editorial do Estadão
Seria uma injustiça considerar que o Partido dos Trabalhadores (PT) seja
todo ele formado por maus elementos. Como em todos os demais partidos,
há no PT gente corrupta e gente honesta. No entanto, a direção do
partido parece se esforçar para que o PT seja gravado na história como
um valhacouto de malfeitores. Em vez de deixarem claro seu total repúdio
aos vários petistas já flagrados com a boca na botija – e devidamente
sentenciados pela Justiça –, os capas pretas do partido, mais uma vez,
preferem defendê-los com vigor, declarando que são vítimas de
julgamentos parciais.
O último caso foi o da condenação de João Vaccari Neto a 15 anos de
prisão. Na condição de tesoureiro do PT, diz a sentença do juiz Sérgio
Moro, Vaccari recebeu pelo menos R$ 4,26 milhões em propinas para o
partido, oriundas de contratos superfaturados de empreiteiras com a
Petrobrás. As empresas envolvidas deram o dinheiro a Vaccari na forma de
doação eleitoral legal, num esquema altamente sofisticado. A operação
foi organizada pelo então diretor de Serviços da estatal, Renato Duque, o
homem do PT na empresa. Duque, que segundo as investigações recebeu R$
36 milhões em propinas, foi condenado a 20 anos e 8 meses de prisão.
O juiz Moro não deixou dúvida sobre a gravidade e as consequências do
caso, ao afirmar que a transformação de propina em doação eleitoral,
conferindo-lhe “aparência de lícito”, gerou “impacto no processo
político democrático, contaminando-o com recursos criminosos”. Esse é,
pois, na visão de Moro, o “elemento mais reprovável” do escândalo.
Trata-se, como bem enfatizou o magistrado, de uma ameaça à própria
democracia, pois desequilibra o processo eleitoral em favor de quem tem
acesso ilegal a recursos do Estado, permitindo a esse grupo político
perpetuar-se no poder. É isso, afinal, o que significam o petrolão, o
mensalão e sabe-se lá do que mais o PT e seus cúmplices lançaram mão
para murar sua cidadela político-eleitoral.
Na nota em que defendeu Vaccari, o PT reafirmou toda a desfaçatez com
que vem lidando com o escândalo. Assinada pelo presidente da legenda,
Rui Falcão, a mensagem diz que a “injusta” condenação do “companheiro
Vaccari” foi um “equívoco”, pois foi decidida “sem provas”. Afirma ainda
que a sentença do juiz Moro “tentou criminalizar o PT ao insinuar que
as contribuições para o partido, todas legais e declaradas ao Tribunal
Superior Eleitoral, constituem-se em doações ilícitas”. Segundo o texto,
as doações feitas ao PT foram “semelhantes às recebidas por outros
grandes partidos do País”, razão pela qual “causa indignação imputarem
seletivamente ao PT acusações de ilegalidade”.
Mais uma vez, o partido que se dizia “diferente de tudo o que aí está”
se esconde sob o argumento de que não fez nada que outros partidos não
fizessem. Quanto mais evidências surgem de que as doações eleitorais ao
PT serviam na verdade para lavar dinheiro de propina, conforme apontou
Moro, a estratégia petista de posar de vítima de perseguição política
dos tribunais, recorrente desde a época do mensalão, torna-se ainda mais
infame.
Em relação a Vaccari, a nota do PT reservou o argumento de que se trata
de um homem que, “ao longo de sua vida, sempre cultivou a simplicidade e
a humildade”, que “construiu sua história nas lutas dos trabalhadores” e
que “não enriqueceu na política”. Em vez de preso, parece que Vaccari
deveria ter sido beatificado, a exemplo de outros “heróis do povo
brasileiro” festejados pelo partido enquanto estavam em apuros na
Justiça.
O PT teve atitude semelhante em relação a outro tesoureiro do partido
condenado pela Justiça, Delúbio Soares – aquele que chamou propina de
“recursos não contabilizados”. Afastado do PT em 2005, na esteira do
escândalo do mensalão, Delúbio cumpriu pena e, graças à sua lealdade ao
partido, acabou anistiado pela direção petista em 2011. No primeiro
evento depois da sua volta triunfal, foi aplaudido de pé pelos
companheiros, com direito a uma faixa onde se lia: “Você é exemplo para
todos nós”.
extraídaderota2014blogspot
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