Jorge Béja
NO MÍNIMO, ATÉ O SÉCULO XXII
Ação Civil Pública não tem prazo para acabar. Criada em 1985 (Lei nº 7.347) qualquer Ação Civil Pública, mormente tendo como causa uma tragédia do tamanho da de Mariana, atravessa gerações e mais gerações, até que seja concluída. E quando a ação terminar, e se dinheiro conseguir mesmo arrecadar, a quantia reverterá para um fundo gerido por um conselho com a participação do Ministério Público e da comunidade, “sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados” (Artigo 13 da referida lei).
Para o leitor entender: lá pelos anos 2070/2080, o dinheiro arrecadado por essa desavergonhada Ação Civil Pública que Dilma determinou fosse feita servirá para reparar os danos que a tragédia causou. Todos os danos. Mas aí começarão outras demandas. Cada sobrevivente, ou seus herdeiros e sucessores, vai precisar submeter à apreciação judicial a relação e estimativa dos prejuízos que seus antepassados suportaram. Serão outros processos, chamados de Liquidação de Sentença por Artigos, com contraditório, sentenças e muitos recursos. Serão mais 10 a 20 anos de demora. Aí estaremos no Século XXII.
Leio no O Globo de hoje, sábado (página 14): “Segundo o advogado-geral da União, Luis Inácio Admas, a proposta é que o fundo seja controlado pelas próprias empresas (no caso, Samarco, Vale e BHP), que repassariam os valores conforme seus faturamentos”. Se entendi, gestores do tal fundo serão os próprios réus da ação, os réus condenados, e o dinheiro das indenizações seriam por eles entregue às vítimas na medida do faturamento das empresas. Se for isso mesmo, deixo de fazer qualquer consideração, uma vez que a proposta é indecente, desonrada e fraudatória. Se não compactuo com malandragem, menos ainda com propostas escroques e escrotas.
FALTOU CASSAR A CONCESSÃO
Sim, desavergonhada. Não que a Ação Civil Pública mereça tal adjetivação. A falta de vergonha e de pudor está no fato de o governo federal optar apenas pela propositura da ação, sem, paralela e concomitantemente, cassar a concessão que a própria União concedeu à Samarco e, no mesmo ato (decreto ou Medida Provisória), abrir nova licitação para que o serviço de exploração de minério não sofra solução de continuidade e os trabalhadores não fiquem desempregados. E nem o município de Mariana perca os quase 90% de sua receita, que procede dos impostos pagos pela mineradora.
A encampação ou reversão da Samarco (concessionária) pelo governo federal (concedente) foi exigida e reclamada aqui na Tribuna da Internet no artigo “O que Dilma espera para cassar a concessão da Samarco e abrir nova licitação?”, publicado dia 22 passado e que pode ser relido no “link”. No artigo estão as justificativas de fato e de direito para a imediata cassação da concessão. Muitos outros blogs republicaram o artigo. Para citar apenas dois: pensandovocê.blogspot de José Carlos Cataldi e debatesculturais, de Alessandro Lyra Braga.
Mas que a verdade seja dita: tudo acontece e caminha na mais absoluta normalidade. Não se pode exigir ou esperar de um governo desmoralizado, ridicularizado, sem credibilidade interna e externa, marcado pela corrupção, sem gente de razoável saber e mínima compostura… Não se pode exigir de um governo bundão atitudes, medidas e gestos de energia, sobriedade e altivez que o governo desconhece e não tem independência e força para tomar. (“Bundão – sm 1. Bunda Grande. 2. Fig. Pessoa covarde, ou desanimada”). Aurélio, Dicionário.
extraídadetribunadainternet
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