ALEXANDRE SCHWARTSMAN FOLHA DE SP
O motivo não poderia ser menos nobre. O BC já havia deixado claro na ata do Copom do final de novembro (e reiterado a mensagem no Relatório Trimestral de Inflação divulgado na semana passada) que, muito embora tenha (mais uma vez) adiado a convergência da inflação para a meta para 2017, "adotará as medidas necessárias (...) [para] trazer a inflação o mais próximo possível de 4,5% em 2016, circunscrevendo-a aos limites estabelecidos pelo CMN (...)". Em outras palavras, não quer permitir que a inflação ultrapasse novamente o limite superior do intervalo em torno da meta, 6,5%.
Dado, porém, que as expectativas para 2016 já se encontram em quase 7% (o Banco Central projeta pouco mais que 6%, mas seu histórico de previsões não sugere que devamos acreditar nisto), entre as "medidas necessárias" se encontra muito provavelmente novo ciclo de elevação da taxa de juros, a se iniciar em janeiro.
Assim, ao elevar a meta de 4,5% para 5,5%, o limite superior passaria de 6,5% para 7,5%, esperteza que, de acordo com os idealizadores da proposta, tiraria do BC o ônus de subir a taxa Selic.
Como se costuma dizer, todo problema complexo tem uma solução simples e, obviamente, errada.
A proposta implicitamente pressupõe que as expectativas dos agentes econômicos se manteriam inalteradas, mesmo após o anúncio de nova informação, isto é, que, mesmo sabendo que o BC passaria a perseguir um alvo distinto (e, para deixar claro, o alvo a que me refiro não é a meta, mas seu limite superior), as pessoas passivamente ignorariam esta valiosa informação ao negociarem seus salários ou definirem seus preços.
Posto de outra forma, a ideia de que se pode evitar o aumento de juros por meio da elevação da meta para a inflação se baseia na noção que pessoas são incapazes de entender o que está ocorrendo. Não chega a ser surpreendente, pois vem do mesmo tipo de "economista" que acredita que indivíduos têm que ser tratados como crianças, tutelados pelo "papai Estado".
A adoção de tal medida, porém, levará justamente ao contrário do esperado pelos autores da proposta. As expectativas de inflação (e não apenas para 2016) irão subir refletindo a nova informação.
Por causa disso, salários e preços subirão mais do que fariam caso a meta tivesse sido mantida, acelerando adicionalmente a inflação e o BC será obrigado a elevar ainda mais a taxa de juros (ou a aceitar inflação mais alta). Um caso clássico de tiro que saiu pela culatra, apenas mais um entre tantos que tivemos o privilégio de testemunhar nos últimos anos.
O regime de metas para a inflação está em vigor desde 1999, tempo mais do que bastante para que o entendimento acerca de seu funcionamento já estivesse suficientemente difundido de forma a evitar que propostas como esta viessem à luz do sol. Mas não: erradicar o analfabetismo econômico é tarefa que não cessa.
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