Lula, Antonio Palocci repetiria o caminho
subterrâneo de muitos outros dirigentes.
Tendo assumido a coordenação da campanha de Lula em 2002, com o
assassinato do prefeito Celso Daniel, de Santo André — outra história
envolta em brumas —, Palocci cresceu dentro do partido e, depois, no
governo.
Agora, pelas revelações da Lava-Jato, começa-se a saber como o
ex-ministro passou a servir de intermediário nas sombras entre a
Odebrecht e o PT. De 2008 a 2013, teriam saído do caixa dois da
empreiteira para o partido R$ 128 milhões.
Já eram conhecidos os sinais de enriquecimento de Palocci. Depois que saiu do governo enxotado pela revelação do caseiro Francenildo sobre a frequência com que visitava uma casa em Brasília destinada a festas e negócios, Palocci parece ter se dedicado com afinco a consultorias, atividade que o derrubou da Casa Civil de Dilma. Sempre essas consultorias.
Palocci se junta a outros “capas pretas” petistas apanhados em delitos, além do próprio Lula: José Dirceu, Genoíno, João Paulo Cunha, Delúbio Soares, para citar alguns poucos. Tudo muito coerente com o que aconteceu em 1997, na denúncia de Paulo de Tarso Venceslau.
Felizmente, acontece um processo dialético no conflituoso relacionamento entre o PT e a democracia representativa brasileira: pressionada pelo partido, aliados e satélites, ela ganha força, cria anticorpos.
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