editorial de O Globo
A votação final do pedido de cassação do deputado Eduardo Cunha
(PMDB-RJ) não prometia qualquer surpresa. Se houve alguma, foi a
magnitude da avalanche de votos pela volta dele à planície dos cidadãos
comuns, sem foro privilegiado. Um sério problema para o ex-deputado,
porque passou a ficar ao alcance do juiz federal Sérgio Moro, de
primeira instância, um dos polos da força-tarefa da Lava-Jato, em que o
político é investigado e já virou réu.
Os 450 votos contra ele — quando eram necessário 257 — denunciam o
clássico movimento de abandono de quem cai em desgraça, em busca de um
outro núcleo de poder. Hoje, o Planalto de Michel Temer.
Mas as causas básicas da debacle de quem chegou à Câmara com um estilo
de atuação nas sombras, para galgar a presidência da Casa e sonhar com
voos mais altos, foram os atos de corrupção investigados na Lava-Jato e o
uso sem limites dos instrumentos de poder da presidência da Casa em
benefício próprio, para tentar barrar o processo por quebra de decoro
que o levaria à cassação. Por isso, a pedido do MP, o Supremo o afastou
do cargo e suspendeu o mandato.
Eduardo Cunha mentiu de fato à CPI da Petrobras ao garantir não ter
contas bancárias no exterior. Ao chegarem as provas do Ministério
Público da Suíça, o deputado forjou a história da carochinha dos
“trusts”, titulares imateriais de contas cujo dinheiro ele e família
usufruíam em viagens ao exterior.
É indiscutível que a cassação não remove as fundações do fisiologismo e
clientelismo que existem na vida pública brasileira, cujas causas se
tornaram estruturais. A cassação, no entanto, ajuda, e muito, na luta
contra essas mazelas. Sem considerar a coincidência emblemática e feliz
de a perda de mandato haver ocorrido horas depois da posse da ministra
Cármen Lúcia na presidência do Supremo Tribunal Federal, numa solenidade
que escapou dos cerimoniais enfadonhos para ser vigorosa demonstração
de compromisso de combate à corrupção na mais alta Corte da Justiça e na
cúpula do MP.
Houve, nos debates que antecederam a auspiciosa votação contrária a
Cunha, quem dissesse que em torno do agora ex-deputado havia um embate
entre “direita” e “esquerda”, “conservadores” e “progressistas”, com
estes saindo vencedores. Balela. Ocorreu, na verdade, algo muito além
desse reducionismo: a Câmara se curvou a legítimas pressões da sociedade
contra a roubalheira, à esquerda e à direita. Muitos que acusaram o
“conservador” Cunha foram aliados dele quando o PT cevava ampla base
parlamentar com os mimos do fisiologismo.
Importa, agora, o Congresso tratar das reformas para consertar a
economia, e aprovar a proposta de emenda à Constituição dos senadores
tucanos Ricardo Ferraço (ES) e Aécio Neves (MG), aprovada ontem na CCJ
do Senado, para cauterizar dois dos principais focos da degradação da
política brasileira: a multiplicidade de partidos sem representação, a
ser reduzida via cláusula de desempenho — um mínimo de votos nacionais e
regionais para a legenda ter acesso à representação parlamentar plena
—, e o fim das coligações em eleições proporcionais, pelas quais o
eleitor elege quem não conhece. Eduardo Cunha e outros não surgiram por
acaso.
extraídaderota2014blogs´pot





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