Jornalista Andrade Junior

sábado, 30 de janeiro de 2016

A VEIA REVOLUCIONÁRIA DO MST

Por Carlos I. S. Azambuja

Em janeiro de 1984, em um Encontro Nacional realizado em Cascavel, Paraná, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra foi formalmente constituído com base em uma série de princípios. Alguns merecem ser recordados:- lutar por uma sociedade sem explorados e exploradores;- acabar com o capitalismo, implantando em seu lugar uma sociedade justa e solidária;- ser um movimento de massa, autônomo das centrais sindicais e dos partidos;- articular-se com os trabalhadores das cidades e com os camponeses dos demais países da América Latina;- desenvolver formas massivas de pressão, articuladas com outras formas de luta;
- fazer com que o acesso à terra seja obtido por meio de pressão e de luta;
- formar quadros, em todos os níveis, para garantir a resistência de massa nas terras conquistadas.
Com base nesses princípios, que vêm sendo observados durante estes 31 anos, hoje não é mais segredo para ninguém que o objetivo estratégico do MST é a transformação e ultrapassagem da sociedade capitalista. Para isso, vem impondo como objetivos táticos a invasão e ocupação de terras em todos os Estados, a organização do modo socialista de produção nas terras conquistadas, a educação socialista dos militantes assentados, e a ininterrupta formação de quadros nos moldes marxistas-leninistas.
Para essa tarefa o MST possui um número não conhecido de militantes profissionalizados. Isto é, militantes que recebem salário, embora não trabalhem na terra e nem peguem na enxada. Militantes que sobrevivem de uma profissão que se supunha extinta após o furacão que desmantelou o socialismo real: a agitação social.
Atento ao fato – a exemplo dos zapatistas – de que na chamada guerra pós-moderna a informação é a mais eficiente das armas, o MST navega na Internet com a home-page www.mst.org.br.
Em agosto de 2000, em Brasília, o MST realizou seu 4º Congresso, que contou com a presença de 10.538 sem terra, sendo 107 estrangeiros procedentes de 25 países, representando 45 organizações.
As conclusões desse Congresso foram inequívocas quanto ao objetivo de dar alento a uma conflagração rural. Um dos membros da Coordenação Nacional do MST, Jaime Amorim, liderança dos sem terra em Pernambuco, afirmou que “é necessário transformar cada sem terra, cada sem teto, num soldado da revolução”.
O MST é um movimento clandestino – pois não tem personalidade jurídica -destinado à tomada do Poder, sendo a reforma agrária apenas um meio de negociar posições. Nesse sentido, o líder João Pedro Stedile foi claro: “Agora percebemos que o modelo também sufoca, porque com a terra apenas se come, mas não se avança. Nossa ação, daqui em diante, será unirmo-nos com outros movimentos” (Jornal do Brasil, 21 de maio de 2000).
Gilmar Mauro, outro dirigente, questionado sobre se o MST havia se convertido em uma guerrilha, respondeu: “Estimulamos as lutas de massas. A decisão de ser guerrilha ou não está no horizonte próximo. De nada adianta ter dez mil fuzis se a massa não está organizada” (Jornal do Brasil, 14 de agosto de 2000).
Anteriormente a essa declaração de que “as massas não estão organizadas” foi realizado um Encontro, em 1997 em Itaici, São Paulo, com a participação de gente do campo, religiosos, leigos, filiados ou não a partidos políticos, ocasião em que foi constituída uma entidade denominada Consulta Popular.
O Consulta Popular é uma rede nacional que pretende ser um espaço onde se desenvolvam três tipos de iniciativas: a formação política de militantes, a organização de lutas populares, e a formulação de um novo projeto para o Brasil.
Essa organização produz regularmente vídeos e cartilhas sobre o desemprego, dívida externa, reforma agrária, trabalho de base, análise da situação brasileira, etc. Também patrocina debates, seminários cursos e jornadas de lutas. A chamada Marcha Popular pelo Brasil, realizada em outubro de 1999, que levou cerca de mil sem-terra do Rio de Janeiro a Brasília, foi organizada pelo Consulta Popular.
O Consulta Popular dispõe de uma Coordenação Nacional, em sua grande maioria composta por intelectuais, cuja Secretaria funciona em São Paulo, e Coordenações em diversos Estados. De uma forma geral, seus militantes são também militantes de diversas outras organizações, que muitos insistem em denominar de “movimentos sociais”, como o MST, as pastorais sociais da CNBB, o Movimento dos Pequenos Agricultores, a Central de Movimentos Populares, a Articulação Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais, além de sindicalistas, estudantes e intelectuais. João Pedro Stedile, a liderança mais visível do MST, integra a Coordenação Nacional do Consulta Popular.
Pode ser dito, com convicção, que o Consulta Popular é o braço político do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. Além disso – o que é grave -, o MST integra e é coordenado por um movimento internacional denominado Via Campesina, sediado em Honduras. No site da Via Campesina, na Internet, lê-se: “A Via Campesina é um movimento internacional que coordena organizações camponesas de médios e pequenos agricultores, de trabalhadores agrícolas, mulheres e comunidades indígenas da Ásia, África, América e Europa”.
Ou seja, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, “coordenado” pela Via Campesina, executa as políticas e táticas formuladas por “um movimento internacional”.
Lê-se ainda no site da Via Campesina que o seu escritório para a América do Sul funciona no mesmo endereço do MST e da revista “Sem Terra”: Alameda Barão de Limeira 1232, São Paulo, Brasil.
Egídio Brunetto, que integra a Coordenação Nacional do MST, integra também a Comissão Coordenadora Internacional da Via Campesina.
João Pedro Stedile, em uma recente entrevista, disse que “O MST tem uma vocação internacionalista (...). A Via Campesina é uma articulação internacional dos movimentos camponeses de todo o mundo. Ela cresce a cada dia e hoje já temos organizações de 87 países, em todos os continentes (...). Em uma frase, a Via Campesina representa a união e unidade internacionalista para enfrentarmos juntos a sanha do capital internacional (...). E pode escrever aí: no final da história vamos vencer” (revista PUCViva, julho de 2003).
Em maio de 2000 a Via Campesina e o MST patrocinaram em Sidrolândia, Mato Grosso do Sul, a realização do “Curso de Capacitação de Militantes de Base do Cone Sul”, para ativistas do Brasil, Bolívia, México, Cuba, Nicarágua e Honduras. O tema central do curso foi proporcionar conhecimentos sobre o “modus operandi” do MST. Um dos trabalhos apresentados no curso assinala que “a ação militar sem orientação e controle político é como uma árvore sem raízes. É necessário articular a resistência com a sociedade local, nacional e internacional, para que se consigam vitórias econômicas e políticas”.
Se isso não fosse o bastante, a imprensa noticiou, em 24 de julho de 2003, que a Via Campesina iniciou, nesse mês de julho de 2003, a instalação de quatro grandes acampamentos no Rio Grande do Sul, “com o propósito de servir de apoio à marcha dos sem terra que se dirige a São Gabriel”. E mais: que o organizador desses acampamentos é um membro da Coordenação Estadual da Via Campesina, o que significa que a Via Campesina está organizada no Brasil, fato que atenta contra a Soberania Nacional! Observe-se que as pessoas que defendem as atividades do MST e da Via Campesina no Brasil são as mesmas que reclamam indignadas e participam de manifestações contra a “intromissão do capital estrangeiro, dos organismos internacionais e dos EUA em nosso país, ferindo a Soberania Nacional”.
Nesse mesmo dia, João Pedro Stedile, integrante das direções do MST e Consulta Popular – pronunciou uma palestra em um desses acampamentos, em Canguçu, RS, convocando os sem terra à luta armada contra os fazendeiros. Disse que são 23 milhões de sem terra contra 27 mil fazendeiros. Ou seja, “são mil contra um. Será que mil perdem para um? O que nos falta é nos unirmos para cada mil pegarem um. Não vamos dormir até acabarmos com eles” (Jornal do Brasil, 14 de agosto de 2000). Ele deve estar, hoje, com muito sono...
Antes dele, José Rainha Junior – que atualmente voltou a ser condenado - também da Coordenação Nacional do MST, prometeu um novo Canudos no Pontal do Paranapanema, São Paulo, e Miguel Stedile, 24 anos, filho de João Pedro Stedile, seguindo os ensinamentos do pai, afirmou: “Queremos a socialização dos meios de produção. Vamos adaptar as experiências cubana e soviética no Brasil” (revista Época, julho de 2003).
João Paulo Rodrigues, também da Coordenação Nacional do MST, declarou que “se um milhão de famílias acamparem na beira das estradas, a reforma agrária será feita no tapa” (imprensa, 05 de agosto de 2003).
Donizete de Freitas, apontado como um dos coordenadores de doutrina do MST em São Paulo, declarou que “há muitos MSTs dentro do MST” , e admite que a insurgência pode vir a ser uma opção do movimento: “A luta do trabalhador rural segue por muitos caminhos. Um deles, o mais radical, é do da luta armada” (O Estado de São Paulo, 10 de agosto de 2003).
Zelito Luz da Silva, um dos coordenadores regionais do MST em São Paulo, falando a cerca de 300 militantes do Movimento, em Teodoro Sampaio, convocou os militantes a “reagirem contra os que querem colocar o movimento no gueto. Chegou a hora da gente não vacilar, só a luta leva à vitória. Quando a gente reagir não vai ter choro nem vela. Fiquem atentos na casa de vocês, porque a qualquer momento alguém vai bater na porta e dizer que chegou a hora da luta. Hoje somos 20, 50 mil, logo seremos milhões e vamos fazer a mudança que esse país jamais viu” (O Estado de São Paulo, 15 de agosto de 2003).
Um dado interessante é o de Zelito Luz da Silva ter sido condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, a 2 anos de prisão em 13 de dezembro de 1999, juntamente com outras lideranças dos sem-terra, por “formação de quadrilha”, com sursis por 2 anos, por ser “primário” (O Estado de São Paulo de 17 de dezembro de 2000).
Essa série de declarações dos sem-terras vêm sendo respaldadas pela Procuradoria-Geral da República. Em palestra proferida no seminário “Combatendo a Impunidade – Crimes Financeiros e Lavagem de Dinheiro”, realizado em Brasília, o então Procurador-Geral defendeu a invasão, “pelos movimentos sociais, de propriedades rurais usadas para especular”, pois “a Constituição embute a idéia de solidariedade”. Disse também que “a criação de uma Coordenação dos Movimentos Sociais que une sem-terra, sem-teto, estudantes e sindicalistas, é muito boa” (Jornal do Brasil de 14 de agosto de 2003).
É mais do que notório que o MST envereda por áreas estranhas à finalidade para a qual foi constituído e que suas atividades se assemelham cada vez mais às de um movimento político e, com arrogância, arvora-se defensor e responsável pela vida e destino das massas anônimas do país. O MST, transformado em um movimento político revolucionário, apenas usa a questão camponesa para efeito de propaganda e, principalmente, de financiamento, pois além do dinheiro recebido do exterior, absorve uma percentagem considerável de todo o dinheiro que o governo repassa aos assentados, uma espécie de pedágio.
Pode ser dito que o fracasso econômico do MST em seus assentamentos gera o sucesso político, que é o fim desejado pelas lideranças do Movimento.
Agora o MST vem ampliando seu raio de ação, agregando aquele grupo que na linguagem da própria esquerda é tachado de lumpem urbano, criando favelas rurais, bloqueando rodovias, interceptando e saqueando caminhões, ocupando e destruindo pedágios, invadindo propriedades rurais, roubando gado, depredando prefeituras e prédios do INCRA e tomando pessoas como reféns. Para isso conta com a anuência do próprio INCRA e a inoperância calculada do Ministério do Desenvolvimento Agrário, convertidos em aparelhos do MST, e agora também do então Procurador-Geral da República!
As autoridades, no entanto, não parecem preocupadas. O ministro chefe da Casa Civil da presidência disse que: “a recente onda de invasão de terras e terrenos desocupados no país não é uma ameaça à população, nem significa uma situação de ‘descontrole’ do governo federal. São problemas sociais...” (Estado de São Paulo, 01 de agosto de 2003). Com relação à condenação de José Rainha Junior, o então Secretário Nacional de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, em 01 de agosto de 2003 acusou o Juiz que o condenou de “falta de sensibilidade social” (jornais, 31 de julho de 2003).
Por outro lado, as liminares de reintegração de posse de propriedades rurais invadidas simplesmente não são cumpridas pelos governos estaduais. Em julho de 2003 existiam 338 mandados de reintegração de posse, concedidos pela Justiça, não cumpridos, sendo 161 no Pará, 68 em Mato Grosso, 20 em Alagoas e 12 em Minas Gerais!
“A democratização da terra (...) é uma transformação de tais proporções que só pode realizar-se no quadro de uma mudança estrutural no sistema de propriedade do país (...). Uma mudança radical (...) que só será concluída nos marcos de uma revolução social”. Esse parágrafo foi extraído do artigo “Reforma Agrária e Estratégia Socialista”, publicado na edição do 1º semestre de 1997 da revista “Brasil Revolucionário”. Essa revista é editada pelo “Instituto de Estudos Políticos Mario Alves”, uma entidade criada e mantida pelo Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), que atua dentro do Partido dos Trabalhadores sob o nome fantasia de “Tendência Brasil Socialista”. O autor do artigo, Bruno Costa de Albuquerque Maranhão, que integra a Direção Nacional do PT, é membro dirigente do PCBR desde o final dos anos 60 do século passado, e fundador, em agosto de 1997, do “Movimento de Libertação dos Sem Terra (MLST)”, uma dissidência do MST.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário existiam, em 2003, 71 movimentos de sem-terra (O Globo, 03 de agosto de 2003) e somente nesse ano de 2003 ocorreram 171 invasões de terras, enquanto em todo o ano de 2002 foram realizadas 103 (O Globo, 15 de agosto de 2003).
Marta Harnecker, historiadora marxista chilena, radicada em Cuba, principal ideóloga do “Foro São Paulo”, escreveu o seguinte sobre o Consulta Popular, em seu livro “A Esquerda Depois de Seattle”: “Nasceu, em dezembro de 1997, o movimento Consulta Popular, iniciativa que não pretende substituir os partidos de esquerda e sim conscientizar e debater um Projeto para o Brasil, criando espaços de encontros e discussão na base, no seio dos movimentos populares e articulando mobilizações em torno de objetivos muito precisos”.
E prossegue Marta Harnecker: “Segundo o Consulta Popular, a sociedade brasileira deve assumir cinco compromissos: o compromisso com a soberania, rompendo com a dependência externa; o compromisso da solidariedade; o compromisso do desenvolvimento para pôr fim à hegemonia do capital financeiro; o compromisso com a sustentabilidade; e o compromisso com a democracia popular, o qual aponta para a refundação do sistema político brasileiro”.
Alguns membros de Coordenação Nacional do Consulta Popular estão convencidos de que o Partido dos Trabalhadores perdeu sua capacidade política, teórica e moral para ser um partido contra a ordem, embora seja verdade que a grande maioria ainda espera que o PT recupere sua clara vocação inicial e seu impulso militante.
Concluindo, torna-se evidente que o Consulta Popular – braço político do MST -utiliza uma estratégia gramsciana, radicalmente diferente da estratégia leninista cujo objetivo primeiro é a conquista do Estado. Antes da conquista do Estado, a estratégia gramsciana objetiva a conquista do Poder.
Recorde-se que Gramsci nunca deixou de ser um leninista convicto. Simplesmente propôs para o Ocidente, com brilhantismo, é verdade, um novo programa de ação revolucionária, diverso daquele utilizado pelos bolcheviques “numa Rússia primitiva e amorfa”, segundo sua definição.
Para isso, ele catalogou como “sociedade civil” os partidos de massa, os sindicatos, as diferentes associações, a Igreja, as Escolas, etc, considerando-a a mais importante arena da luta de classes, pois é nela que ocorrem os embates pela conquista da hegemonia, uma vez que o Poder não é mais um objeto que se tome, com um assalto ao Palácio de Inverno, como na Rússia, em 1917, mas sim uma guerra complexa e sutil, que precede a dominação política. O acesso ao Poder é, para Gramsci, a culminância desse processo revolucionário prolongado.
A partir do desmantelamento do socialismo real em 1989, e do próprio Estado Soviético em 1991, ficou demonstrado que a estratégia revolucionária marxista-leninista de tomada do Poder por um golpe de força em um momento dado se mostrou inadequada, tornando Gramsci uma referência para as esquerdas de todos os matizes. Basta verificar na mídia e nos debates acadêmicos a utilização de expressões como “intelectual orgânico”, “bloco histórico”, “hegemonia”, “consenso”, “filosofia da práxis”, “coletivo”, “excluído”, “movimento social”, etc, todas facilmente encontradas nos escritos de Gramsci.
E mais: para Gramsci, a classe operária, no Ocidente, só chegaria ao Poder depois que os “intelectuais orgânicos” tivessem logrado dissolver a ideologia burguesa. Para isso, eles têm uma missão: a de difundir uma nova concepção de mundo; e também um encargo: o de funcionários da superestrutura; e um espaço de atuação: a sociedade civil que, como vimos, envolve instituições como a família, a Igreja, a escola, a universidade, o jornalismo, o rádio e a televisão. O Consulta Popular busca reunir esses “intelectuais orgânicos”.
Parece que o que vem ocorrendo no Brasil não é nada muito diferente do que acima foi escrito, uma vez que Luiz Inácio Lula da Silva, quando presidente da República, gerou expectativas que não cumpriu ou não pôde cumprir, quando, com arrogância, declarou: “Com uma canetada só vou resolver o problema da reforma agrária no Brasil”
Criança: ama com fé e orgulho a terra em que nasceste,pois nunca verás um país como este...





extraídadeaverdadesufocada

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