editorial do Estadão
É compreensível que Lula da Silva queira antecipar o processo eleitoral
de 2018, manifestando desde já sua disposição de concorrer uma vez mais à
Presidência da República. Com tal gesto, o ex-presidente evidencia o
duplo desespero que o move: o medo de ser condenado e preso e o temor de
ver extinto o seu partido político, afogado no mar de lama que ele
mesmo criou.
É estranho, no entanto, que essa antecipação do processo eleitoral
também esteja sendo promovida por políticos que fazem parte da base
aliada do governo federal. Recentemente, o governador Geraldo Alckmin
afirmou sua pretensão de ser candidato à Presidência da República,
ressaltando o óbvio: que a efetivação desse desejo depende da vontade do
partido. Já tem ao menos um aliado para seu objetivo, pois, no mesmo
dia, o prefeito João Doria disse que o governador de São Paulo é seu
candidato ao Palácio do Planalto em 2018.
Essa movimentação tão antecipada – faltam ainda 19 meses para as
eleições – tem um efeito certo: a desvalorização do exercício da
Presidência até o final de 2018. Será esse o objetivo de tanto
açodamento? Ainda há muito a se fazer para que o País comece a discutir
os nomes de quem poderá estar no governo em 2019. Há uma grave crise
social e econômica a ser enfrentada. Há importantes reformas a serem
votadas. Agora, o que importa ao País não é 2018 – é o presente.
Há, no entanto, políticos que parecem ter dificuldade em compreender as
circunstâncias do País e suas atuais batalhas, mais se preocupando –
assim denotam algumas de suas palavras – em garantir uma vaga nas
inscrições para a corrida presidencial. É natural que, numa democracia,
os políticos se preocupem com as eleições seguintes. Mais do que uma
questão de simples sobrevivência pessoal, trata-se de uma legítima e
necessária preocupação com a continuidade das ideias e ideais políticos
de seus eleitores.
O problema ocorre quando a preocupação com as eleições solapa as
batalhas presentes. O dever fundamental da base aliada do governo é
apoiar o presidente Michel Temer em seu compromisso de levar adiante as
reformas de que tanto o País necessita. Quando, nas vésperas da votação
da reforma da Previdência, alguns políticos ensaiam uma antecipação do
processo eleitoral estão de fato, qualquer que seja sua intenção,
diminuindo o presidente da República.
Mais do que representar um caso de enfrentamento pessoal – o que já
seria grave –, a antecipação do processo eleitoral prejudica o atual
andamento das reformas no Legislativo. Tal movimento faz parecer que o
País vive tão somente um mandato presidencial tampão, simplesmente a
preencher uma lacuna temporária até 2019. Entende-se que o PT, em seu
desespero, pretenda dar ao mandato de Michel Temer esse enquadramento. O
que não se entende é que a base aliada atue com semelhantes modos.
Tal postura não significa “apenas” uma desunião na base aliada, o que já
seria grave, pois atrapalharia o governo em sua obrigação de tirar o
País da crise. Ela manifesta uma perigosa cegueira a respeito da
realidade do governo de Michel Temer.
Não se trata de uma questão de afinidade política reconhecer que o atual
governo não é meramente um governo-tampão. Basta simplesmente um breve
repasse no conjunto das ações já tomadas e nas medidas propostas pelo
Palácio do Planalto nesse período de menos de um ano para perceber que
há um governo disposto a pôr o País nos trilhos.
Constatar o compromisso do atual governo com as reformas não significa
esconder eventuais equívocos cometidos pelo Palácio do Planalto. Há
erros não pequenos, que merecem pronta correção. Nada disso, porém,
legitima uma atuação que beira a irresponsabilidade, especialmente
nesses momentos decisivos para o País, quando, depois de muito tempo,
reformas importantes estão em debate.
Fossem os políticos envolvidos no episódio menos experientes, até
caberia classificar seu açodamento como ingenuidade. No entanto, são
eles bem curtidos na lide do jogo político, conhecendo como poucos as
consequências políticas de seus atos e de suas palavras.
extraídaderota2014blogspot
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