editorial de O Globo
Após os estragos feitos no comércio exterior pelas falhas na Operação
Carne Fraca, a Polícia Federal e o Ministério da Agricultura informaram
que, embora as investigações visem “a apurar irregularidades pontuais no
Sistema de Inspeção Federal (SIF)”, os fatos se relacionam diretamente
aos desvios de conduta de servidores “e não representam um mau
funcionamento generalizado do sistema sanitário brasileiro". O
comunicado conjunto pode apaziguar ânimos, mas não põe fim a questões
cruciais. Como a explicação sobre como funcionava o esquema de corrupção
envolvendo frigoríficos e funcionários do ministério, alguns ocupando
cargos importantes. E se isso afetava a qualidade dos produtos
comercializados.
Desde o início, erros crassos, falta de informações, ações baseadas em
depoimento de um único fiscal, falta de laudos, entre outros, acabaram
municiando quem desgosta das forças-tarefas de combate à corrupção, a
Lava-Jato, a principal delas. Não por acaso, os que se sentem atingidos
ou ameaçados por essas ações já começam a se movimentar em Brasília.
Usando como argumento os excessos cometidos pela PF na Carne Fraca,
senadores de vários partidos ganharam fôlego e retomaram o projeto que
muda a legislação para endurecer a punição de crimes de abuso de
autoridade. O bombardeio à operação tem vindo de todos os lados. E não
apenas do agronegócio. O presidente da Associação Nacional dos Delegados
de Polícia Federal, Carlos Eduardo Sobral, disse que foi um erro de
comunicação a forma como a operação foi divulgada. A Associação Nacional
dos Peritos Criminais Federais afirmou que provas apresentadas eram
quase exclusivamente contingenciais, o que fez com que servidores
tirassem conclusões precipitadas e erradas.
O juiz Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara Federal de Curitiba, que
autorizou a realização de escutas telefônicas para a Operação Carne
Fraca, encarregou-se de corrigir o rumo da questão. Para ele, não se
trata de condenar a cadeia produtiva e o sistema de fiscalização, mas de
“apurar indícios de condutas delituosas de servidores públicos em
posições-chave".
De fato, as falhas na condução da Operação Carne Fraca não podem servir
para ocultar o aspecto de corrupção revelado pelas investigações. O
Ministério da Agricultura exonerou os superintendentes do Paraná, Gil
Bueno de Magalhães, e de Goiás, Júlio César Carneiro, acusados de
integrar o esquema criminoso. Mas a questão não se encerra aí. É preciso
esclarecer como esses funcionários chegaram aos cargos e como agiam em
favor dos frigoríficos. A ex-ministra Kátia Abreu, senadora, disse ter
cedido a pressões políticas, inclusive de seu partido, o PMDB, para,
como ministra da Agricultura, nomear Daniel Gonçalves Filho —
ex-superintendente do Paraná preso na operação e apontado como chefe da
organização criminosa — a quem se referiu como “bandido” e “marginal”. É
importante salvar a Operação Carne Fraca, colocando o seu foco no
devido lugar.
extraídaderota2014blogspot
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