editorial de O Globo
Pode não ter o clima de feira livre da tentativa de alterar a legislação
político-eleitoral, a toque de caixa, feita pelo então presidente da
Câmara, Eduardo Cunha, em 2015. Mas está próximo. Mesmo porque o
Congresso corre contra o tempo para aprovar propostas de emendas
constitucionais e projetos de lei até o início de outubro, data limite a
fim de que valham nas eleições do ano que vem.
O açodamento tem gerado, na Câmara, um monstrengo — embora com alguns
recuos. Um deles, na excrescência da “doação oculta”, um caixa 1 das
sombras, retirada do projeto pelo relator Vicente Cândido (PT-SP),
dizendo que havia apoiadores da esquisitice, mas que não colocaram as
caras para defender a proposta. E assim Cândido leva a culpa, junto com
seu partido, já notabilizado por outra manobra notável: lavar propina na
Justiça Eleitoral, transformando-a em doação legal. Pelo jeito, tentou
criar outra.
Um recuo de peso, mas não o bastante, ocorre no tal Fundo de
Financiamento da Democracia, já apelidado de fundão, abastecido por
absurdo 0,5% da receita líquida corrente da União, hoje, R$ 3,6 bilhões.
Muito dinheiro, e numa grave crise fiscal. E não é apenas o
inconveniente de desviar elevada cifra do Tesouro para financiar
partidos e políticos. Há também sérios questionamentos jurídicos sobre a
constitucionalidade do destino privado de dinheiro público.
Um desdobramento lógico das corretas críticas ao fundo é a instalação de
vez do debate sobre a volta do financiamento de empresas a campanhas,
proibido pelo Supremo, numa decisão pouco pensada. Era visível que o
financiamento público integral de campanha, antigo sonho petista para
ajudar a viabilizar o voto em lista fechada, outro absurdo, não teria
trânsito fácil.
Agora, até mesmo ministros que votaram pela proibição admitem a volta do
financiamento privado, mas sob uma regulação restritiva, como deve ser.
Caso de Luiz Fux e de Luís Roberto Barroso. Este explica que
“inconstitucional” era a forma como o financiamento se dava, não ele em
si. Abre-se, portanto, uma porta para a Câmara derrubar o fundão e, com o
Senado, regular a volta das empresas para financiar a política, como em
muitos países. No mínimo, combaterá o caixa 2. Já existem propostas
objetivas para esta regulamentação: não apoiar políticos de mais de um
partido, não se beneficiar de contratos do governo que ajudou a eleger
etc.
Os políticos deveriam, ainda, repensar a conveniência do distritão, já
convertido em um Frankenstein com a ideia meia-sola de voto em legenda
também ser contabilizado. Cai por terra todo o argumento de que distrito
aproxima eleitor do político. Farão melhor se mantiverem o voto
proporcional em lista aberta, junto com uma efetiva cláusula de
desempenho para os partidos (os 2% da PEC aprovada no Senado). E sem as
federações de partidos, que ressuscitam as famigeradas coligações em
pleitos proporcionais, também a serem extintas, rebatizadas com outro
nome.
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