Roberto Pompeu de Toledo: Publicado na versão impressa de VEJA
Ao contrário, as manifestações da semana passada, tanto a favor como contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff, se deram à sombra do desalento. A realizada em favor do impeachment foi a mais fraca das encenadas contra o governo neste ano. A realizada contra o impeachment até que desta vez conseguiu equiparar-se à outra, em tamanho, mas não foi além das turbas organizadas, carreadas em ônibus pela CUT, MST, MTST e afins. Em São Paulo as manifestações pró-impeachment nem chegaram a perturbar o sossego dos pedestres e ciclistas que, aos domingos, costumam ocupar a Avenida Paulista. Nas manifestações contra o impeachment, Brasil afora, faltou a famosa militância do PT, aquele espontâneo mar humano presente, como ator principal ou importante coadjuvante, na campanha das Diretas, no impeachment de Collor, em protestos variados e nas campanhas eleitorais.
Para o fracasso das manifestações pró-impeachment, avançaram-se várias explicações. Seria porque estamos perto do Natal, porque se teve pouco tempo para prepará-las, porque a ideia era mesmo só promover um “esquenta” para os próximos meses. Esqueceu-se o principal: muita gente, com as movimentações desinibidas do vice-presidente Michel Temer nas últimas semanas, enfim se deu conta de qual é a alternativa à queda de Dilma. Sair às ruas, ficou claro, é levar água para o moinho do vice-presidente e sua coorte de tipos suspeitos que dão as cartas no PMDB. No caso das manifestações contra o impeachment, a ausência de contingentes espontâneos indica que ou a famosa militância não existe mais ou não acha que vale a pena trabalhar pela sobrevivência de Dilma. Temos então que nem um lado se encoraja a desfechar o golpe final na presidente, nem o outro se encoraja a defendê-la. Não há o que ganhar, nem de um lado nem do outro. O jogo é perder ou perder.
O Brasil caminha, num cenário de ópera-bufa, para um desfecho de tragédia. Capítulos mais agudos da ópera-bufa são os tapas e cabeçadas entre deputados nos procedimentos do impeachment, a carta choramingas em que Temer reclamou o carinho de Dilma e as manobras com que o alucinado Eduardo Cunha vai espantando a ameaça de ser recolhido aos recintos da Papuda. Acrescente-se, para pôr mais um figurante na roda, o nariz de palhaço que o PSDB aplicou a si próprio ao encetar um namoro de meses com a figura deletéria do presidente da Câmara, apoiar pautas-bomba que negavam princípios do governo FHC e no final ficar com a alma vendida e as mãos vazias.
A tragédia que se anuncia ao fim do caminho é que tanto a continuidade do governo Dilma como um eventual governo Temer são perspectivas tenebrosas. Um aperitivo do que será um governo Dilma rejuvenescido pela vitória contra o impeachment foi oferecido na semana passada com a decisão de afrouxar a política econômica. Não bastassem a recessão, a inflação de dois dígitos e o rebaixamento da nota pelas agências de risco, o governo ensaia retomar a conhecida trilha do desastre. Um governo Temer, de seu lado, ameaça a Operação Lava Jato. Não se duvide da fúria com que a turma do PMDB, em cujo seio se abrigam alguns dos mais notórios investigados, tentará um acerto de contas com a turma do juiz Moro e do procurador Janot. Até já se especula sobre nomes que, no Ministério da Justiça, possam dar um jeito de dobrar o ímpeto da Polícia Federal.
Gastou-se muito latim, na semana passada, depois que a Polícia Federal apelidou de Catilinárias a operação contra Eduardo Cunha e outros astros da máfia peemedebista. O humor dos brasileiros indica que em breve estaremos trocando o latim pelo espanhol, para entoar o famoso grito dos argentinos, na crise de 2001:
¡Que se vayan todos!
extraídadecolunadeaugustonunesopiniaoveja
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