Contas Abertas com Estadão Conteúdo
Enquanto o governo discute a diminuição de cargos públicos, por meio do
Programa de Demissão Voluntária, um estudo revela que entre as dez
categorias profissionais mais bem remuneradas do país, seis fazem parte
da chamada elite do funcionalismo público – como promotores,
procuradores e juízes – e uma tem concessão pública, o dono de cartório.
Ou seja: sete das atividades profissionais mais rentáveis do Brasil
estão associadas à estrutura estatal.
O ranking foi elaborado pelo pesquisador José Roberto Afonso, do
Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) e
professor do mestrado do Instituto Brasiliense de Direito Público
(IDP). A sua base de dados é oficial: o relatório “Grandes Números”, da
própria Receita Federal a partir de declarações de imposto de renda
pessoa física de 2015, com valores de 2014.
A categoria recordista em ganhos é o titular de cartório, atividade
híbrida entre o público e o privado. Na média, o rendimento anual
apresentado na declaração do imposto de renda do dono de cartório fica
em R$ 1,1 milhão. Um detalhe que impressiona é o nível de concentração
de riqueza nessa camada. Os ganhos dos 9.409 donos de cartórios somam
quase R$ 11 bilhões. A cifra é equivalente ao resultado de grandes
conglomerados empresariais, como a cervejaria Ambev, que tem lucro anual
R$ 12 bilhões.
Na sequência, em segundo, terceiro e quarto lugares, bem como sexto,
sétimo e oitavo, entre os recordistas de ganhos estão carreiras típicas
do Estado.
Promotores e procuradores do Ministério Público ganham anualmente, em
média, quase R$ 530 mil. Juízes e integrantes dos tribunais de contas,
mais de R$ 512 mil. Diplomatas, R$ 332 mil, na média, por ano.
Aqui cabe uma ressalva. Como lembra o economista Bernard Appy, diretor
do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), as declarações de imposto de renda
reúnem informações sobre a camada mais privilegiada da população que
não se encontram em outras fontes. “A declaração dá uma radiografia das
pessoas de renda mais elevada e vários trabalhos recentes só foram
possíveis após a divulgação e o cruzamento de dados da Receita Federal”,
diz Appy.
O relatório atual traz informações de 27 milhões de pessoas,
distribuídas em 133 categorias profissionais. O rendimento do conjunto,
no agregado, soma R$ 1,4 trilhão por ano. Ao fazer uma divisão simples
do bolo, o pesquisador Afonso chegou à conclusão de que a fatia da
população brasileira que declara imposto de renda ganha, na média, por
ano, R$ 87 mil. Detalhe: 58 categorias recebem acima desse valor e 77,
abaixo disso.
Nessa ótica, promotores, procuradores, juízes e integrantes de tribunais
de contas recebem cerca de seis vezes mais que a média dos declarantes
de imposto de renda no País.
Afonso atribui a disparidade, entre outras razões, à dinâmica do
orçamento e dos gastos entre os poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário: “A crise fiscal atual revela que o debate das dificuldades
está concentrado no poder Executivo, enquanto os demais poderes seguem
gerindo as suas folhas salariais e os seus orçamentos como se nenhuma
crise estivesse ocorrendo no País”, afirma. “Reajustes fortes têm sido
dados para essa elite do setor público, enquanto a imensa maioria dos
servidores públicos não é tão beneficiada.”
Empresários e altos executivos têm rendimento isento
Três categorias do setor privado estão entre as dez com maior
rendimento, segundo dados de declarações do imposto de renda: médico,
com R$ 305 mil por ano, em média (5º lugar), piloto de avião, com R$ 253
mil (9º) e atleta, com R$ 219 mil (10º). Segundo o pesquisador José
Roberto Afonso, autor do levantamento, há uma razão para explicar a
ausência de uma categoria que, todos intuem, está entre as campeãs de
ganhos, donos e altos executivos de empresas.
Parte dos ganhos dessa categoria enquadra-se como rendimento não
tributável, como lucros e dividendos. Cerca de 707 mil dirigentes e
executivos ganham R$ 214 bilhões que são isentos. Outra parcela recebe
como pessoa jurídica.
Por causa disso, na lista de ganhos sujeitos a tributação na pessoa
física, o dirigente de empresa aparece em 30º lugar, com ganho médio
anual de R$ 138 mil. Afonso reforça que essa categoria é ampla e
diversa. Inclui o presidente de uma multinacional, o dono de uma loja de
ferragens e o profissional “contratado” como empresa, porque cresce a
chamada “pejotização”. Segundo Afonso, altos executivos devem, sim,
estar entre os dez mais bem pagos do País, mas mesmo que fosse possível
definir em que posição, não alteraria a predominância das funções
públicas na lista das mais rentáveis.
extraídaderota2014blogspot
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