por Eduardo Levy.
Ao longo da história das ideias da nossa cultura, até as correntes mais autoritárias procuraram conquistar adeptos por meio da persuasão racional. Mesmo nas conversões forçadas e nas guerras de religião, a espada vinha acompanhada do silogismo. O que a esquerda descobriu, e ao que deve sua hegemonia cultural de décadas, é que a persuasão racional não é apenas desnecessária, é prejudicial. Pois quando argumentamos, o adversário tem o mau hábito de contra-argumentar, existindo sempre o risco de que seus argumentos sejam melhores. Muito mais eficiente é passar a agir como se já tivéssemos vencido o debate, tendo provado não somente o acerto de nossas ideias quanto a maldade das ideias opostas, e passar a perseguir os dissonantes. Para obter hegemonia não é necessário que todos concordem; basta que ninguém tenha coragem de discordar. Que me importa que, no fundo de sua consciência, José ache a ideologia de gênero uma monstruosidade? Importa apenas que ele jamais dirá isso em público, pois fazê-lo o transformaria em desempregado perpétuo. Que pessoas como José se calem é suficiente para criar a impressão de consenso; está é suficiente tanto para impor normas legais e práticas culturais quanto para justificar a perseguição aos discordantes, a qual, por sua vez, reforça a impressão de consenso. É o ciclo perfeito, nada mais é necessário.
Parece exagero? Pois considere: Quantos argumentos você já leu a favor dos pressupostos, das conclusões e das exigências práticas da ideologia de gênero? Que debates a respeito dela aconteceram antes que se tornasse uma obrigação tácita de todos aceitá-la sob pena de ostracismo? Que disputa de ideias ocorreu antes que se começasse a ensinar às crianças que o sexo com que nasceram não tem a menor importância e a submetê-las a cirurgias mutiladoras irreversíveis? Quando foi que essa discussão foi vencida pelos ideólogos de gênero? Faça a si mesmo perguntas semelhantes trocando “ideologia de gênero” por outras ideias da esquerda que se tornaram dogmas incontestáveis e verá que a resposta é sempre jamais. Jamais debate nenhum foi vencido porque jamais debate nenhum aconteceu. A esquerda não argumenta. Faça com que opor-se a suas ideias resulte em ostracismo, ridículo e boicote e nunca mais precisará defendê-las.
É assim porque ter razão é muito diferente de ter poder. A criança não obedece aos pais porque acha que tenham razão, a vítima não obedece ao bandido porque foi persuadida de seu clamor (a não ser que seja a Maria do Rosário), nem este obedece ao policial por estar convencido da beleza da ordem legal. Ter razão—ou, mais propriamente, parecer ter razão—é apenas um dos meios de conquistar e exercer poder, e o mais frágil deles. Pois mesmo o melhor dos argumentos pode ser contestado, ao passo que um emprego perdido, uma cela de prisão e uma bala na testa são irrefutáveis. Não foi por outro motivo que a esquerda se tornou imbatível no momento em que desistiu de ter razão.
E como reagem seus adversários? Respondem a cada intimidação com um silogismo, a cada boicote com um dado, a cada reputação assassinada com um gráfico. Nas publicações de esquerda encontram-se diretrizes comportamentais e repreensão aos dissidentes, nas de direita argumentos e estatísticas. Os liberais (no sentido brasileiro da palavra), especialmente, fazem um esforço comovente para nunca pôr em forma escrita conclusão desacompanhada de uma estatística irrefutável que a embase. Será que jamais lhes ocorreu questionar-se por que ter razão com tanta frequência nunca lhes trouxe vitória política nenhuma? A superioridade absoluta do liberalismo econômico, tanto nos seus fundamentos teóricos quanto nos seus resultados práticos, é um dos fatos mais comprovados da história das ideias, fato que só pode negar quem não quer vê-lo. O adversário contra o qual se bate, por outro lado, o marxismo, já nasceu refutado em seus fundamentos teóricos e refutou-se a si mesmo em seus resultados práticos, que foram invariavelmente miséria, tirania e massacre. Por que, apesar disso, há tantos marxistas e tão pouco liberais? Será que em vez de suar tanto para mostrar a realidade a quem não quer vê-la os liberais não fariam melhor se tentassem descobrir por que não lhes serviu para nada estar certos?
Do princípio ao fim, a história do século XX é uma longa refutação das ideias da esquerda. Do momento ao princípio, a história do XXI é uma demonstração da hegemonia absoluta da esquerda. Enquanto seus adversários continuarem a combater ações com argumentos, ela continuará a vencer todas as batalhas práticas; que o faça apesar de perder todas as teóricas é apenas mais uma demonstração de seu poder. Quem quiser vencê-la deve deixar de analisar gráficos e passar a analisar estratégias de ação, deixar de denunciar os erros e passar a denunciar os errados, abandonar a luta contra as teorias e adotar a luta contra as práticas, desistir de combater ideias e passar a combater pessoas.
#paz
extraídadepuggina.org
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