editorial de O Globo
A proposta de um reajuste salarial de 16,7% aprovada pelo Conselho
Superior do Ministério Público Federal é uma aula prática de como agem
corporações incrustadas no Estado, independentemente da qualidade dos
serviços que prestam à população. O MPF, reconheça-se, é uma instituição
meritória, como demonstra sua participação no combate à corrupção
sistêmica que intoxica a vida pública do país.
Mas, na defesa de seus interesses, como é típico de corporações, não
importa ao MPF a situação do todo, mas apenas questões particulares da
guilda. Ficam em segundo plano a crise fiscal séria, a cava recessão de
aproximadamente 8% nos últimos dois anos, e o desemprego de 14 milhões
de pessoas.
A crise tem tido forte papel educativo, ao revelar na prática como agem
grupos organizados em defesa de pautas próprias dentro do Congresso, nos
aparelhos de Estado e nas ruas. Quando contrariados, eles se manifestam
em nome do “povo”.
Um dos melhores exemplos deste comportamento têm sido mobilizações
contra a reforma da Previdência, visivelmente conduzidas por categorias
profissionais — incluindo de servidores públicos — beneficiárias da
atual legislação, pela qual pessoas de níveis educacionais e de renda
mais elevados têm conseguido se aposentar muito cedo, aos 58 anos de
idade, em média. O “povo”, em nome do qual protestam, é forçado a obter o
benefício mais tarde — geralmente pelo pouco tempo em empregos formais
—, e costuma se aposentar por volta dos 65 anos, limite de idade que
consta da proposta da reforma.
A crise do Rio de Janeiro expôs a ação de magistrados e procuradores
também descolada de uma realidade dramática, no caso, das finanças
estaduais. Foram vários os arrestos de dinheiro dos cofres fluminenses
para bancar os elevados salários dessas categorias, enquanto servidores
ativos e aposentados, sem receber, passaram a depender de cestas básicas
da caridade alheia. Pouco importou, por exemplo, a falência das
emergências hospitalares com seus efeitos sobre a população.
A proposta destes lunáticos 16,7% de aumento para procuradores federais
coincide com a imensa dificuldade que a União está tendo para conseguir
atingir a meta fiscal de 2017, ainda de um elevado déficit de R$ 139
bilhões. Não se discute se procuradores merecem salários básicos entre
R$ 28,5 mil e R$ 33,7 mil, fora penduricalhos, mas se o Tesouro está em
condições de bancá-los, e ainda por cima com um aumento astronômico.
O próprio fato de segmentos do serviço público, conforme pesquisas, se
beneficiarem de salários acima dos praticados nos mercados privados
correspondentes, mostra como essas corporações sempre defendem
interesses pecuniários em Brasília como se o país tivesse renda de
Primeiro Mundo. Nem em economias ricas há remunerações como algumas
praticadas na aristocracia do funcionalismo brasileiro.
extraídaderota2014blogspot
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