por Rogério Furquim Werneck O Globo
A reação instintiva de quem está prestes a se afogar é mobilizar todas
as forças que lhe restam para manter a cabeça fora d’água. No sôfrego
afã de continuar a respirar, tudo mais perde importância.
É esse estertor de afogado, aflitivo e desesperado, que vem à mente,
quando se analisa a agoniada atuação da presidente Dilma nas últimas
semanas. O Planalto está integralmente mobilizado pelo único propósito
de evitar o impeachment. Todo o resto foi deixado de lado.
Nada mais importa. E no vale-tudo que se instalou, parece não haver
limites aos meios de que o governo possa lançar mão para evitar que o
mandato da presidente seja abreviado.
É bem sabido, no entanto, que, quando o risco de afogamento promete ser
prolongado, entrar em pânico pode ser fatal. É importante manter a
calma, saber poupar forças para resistir por mais tempo e conceber plano
de jogo menos imediatista, que torne a sobrevivência mais provável.
Para não ser tragada pelo vórtice que vem sendo alimentado pela
assustadora interação da crise política com a crise econômica, a
presidente precisaria de um plano mais consequente do que a ingênua
busca do apoio, supostamente irrestrito, de um bloco de pelo menos 172
deputados que possa barrar o avanço de um pedido de impeachment na
Câmara. E é bem possível que nem mesmo isso a reforma ministerial
anunciada há poucas semanas consiga assegurar.
Um requisito básico de qualquer plano de jogo que faça sentido é que a
presidente seja capaz de mostrar que está, de fato, empenhada em esforço
promissor de superação da crise econômica que vive o país. Mas, tendo
deixado de governar para conter o impeachment, a presidente continua
entalada numa relação extremamente difícil com o Congresso.
Em meio ao rápido agravamento do quadro fiscal, o Planalto nem mesmo
conseguiu que fossem apreciados os vetos presidenciais a medidas que
implicariam alarmante deterioração adicional das contas públicas. Não há
garantia de que providências fundamentais, como a renovação da
Desvinculação de Receitas da União (DRU), possam ser aprovadas em tempo
hábil. E, a esta altura, já não há quem acredite na aprovação das
propostas pendentes de ajuste fiscal. Muito menos na saída fácil da
recriação da CPMF.
Tendo feito uma reforma ministerial sob medida, para mobilizar forças
que a apoiassem no embate com o presidente da Câmara, a presidente Dilma
constata agora que, graças à Lava-Jato, à Procuradoria-Geral da
República e ao Supremo, talvez consiga se livrar do abraço de afogado de
Eduardo Cunha. Mas isso não significa que possa se considerar a salvo.
Mesmo que Cunha se afogue antes dela, sem ter apertado o botão do
impeachment, Dilma continuará em situação muito precária. Especialmente
se sucumbir às pressões de Lula e do PT e acabar comprando o plano de
jogo que o ex-presidente quer lhe impingir.
Lula vem defendendo uma guinada à esquerda na política econômica. Acha
que, fixado na necessidade de um ajuste fiscal, Joaquim Levy acabou
adotando o discurso de quem perdeu a eleição presidencial do ano
passado. Um discurso de desesperança, impossível de vender.
O que, sim, poderia ser fácil de vender seria um programa populista,
baseado na volta a políticas de estímulo à demanda via expansão de
crédito, que permitissem ao governo alardear que já é possível, afinal,
vislumbrar a retomada da economia. O ex-presidente entende que o prazo
de validade de Levy está vencido. E que é hora de se entregar o comando
da política econômica a um nome mais alinhado com um discurso
“pós-ajuste” que permita “vender esperança”.
Tudo indica, contudo, que a presidente Dilma já percebeu que ter Joaquim
Levy à frente do Ministério da Fazenda é um dos poucos fatores que
ainda vêm impedindo que ela se afogue de vez. E que, se levar adiante a
reorientação de política econômica preconizada por Lula e pelo PT, é
difícil que possa sobreviver aos desdobramentos políticos da grave
deterioração adicional do quadro econômico que, mais uma vez, ela mesma
terá desencadeado.
extraídaderota2014blogspot
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