por Ives Gandra da Silva Martins Folha de São Paulo
Algumas amizades, no curso de minha vida, marcaram-na. Falo de amigos que já se foram e cujas lembranças e saudades permanecem.
Não falarei de meu pai, José da Silva Martins, morto aos 102 anos,
exemplo para os quatro filhos, ensinando-nos a nunca desistirmos da
luta, a sermos otimistas e, fundamentalmente, éticos nas relações
familiares, profissionais e sociais. Viveu em três séculos (do fim do 19
ao começo do 21).
Apenas mencionarei quatro amigos com quem convivi e que me deixaram muitas saudades.
O primeiro foi Octavio Frias de Oliveira. Apesar de nunca aceitar o
título, foi, a meu ver, o maior jornalista do país. Lembro-me de um
episódio que mudou a história do Brasil. Refiro-me à invasão da Folha,
quando decidiu, numa tensa reunião, à noite, que reagiria aos atos
arbitrários do recém-empossado presidente Collor, lançando a campanha
que estancou sua crescente violência contra direitos da cidadania.
Sua reação –com o jornal tornando-se paladino do retorno aos princípios
democráticos– animou políticos e cidadãos a reagirem também, com o que o
país voltou à normalidade. Lembro-me quando nos disse: "Ou seremos
presos ou restabeleceremos a democracia na nação".
Roberto Campos foi outro amigo inesquecível. Prefaciou meu primeiro
livro sobre finanças públicas (1971), fundamos a Academia Internacional
de Direito e Economia e tive o privilégio de saudá-lo quando ingressou
na Academia Mato-grossense de Letras. O livro intitulado "O Homem mais
Lúcido do Brasil", em que suas melhores frases foram selecionadas por
Aristóteles Drummond, demonstra o que foi.
Meira Mattos é o terceiro saudoso amigo. Talvez o maior geopolítico do
Brasil. Na 2ª Guerra, ao tomar trincheiras em Monte Castelo comandando
companhia que recuara no dia anterior sob outro comando, foi a principal
testemunha de defesa no processo militar promovido contra o capitão que
recuara as tropas.
Em seu depoimento, foi firme em atestar que se o batalhão não tivesse
sido muito bem treinado por aquele que sucedera nunca teriam as tropas
sob seu comando conseguido tomar as trincheiras dos alemães.
Por fim, cabe-me lembrar de Oscar Corrêa, que, exatamente, há dez anos morria.
Deputado estadual, federal, professor titular de direito da UFMG,
ministro da Justiça e do Supremo Tribunal Federal, acadêmico da Academia
Brasileira de Letras, economista, jurista, político, filósofo e poeta,
deixou profunda marca.
Lembro-me de uma viagem juntos, em virtude de um caso profissional,
quando ele já estava aposentado. Paramos no Rio, para que seu filho,
então deputado federal, viajasse conosco. Oscar Filho, quando entrou no
avião, beijou sua mão dizendo "Bênção, pai". Impressionou-me tal
respeito, hoje pouco comum.
São quatro amigos que influenciaram decididamente minha vida. Quis
homenageá-los por ocasião desses dez anos de ausência de Oscar Corrêa.
Quando presidi a Academia Paulista de Letras, tínhamos o hábito de
lembrar a efeméride dos acadêmicos mortos da semana, sempre com a frase
"Não podemos esquecer dos nossos imortais".
É o que faço neste breve artigo de saudades, memória e reverência a esses brasileiros, cujo espírito cívico falta hoje.
extraídaderota2014blogspot
0 comments:
Postar um comentário