EDITORIAL ESTADÃO
A posse da ministra
Cármen Lúcia na presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) é garantia
de que o Poder Judiciário será - apenas e tão somente - um poder
judicante, conforme preceitua a Constituição Federal de 1988. Longe de
significar um empobrecimento da sua missão, trata-se de respeito à
específica e fundamental contribuição que o Judiciário deve dar ao País,
aplicando a lei com justiça e diligência.
O aprumo institucional
do STF - deixando de lado funções que não lhe assentam bem - é
especialmente importante no momento atual. Não bastasse a crise
política, econômica, social e moral que o País atravessa, tem havido
flertes com supostas “soluções” fora dos trilhos constitucionais, que
simplesmente tentam contemplar demandas pessoais. Vale lembrar que
transigências com os limites da lei são sempre incursões em terreno
perigoso, no qual corre risco a ordem jurídica - a democracia, em última
instância.
Passado o impeachment de Dilma Rousseff - com o tão
promissor afastamento do PT do poder -, é hora de reconstruir o País,
ofertando-lhe as condições oportunas para o desenvolvimento econômico e
social. Para essa empreitada, uma condição essencial é que o poder
estatal, em todas as suas instâncias, se atenha às suas específicas
funções institucionais. A Nação está cansada de voluntarismos, de
partidarismos e, muito especialmente, do aparelhamento ideológico. Os
perversos efeitos desse jeito de atuar, tão frequente em tempos
petistas, alimentam uma profunda aspiração por mudança. É hora de, com
os olhos postos na lei, trabalhar com afinco em prol do País.
Nesse
sentido, é oportuna e carregada de simbolismo a indicação da ministra
Cármen Lúcia de que não deseja festa na sua posse como presidente do
STF. “Não gosto muito de festas, de nada disso. Eu gosto é de processo”,
afirmou a ministra na semana passada.
Se o estilo sóbrio na
condução das coisas públicas é sempre bem-vindo, ele se coaduna
especialmente bem com as atuais prioridades nacionais. Não é hora de
pompas nem de comemorações. O País atravessa uma forte recessão
econômica, com quase 12 milhões de desempregados. Só faltava que, no
momento em que se pede à população compreensão com as medidas duras que
devem ser adotadas para o País sair da crise, integrantes do poder
público dessem a entender, com o seu comportamento, que vivem noutro
mundo.
As atuais circunstâncias do País revelam em toda sua
nitidez a realidade - tão comezinha, mas nem por isso devidamente
considerada - de que todo servidor público tem sérias responsabilidades
perante o Estado e a sociedade. E, por mais que alguns corporativismos
queiram alçar os membros da magistratura a uma condição sobre-humana, os
juízes também são servidores públicos.
A razão de existir de
todo cargo público é precisamente, como o próprio nome indica, sua
finalidade pública. O adequado exercício das funções públicas exige um
olhar amplo, que vá além das preocupações pessoais. Cargo público não é
para defender interesses de uma categoria. Infelizmente, tal princípio
muitas vezes é relegado a um segundo plano, como se fosse legítimo usar o
cargo para nele entrincheirar-se e, dali, defender os interesses de sua
categoria profissional ou social ou, o que é ainda pior, posições
político-partidárias.
A necessidade dessa visão ampla, capaz de
vislumbrar o interesse público além do estritamente pessoal, é ainda
mais premente em funções, como é o caso dos ministros do STF, cujo
exercício tem reflexos diretos sobre toda a sociedade. Tais cargos são
revestidos de especiais garantias, precisamente para proteger a
independência e a capacidade de seus titulares de atuar tão somente em
função do interesse público. São, assim, prerrogativas - nunca
privilégios.
A ministra Cármen Lúcia - cuja conduta sempre
refletiu, além de sua irreparável competência jurídica e fina
sensibilidade humana e social, uma profunda compreensão do que significa
ser servidor público na acepção mais nobre do termo - tem, portanto, os
melhores qualificativos para assumir, nas atuais circunstâncias do
País, a presidência do STF.
extraídadeavarandablogspot




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