Fernando Gabeira: Publicado no Globo
Como presidente, Cunha barra a investigação. Além disso tem muitos adeptos na Câmara e um sólido núcleo de bandidos que acreditam ter sequestrado a instituição. Por muito menos, gente sem mandato foi presa e está em Curitiba. Bumlai, por exemplo, finalmente dançou. Ele conseguiu quase meio bilhão de empréstimos no BNDES. É amigo de Lula. Um dos empréstimos de R$ 12 milhões ele teria saldado com sêmen de boi. Porran, Bumlai. Não costumo escrever essa palavra. Mas depois de ouvi-la de uma travesti num vídeo de sucesso na rede, decidi adotá-la. Ao incluir o ene, creio, ela deu uma força exclamativa à palavra.
Sérgio Moro e alguns procuradores afirmam que não há
nada contra Lula. Bumlai pode ter usado seu nome. Por que então a
operação se chama Passe Livre e não Amigo Oculto? Ele conseguiria R$ 12
milhões para o PT sem que Lula soubesse? Felizmente, a hesitação que
existe em torno de Eduardo Cunha caiu no caso Delcídio Amaral. Pasadena
está atravessada na garganta de todos os brasileiros conscientes. Deu um
prejuízo de US$ 700 milhões ao país.
Com a prisão de Delcídio, o braço político de
Pasadena sofre o primeiro golpe. E mostrou o que se afirma em alguns
artigos: a quadrilha não quer controlar apenas o governo, mas o
Congresso e o Supremo. Mas as prisões do meio de semana levaram também o
banqueiro André Esteves. Um importante banqueiro, que, ao lado de
Marcelo Odebrecht, coloca uma importante questão sobre o capitalismo
brasileiro. Esteves e Odebrecht são dois homens de sucesso, símbolos dos
empresários que tocam o Brasil. Mas os fatos estão mostrando que a
associação criminosa com o governo é um método comum a ambos.
Naturalmente, não expressam a posição de todos os empresários. Assim
como a maioria dos bandidos não sintetiza as aspirações políticas do
país.
Bumlai, Esteves, Delcídio na cadeia ajudam a
compreender a decadência da vida pública no Brasil, incluindo os
empresários que se associam ao crime, sem hesitação, para impulsionar
suas carreiras.
Chegamos a um momento decisivo. O caso Pasadena é
muito emblemático. Não só porque é uma operação debochada que tratou os
brasileiros como idiotas e quase conseguiu escapar sem nenhum
julgamento. Pasadena é importante também porque é um daqueles momentos
em que o elenco está reunido. Não preciso fazer ilações. Creio que a
própria delação premiada de Nestor Cerveró vai demonstrar isto. Dilma
está calada porque Pasadena explode no seu pé. Lula está calado porque a
prisão de Bumlai explodiu no seu. A de Esteves cai, como a de
Odebrecht, nos pés de um governo que sempre preferiu empresários
ambiciosos e capazes de tudo para crescer.
É razoável aqui em Regência perguntar quando todos
eles chegarão ao mar. Não desejo essa carga tóxica para o oceano. Pelo
contrário, queria que não existisse. Encalhada no cotidiano, atraindo
mais ratos, empesteando a vida do país, é muito mais perigosa para a
saúde da democracia.
Cunha vai pedir todos os carimbos, atestados e
reconhecimento de firmas necessários para sua cassação. Lula certamente
dirá que Bumlai agia sem que ele soubesse, apesar do passe livre. Os
atores continuarão representando seu papel. Mas o ritmo da peça mudou.
Talvez Pasadena, pela sua extraordinária nitidez, pela possibilidade de
internacionalização, pelo desespero dos seus agentes, possa ser o fator
que nos arranque do marasmo, e finalmente, produza alguma coisa de novo
em 2016. Sem grandes ilusões. O plano de liberar Cerveró caiu porque
apareceu uma gravação. Ele tinha componentes importantes para o êxito da
fuga, sobretudo a grana de um banqueiro e o poder de um líder do
governo.
A Operação Lava-Jato é um grande momento do processo
democrático no Brasil. As tentativas de neutralizá-la não mobilizam
apenas bandidos de quinta categoria. Será necessária uma conspiração
digna da importância. A tentativa de livrar os compradores de Pasadena
está cheia de ferrugem, como as instalações da refinaria. Outras
audaciosas virão e, dificilmente, polícia e justiça aguentarão sozinhas.
É um tipo de batalha que vai depender da atenção de cada um. Pasadena
não passará, mas não se trata apenas disso. É a viabilidade de um país
decente que está em jogo.
Lula continuará dizendo que nada sabe. Cunha
continuará exigindo todos os papéis, carimbos e reconhecimento de firma
para que seja processado. Chega um dia em que os federais batem à porta.
O problema é demorar muito, e os quadrilheiros assaltam o país e acabam
nos tentando a ir buscar a justiça pelas próprias mãos. Felizmente
resistimos a essa tentação. Tomara que tenha valido a pena.
EXTRAÍDADECOLUNADEAUGUSTONUNESOPINIAOVEJA
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