editorial da Folha de São Paulo
Depois de figuras como o senador Romero Jucá (PMDB-RR), flagrado em entendimentos para "estancar a sangria" da Operação Lava Jato, e o ex-ministro Henrique Alves (PMDB-RN), citado em delação como beneficiário de R$ 1,6 milhão em propinas, mais um ministro do governo Michel Temer se vê forçado a pedir demissão devido à falta de mínimas condições éticas para permanecer no cargo.
O caso de Geddel Vieira Lima, que deixa a Secretaria de Governo depois da entrevista concedida à Folha pelo ex-ministro da Cultura Marcelo Calero, só não se inclui numa rotina de oportunismo e de suspeita porque expressa de maneira vulgar, desassombrada e tosca o nível de degradação atingido pelos costumes políticos no país.
Em meio a uma crise econômica de extrema gravidade, o responsável pela articulação do governo Temer no Congresso encontrou tempo para se dedicar a um "lobby minúsculo" em favor de que se liberassem as obras de um edifício embargado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
O desavergonhado episódio de indiferenciação entre interesse público e conveniência privada (o peemedebista adquiriu um apartamento no prédio em questão) mobilizou o próprio presidente da República, que indevidamente recomendou intervenção da Advocacia Geral da União num impasse em que se defrontava a prepotência de uma autoridade contra o parecer de um órgão técnico.
Culminou-se, com isso, uma semana em que todo tipo de gestões suspeitas, de evidências de crime, de manifestações de cinismo e de aberta provocação foi lançado à face da opinião pública.
Dos favores supostamente recebidos pelo ex-governador Sérgio Cabral de uma empreiteira, incluindo joias e mobiliário, dos quais afirmou à Polícia Federal "não se recordar", às contínuas articulações por anistia ao crime de caixa dois na Câmara dos Deputados.
Recorde-se, ainda, o abrangente coral de apoios a Geddel Vieira Lima, entoado por senadores tucanos como Aloysio Nunes e Aécio Neves. O que se viu de parte dos políticos nos últimos dias impõe uma dura conclusão.
Não aprenderam nada. Não querem saber de nada. Não se importam com coisa nenhuma.
O governo Michel Temer parece ter reunido a seu redor um amplo grupo de tarimbados especialistas em fisiologia, desconversa, autoritarismo e turpitude, orquestrando-se em harmonia com um Congresso que sobrenada a custo em meio a investigações criminais sem data para terminar.
Iludem-se se imaginam que, passado o impeachment, a sociedade está disposta a assistir acomodada ao espetáculo renovado do patrimonialismo, da impunidade e da corrupção. Quando a crise do Estado ameaça se aprofundar, é hora de reiterar que acabou a tolerância com os velhos hábitos da política.
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