Chico Otavio
O Globo
O depoimento de Vera Guerra e as provas colhidas junto à joalheira H.Stern, onde Cabral comprou outros R$ 2,1 milhões em joias pelo mesmo método, em espécie e sem notas fiscais, compõem o mais recente conjunto de provas reunido pela Operação Calicute para sustentar que o ex-governador comandava um esquema de cobrança de propina e lavagem de dinheiro — incluindo a compra de joias caras, conforme O Globo revelou com exclusividade no dia 17 — pelo qual teriam circulado R$ 224 milhões durante os seus governos (2007-2014).
OPERADOR DE CABRAL – Vera Lúcia prestou depoimento espontâneo, no mesmo dia em que a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão em três endereços da Antonio Bernardo no Rio. Ela confirmou o que Maria Luiza Trotta, diretora da H. Stern, havia contado aos procuradores da República responsáveis pela investigação: o dinheiro para pagar as peças era sempre levado por Carlos Emmanuel de Carvalho Miranda, apontado como operador de Cabral. Vera contou que o codinome do ex-governador, “João Cabra”, foi inspirado na criação de cabras mantida por Carlos Miranda em Paraíba do Sul, onde o operador tem uma fazenda, a Três Irmãos.
Em reportagem exibida ontem, o programa “Fantástico”, da TV Globo, mostrou a relação de joias compradas por Cabral na H.Stern. Após depor, Maria Luiza Trotta apresentou um total de R$ 2,1 milhões em notas fiscais de compras de Sérgio Cabral, que foram emitidas somente na sexta-feira, depois que a Calicute descobriu, com a quebra dos sigilos telefônicos dos envolvidos, que Carlos Miranda telefonava regularmente para Vera Guerra, da Antonio Bernando, e Maria Luzia, da H.Stern.
131 JOIAS – De acordo com o “Fantástico”, somente por um par de brincos de turmalina paraíba com brilhantes Cabral teria pagado R$ 612 mil. De acordo com a relação entregue pela joalheira ao Ministério Público Federal, as compras da H.Stern totalizaram 131 joias nos últimos dez anos. Além da lista, que incluiu fotografias das peças, a joalheira também entregou às autoridades fotos de Miranda e de sua carteira de identidade, registradas no acesso à empresa, para comprovar que o operador fazia os pagamentos.
Peritos da Polícia Federal estão agora cruzando a relação entregue pela H.Stern com as joias apreendidas na casa de Cabral no dia 17, quando o ex-governador e mais nove pessoas envolvidas no esquema foram presas. O objetivo é verificar se todas as peças foram acauteladas ou se o ex-governador e Adriana Ancelmo ainda mantêm outras peças guardadas em local desconhecido.
Na lista entregue pela H.Stern, destacam-se ainda um anel de ouro branco de 18 quilates, com esmeralda, avaliado em R$ 342 mil; e um colar denominado Blue Paradise, no valor de R$ 229 mil.
CABRAL NÃO SE LEMBRA – Porém, no mesmo dia em que foi preso, Cabral disse à Polícia Federal que “não se recorda” das compras agora atestadas por Maria Luiza, funcionária de carreira da joalheria há mais de 30 anos.
De acordo com o Ministério Público Federal, a quebra de sigilo telefônico dos envolvidos revelou que Carlos Miranda ligou 208 vezes para a gerente da loja Antonio Bernardo no Shopping da Gávea, Vera Lúcia Guerra. Os investigadores desconfiam de lavagem de dinheiro com a compra de joias em troca de benefícios fiscais. No período que vai de 2008 a 2013, a joalheria recebeu, junto à HB Adornos, R$ 30,8 milhões em isenções.
Com tantas ligações a um mesmo destinatário, chamou a atenção dos investigadores o fato de a Receita Federal não ter identificado qualquer nota fiscal em nome de Miranda ou de sua mulher, Maria Angélica, emitida pela joalheria.
JOIA PARA MADONNA – De igual forma, ressalta o Ministério Público Federal, há registros de outras 103 ligações entre a diretora da H.Stern, Maria Luiza Trotta, e o empresário. Quando a cantora americana Madonna veio ao Rio de Janeiro, em 2008, ela ganhou de Cabral uma joia da H. Stern, que, no mesmo período da Antonio Bernardo, obteve R$ 113 mil em isenções.
Outra joalheria citada nas investigações é a Sara Joias, com cinco ligações do operador financeiro. Na acusação, o Ministério Público Federal investiga a compra de joias como uma maneira de o grupo criminoso lavar o dinheiro, em razão de as peças serem de fácil transporte e ocultação, além de transformar uma grande quantidade física de dinheiro em objetos de pequeno porte.
EXTRAÍDADETRIBUNADAIMPRENSA
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