por Reinaldo Azevedo Folha de São Paulo
Qual foi o marco zero do descalabro que aí está? Em que momento o
petrolão e outros aumentativos degradantes começaram a ser gestados?
O ponto inicial, acho eu, se deu quando Lula conseguiu atrair para o seu
circo setores importantes da burguesia nacional ou internacionalizada,
que o viram, de um lado, com olhos benevolentes, e de outro, quem sabe?,
com paixão cúpida.
Por benevolente, a elite econômica resolveu reconhecer as iniquidades
sociais do Brasil, e a parolagem distributivista de Lula lhe pareceu
moralmente legítima. Por cúpida, percebeu que um governo com deficit de
confiança e excesso de entusiasmo popular poderia trilhar um de dois
caminhos: ou o populismo virulento ou o mercadismo com coração. Deu
mercadismo com coração.
E Lula se tornou, então, na feliz definição de um empresário com quem
conversei nesta semana, "o pai dos pobres e a mãe dos ricos". E não
pensem que ignorasse o feito. Ele mesmo já afirmou que os bancos nunca
lucraram tanto como no seu governo. E não só eles, como pode atestar o
BNDES.
Quantos, a tempo, se dispuseram a ouvir que o modelo –ou fosse lá como
se chamasse aquilo– era insustentável? Ao contrário até. A crítica era
percebida como coisa de gente de maus bofes, que se negava a reconhecer a
sapiência natural de um operário.
Ouvi muitas vezes empresários a dizer que Lula tinha muito mais
paciência para falar com eles do que FHC, que alguns tomavam como
excessivamente frio. E o petista, não duvidem, sabe como fazer um
assunto de Estado se parecer com uma conversa pessoal, recheada de
imagens fesceninas.
Não há, e é para este aspecto que chamo a atenção dos leitores, uma só
característica da crise que seja surpreendente. Absolutamente nada! O
que se tem aí é o resultado de uma equação.
Alguém vai me dizer que o empresariado ignorava que o crescimento
percentual de gastos sempre acima da receita termina em deficit? Que o
crescimento da massa salarial sempre acima da produtividade termina em
inflação? Que o crescente engessamento do Orçamento, com desembolsos
obrigatórios, impede a competente gestão do Estado?
Talvez seja o caso de dar a mão à palmatória. Lula e o PT fingiram que
haviam se convertido à economia de mercado, dispuseram-se a ser os
gerentes do capitalismo nativo, assenhorearam-se dos bens do Estado, e
isso, à larga maioria, pareceu razoável porque, sejamos claros, os
petistas sempre foram muito bons para fazer, digamos, "negócios".
Mesmo a extorsão que se passou a praticar à larga parou de doer. Os
empreiteiros enrolados na Lava Jato são testemunhas de que eles próprios
já não sabem quando estavam corrompendo ou sendo corrompidos, quando
estavam pagando propina ou sendo extorquidos.
"Ah, está dizendo que a corrupção começou com o PT?..." Não! Começou com
a serpente. Eu estou sustentando, sim, que foi com o petismo que ela se
transformou num modelo de gestão do Estado. E só foi tão longe porque
amplas fatias do capital viram nos companheiros uma oportunidade de
negócios.
Talvez um dia a burguesia brasileira consiga acreditar nos valores
morais e espirituais –vejam que palavra emprego!– que a levam a
empreender e a produzir.
E, quem sabe?, surjam então empresários liberais no Brasil, que combatam
o petismo, em vez de se unir a ele em nome do patriotismo, que é sempre
um péssimo refúgio para o erro ou para a cupidez.
extraídaderota2014blogspot
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