por Percival Puggina.
Há, em minha biblioteca, dezenas de livros sobre Cuba. Desde os primeiros, escritos ainda em 1960 por jornalistas e membros do mundo acadêmico de esquerda norte-americano, até os mais recentes, de autores que serviram pessoalmente a Fidel Castro como membros do serviço secreto ou segurança pessoal. Mas não se engane, leitor. A maior parte da bibliografia é laudatória. Visa ao proselitismo. Pretende convencer que o regime é muito bom; o resto do mundo é que não presta.
Quem conhece a realidade local sabe que o povo da ilha, faz tempo, jogou a toalha da esperança no tablado da luta cotidiana. Ninguém mais acredita no governo, no regime, ou em dias melhores. Ninguém, fora da nomenklatura, crê que possa haver refeições satisfatórias além da cada vez mais subnutrida libreta de racionamento. Depois de quase seis décadas de semeadura de ódios aos ianques, o maior anseio e único horizonte da população é o retorno deles com suas verdinhas e seus empreendimentos, soprando ares de liberdade.
Estes momentos que seguem à morte do tirano proporcionaram um novo alento à propaganda comunista no Brasil. A mesma mídia que chorou a eleição de Trump aproveitou o embalo e ofereceu compungidos e afetuosos necrológicos a Fidel. Dir-se-ia que certos jornalistas tinham perdido o vovô, velhinho bom, que dedicara a vida ao ideal da sociedade igualitária. Uma hipocrisia descomunal! Nestes tempos de internet, todos sabem que Fidel, desde que chegou ao poder, viveu como um nababo; que se apropriou de uma ilha, Cayo Piedra, onde construiu um paraíso particular (e não diz que é de um amigo dele); que tinha várias residências com diferentes mulheres; que sua despensa sempre foi abastecida das melhores iguarias que o dinheiro pode comprar. Quem descreve com mais detalhes e credibilidade os requintes da cozinha de Fidel Castro (num país com mais de meio século de racionamento) é o irrequieto frei Betto, em "O Paraíso Perdido". Nessa obra, cada capítulo conta algo de sua atividade como intelectual revolucionário itinerante e dos lautos banquetes com que se nutria para essa faina. Muitos deles, sentado à mesa farta do carniceiro do Caribe.
Então, leitor, morreu um hipócrita. Por lógica intrínseca, irrecusável pela razão e pela visão em todas as suas experiências, igualitarismo é o formato que tomou a escravidão no século XX. Os membros da elite política do partido único são os novos senhores dessas poucas senzalas nacionais ainda remanescentes em desditosas nações contemporâneas.
EXTRAÍDADEPUGGINA.ORG
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